Entre os dias 7 e 11 de abril de 2025, Brasília foi palco da 21ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL), a maior mobilização indígena do Brasil. Com o tema “APIB somos todos nós: Em defesa da Constituição e da vida”, o evento reuniu milhares de indígenas de diversas regiões do país para discutir e fortalecer a luta pelos direitos originários.
O Conselho Indígena de Roraima (CIR) teve uma participação significativa, levando cerca de 40 lideranças das comunidades de base. Entre os representantes estavam o Tuxaua Geral Amarildo Macuxi, o Vice-Tuxaua Paulo Ricardo, além da Tuxaua Geral do Movimento de Mulheres Indígenas, Kelliane Wapichana.
Unidade na luta contra o Marco Temporal
Durante o ATL 2025, as lideranças do CIR enfatizaram a importância da união dos povos indígenas na luta contra o Marco Temporal e a Lei 14.701/2023, que representa uma grave ameaça aos direitos dos povos indígenas. Essa lei foi aprovada pelo Congresso no fim de 2023, mesmo após o Supremo Tribunal Federal (STF) ter considerado inconstitucional a tese do Marco Temporal.
“A luta não acabou. A tentativa de impor essa lei mostra que o Congresso quer legalizar o que é ilegal. E nós não vamos aceitar”, afirmou o tuxaua geral Amarildo Macuxi, em uma das falas durante a Marcha “A Resposta Somos Nós”, que seguia em direção ao Congresso Nacional.

Durante essa mesma marcha, no dia 10 de abril, alguns parentes, incluindo a delegação roraimense, foram alvo de violência perto do Congresso Nacional. A ação gerou revolta e foi duramente criticada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), que pediu investigação e punição dos responsáveis. Mesmo com a tentativa de intimidar, os povos não recuaram. Seguiram em frente, mostrando que a luta é legítima e vai continuar firme pela defesa dos direitos.
Ainda durante o ATL 2025, o Tuxaua Geral do CIR também participou da mesa que apresentou a Resolução Conjunta nº 12/2024, uma conquista importante para os povos indígenas. A nova norma, articulada pela Funai em parceria com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e outros órgãos, permite que indígenas incluam em seus registros civis sua etnia, sem necessidade de processo judicial. Amarildo foi um dos primeiros a exercer esse direito, oficializando o nome “Macuxi” em seu registro, ato que simboliza a valorização da identidade indígena e o reconhecimento da diversidade cultural dos povos originários.

As discussões no ATL também abordaram a preocupação com a proposta de uma “mesa de conciliação”, criada pelo governo federal para tratar dos conflitos fundiários. Para as lideranças do CIR, esse mecanismo não pode ser usado para diminuir os direitos garantidos pela Constituição de 1988.
“Não concordamos com esse retrocesso que está acontecendo no Congresso Nacional, no Supremo Tribunal Federal e outros espaços de poderes, mas seguimos firmes e forte na luta”, reforçou Paulo Ricardo, vice-tuxaua geral durante sua passagem pela Câmara dos Deputados, na ocasião foram realizadas denúncias do que acontece dentro dos territórios indígenas.

A participação das mulheres indígenas foi um dos destaques da delegação de Roraima. A tuxaua Kelliane Wapichana participou ativamente de diversos espaços de articulação e reflexão durante o ATL. Um deles foi a roda de conversa sobre “Conjuntura local e geopolítica global”, onde ela destacou a importância da união e da articulação entre os povos indígenas diante dos desafios políticos e econômicos que afetam os territórios.
“Nós precisamos nos unir para fortalecer, nós precisamos usar o feixe de vara para caminhar juntos num só horizonte”, afirmou a tuxaua, trazendo a sabedoria dos antigos para o centro do debate atual.

A delegação roraimense teve grandes destaques em suas participação em rodas de conversas realizadas com parceiros. Caíque Souza, fotojornalista do CIR, esteve presente na mesa sobre “Comunicação e Democracia: Fortalecendo as Narrativas e Visibilidade em Forma de Defesa do Território”, explicando como a atuação das redes de comunicação é essencial para garantir que as vozes dos povos indígenas sejam de fato ouvidas. Raquel Wapichana, Coordenadora do Departamento de Juventude, mediou a mesa “Ajuri: juventude indígena no protagonismo climático” com objetivo de fortalecer os departamentos existentes e criar departamentos ou coletivos em estados que ainda não têm. Aleixo Wapichana, liderança jovem roraimense que também participou da mesa, mencionou a “Caravana da Juventude: Vem Remar Comigo”, que acontece em Roraima e promove intercâmbio cultural entre jovens de comunidades indígenas das etnoregiões — um sonho realizado e que se tornou uma inspiração para outros participantes da mesa que têm o desejo de realizar caravanas em seus territórios.
A parente Josimara Baré, coordenadora do Fundo Indígena RUTÎ, esteve presente na roda de conversa “Financiamento e solução dos povos indígenas da Amazônia – Colhendo frutos”, durante o ATL 2025. Ela aproveitou o momento pra lançar o Fundo RUTÎ e explicar como ele funciona. Também falou do edital que foi aberto em março, na 54ª Assembleia Geral dos Povos Indígenas de Roraima. Esse edital serve pra dar força e apoiar as ações que vêm das próprias comunidades indígenas de Roraima, ajudando os parentes a tirar do papel, projetos importantes para os territórios.
Sineia do Vale, Coordenadora do Departamento de Gestão Territorial, Ambiental e Mudanças Climáticas do CIR, participou ativamente de diversas mesas frisando a importância da preservação ambiental, implementação de PGTAs, o desenvolvimento sustentável da produção e economia das comunidades, da união e fortalecimento dos povos do Brasil para a construção de uma COP participativa para todos, além de explicar como o movimento indígena está se preparando para a COP30.
Além disso, outras lideranças da delegação roraimense também marcaram presença em rodas de conversa que trataram de temas essenciais como saúde, educação, segurança e, com destaque especial, o papel das mulheres nas decisões dentro das comunidades. Esses momentos de troca e aprendizado mostraram que a luta dos povos indígenas é coletiva, diversa e fortalecida por todas as vozes — dos anciãos aos jovens, dos tuxauas às mulheres que conduzem com sabedoria os caminhos de seus povos.
Compromisso com os direitos constitucionais
O ATL 2025 também marcou os 20 anos da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), organizadora do evento. Foi um momento de celebração, mas principalmente de reafirmação da luta. As lideranças do CIR destacaram que a mobilização deve continuar para garantir que a Constituição Federal seja respeitada e os direitos indígenas assegurados.
“As ATLs existem para trazermos nossos anseios, nosso recado em todas as instâncias em Brasília, seguiremos firmes e fortes ecoando nossas vozes em defesa do nosso território. Não ao Marco Temporal, e sim a vida dos povos indígenas”, finalizou Maria Bethânia, uma das lideranças da base durante a grande marcha de encerramento.

O ATL 2025 mostrou a força da união dos povos indígenas. Mesmo diante dos ataques e da violência, os povos de Roraima e de todo o Brasil se mantiveram firmes na defesa dos seus direitos. A participação ativa do CIR, com suas lideranças e representantes de base, reafirmou que a luta pela Constituição e pela vida não vai parar.
O evento deixou claro que, apesar de todas as dificuldades, a resistência indígena é mais forte do que nunca. Com união e determinação, os povos seguem firmes, defendendo seus territórios, suas culturas e seus direitos. A luta continua, sempre em frente, com a certeza de que juntos somos mais fortes.
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