Realizado pela primeira vez na história do Brasil, evento reúne gestores para estreitar laços e trocar experiências e ferramentas de setores da administração pública conduzida por indígenas

– Foto: André Corrêa – ASCOM/MPI

A Assessoria Especial de Assuntos Parlamentares (AEASPAR) do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) realizou um evento histórico ao promover o 1º Encontro Nacional de Gestores Indígenas. Inédito na trajetória nacional, o evento reuniu 61 gestores que ocupam cargos em superintendências, secretarias e coordenadorias indígenas municipais e estaduais do país. O objetivo é fortalecer o aldeamento do Estado para viabilizar políticas públicas voltadas aos povos indígenas. O primeiro dia da iniciativa ocorreu na quinta-feira (15), em Brasília.

Além de trocar experiências que apontam caminhos para tornar mais robusta a rede de gestores indígenas de todo o Brasil, os participantes integraram um painel de escuta ativa com representantes do governo federal para discutir alternativas de captação de recursos para a governança indígena. Foram abordados temas como emendas parlamentares, cooperação federativa, fundos públicos e parcerias a fim de aprimorar as políticas destinadas aos indígenas e para superar questões orçamentárias enfrentadas pelas unidades federativas.

De acordo com a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, o encontro estreita os laços com estados e municípios que possuem territórios indígenas para firmar parcerias e para contribuir com a formação dos gestores na condução de políticas ao proporcionar ferramentas e alianças para executá-las. Outro aspecto fundamental do evento é chamar atenção para que os entes federativos assumam responsabilidades em relação às comunidades indígenas.

“O MPI assumiu a missão de monitorar políticas indígenas. Portanto, essa aproximação é importante para distribuir melhor as responsabilidades entre estados e municípios, pois muitos deles, cujo Censo aponta a presença indígena, se negam a criar políticas públicas para esse público diante do argumento de que a FUNAI e a SESAI são os únicos órgãos destacados para isso”, disse Guajajara.

Para a ministra, o termo “aldear o estado” não é figura de linguagem, mas sim um projeto político em curso que transforma a estrutura pública a partir da presença, da sabedoria e da autoridade dos povos indígenas por meio do MPI, definido como um espaço institucional que sedimenta articulações e visa implementar a mesma lógica em âmbito federativo. “O MPI foi criado para que governos respeitem nossa autonomia, modos de vida e territórios”, reforçou.

Entre os desafios apresentados pela ministra para a solidificação da presença indígena nas esferas municipais, estaduais e federal estão o racismo institucional, acompanhado da desconfiança das capacidades de gestão, escassez de recursos, subfinanciamento para a política indigenista e a burocracia que atrasa ou inviabiliza ações.

“Nunca estivemos tão organizados e determinados a ocupar espaços que nos foram negados. Nossa presença é símbolo e estratégia de luta de ocupação da política, mas a própria estrutura do Estado não está preparada para nós.”, acrescentou Guajajara.

Protagonismo indígena

O coordenador-geral de Gestão Ambiental da Funai, Francisco Melgueiro, citou a ECO 92, realizada no Rio de Janeiro, como marco que deu início ao processo da presença indígena em esferas de poder e a instituição do MPI como canal que permitiu a inserção de pessoas indígenas de forma estratégica dentro do Estado, visando a construção de um conjunto de políticas públicas que afetam a vida dos povos dentro de seus territórios.

“Essa intervenção auxilia no desenvolvimento de um país mais justo, que respeita os povos tradicionais, mas para isso temos que ter formação técnica e científica, além da formação ancestral, para nós mesmos elaborarmos propostas de políticas públicas, gestão e governança dos nossos territórios”, defendeu Melgueiro.

Atualmente, o MPI é composto por 45% de servidores indígenas. Dos 34 Distritos Sanitários Indígenas (DSEIs), da Secretaria de Saúde Indígena (SESAI) do Ministério da Saúde, 27 são geridos por indígenas e das 39 Coordenações Regionais da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), 36 são coordenadas por indígenas. Em relação ao número de indígenas eleitos nas últimas eleições municipais, o país conta com 9 prefeitos, 13 vice-prefeitos e 234 vereadores.

“Nesse contexto, a presença indígena nos espaços de poder é fundamental para fortalecer a representatividade e institucionalidade, promovendo uma democracia mais inclusiva e condizente com a diversidade sociocultural do nosso país, garantindo a autonomia e os direitos que cabem aos povos indígenas”, afirmou Jecinaldo Cabral Sateré, chefe da Assessoria de Participação Social e Diversidade (ASPAD) do MPI.

Mais de 200 indígenas se inscreveram para participar do Encontro, mas uma triagem foi necessária, dando prioridade para aqueles que ocupam posições em organismos municipais e estaduais. Gestores de municípios dos estados do Amazonas, Rondônia, Roraima, Acre, Pará, Amapá, Ceará, Piauí, Bahia, Paraíba, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Santa Catarina e Rio Grande do Sul compareceram ao evento.

Segundo Kleber Karipuna, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), a criação do MPI aumentou o protagonismo indígena e impulsionou a instituição de órgãos indígenas em estados e municípios.

“Os dados são positivos, mas a manutenção desse processo de conquista da presença e participação nas esferas de poder também se revela um desafio que merece nossa atenção. Há cerca de 10 anos, o movimento indígena nacional se negava a integrar governos, pois não havia consenso sobre o tema em função de uma desconfiança da política não indígena, mas isso amadureceu e o cenário pós 2022 se mostrou propício a ponto de nos colocarmos no seio da política brasileira”, analisou Karipuna.

Gestão e Inovação com indígenas

O secretário executivo adjunto do Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Público (MGI), Adalto Modesto, se pronunciou durante o encontro e sua fala coincidiu com as de Karipuna e Melgueiro. Ele disse que em 2 anos e meio de gestão, o MGI atua e vem atuando para construir uma administração pública inclusiva e pronta para enfrentar os desafios de desenvolvimento sustentável contemporâneos, o que inclui o fortalecimento da gestão pública indígena ao respeitar saberes tradicionais e promovendo inserção dos povos indígenas nas estruturas decisórias do estado.

Modesto citou que a ocupação dos postos públicos por indígenas é fundamental para o aprimoramento das políticas públicas que devem ser feitas por e para os indígenas. “O sucesso do MPI é um exemplo que tem inspirado iniciativas nos estados e municípios com mais diversidade e inclusão. Para além dos cargos ocupados pela primeira vez por indígenas, também é importante que haja indígenas incidindo na política pública desde a sua concepção. Por isso, um dos marcos recentes do governo Lula é a sanção da lei 14.808, de 2024, que institui cotas para indígenas no serviço público da FUNAI, medida histórica e de promoção de equidade que amplia a presença de indígenas nas políticas que lhes dizem respeito.”

“No Concurso Nacional Unificado, os indígenas representaram 0,46% dos inscritos, mas 2,29% dos aprovados. O percentual é baixo, mas proporcionalmente é muito expressivo e apresenta resultados dos desempenhos individuais, mas mostra como essas ações afirmativas produzem resultado concreto, pois são centenas de indígenas no quadro público de servidores”, informou o secretário.

Modesto também relatou que, em parceria com o Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia Legal, o MGI tem participado do diagnóstico situacional das Secretarias de Povos Indígenas na região e está identificando serviços e soluções que possam ser customizados para utilizar a gestão pública dessas secretarias para fortalecer suas capacidade estatais para a entrega de melhores políticas públicas.

Fonte: https://www.gov.br/povosindigenas/pt-br/assuntos/noticias/2025/05/mpi-promove-1o-encontro-nacional-de-gestores-indigenas-em-brasilia