4ª Etapa do Ciclo COParente ocorreu em Ubatuba-SP e reuniu cerca de 150 representantes indígenas da Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste e Comissão Guarani Yvyrupa

– Foto: Victor Lisboa

No primeiro dia da 4ª Etapa do Ciclo COParente, cerca de 150 representantes do movimento indígena do Sudeste se dividiram em quatro grupos para elencar demandas e prioridades a serem encaminhadas para a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP 30, que ocorrerá em novembro na capital do Pará. A etapa foi realizada na quinta-feira (29), na Aldeia Renascer Ywyty Guaçu, localizada em Ubatuba, litoral norte de São Paulo, e reuniu indígenas de territórios de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo representados pela Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (ARPINSUDESTE) e Comissão Guarani Yvyrupa (CGY).

O Grupo 1 exigiu que o Congresso Nacional cumpra o que prega a Constituição Federal em relação aos indígenas e não legisle a favor de retrocessos, como a aprovação, na quarta-feira (28), do Projeto de Decreto Legislativo 717/24, que propõe a suspensão de decretos de homologação das Terras Indígenas (TIs) Morro dos Cavalos e Toldo Imbu, em Santa Catarina, por parte da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e do projeto de lei 2.159/21, que afrouxa as regras de licenciamento ambiental, ambos aprovados pelo Senado.

Além disso, o grupo frisou a necessidade de frear o desmatamento provocado pelo agronegócio em decorrência do plantio de eucalipto, laranja e cana de açúcar na região, bem como maior cobrança do governo para que as empresas contribuam com soluções para a poluição e deterioração que causam.

O Grupo 2 levantou a prioridade de mostrar na COP 30 que a Mata Atlântica é um bioma sagrado, resistindo devido à atuação do povos indígenas a protegê-lo. Portanto, eles precisam de mais reconhecimento e visibilidade. Entretanto, o grupo ressaltou que a responsabilidade de preservação e conservação do bioma precisa ser compartilhada por municípios, estado, governo federal e setor privado.

Já o Grupo 3 citou que a COP 30 se trata de uma grande possibilidade de utilizar o evento como vitrine para denunciar às autoridades internacionais os retrocessos e ataques que vem sendo cometidos, principalmente pelo Congresso Nacional em relação à lei do marco temporal (14.701/23) e demais projetos e decretos mencionados.

O Grupo destacou o tombamento da Mata Atlântica como patrimônio material por órgãos responsáveis e indicaram a necessidade de desenvolver políticas públicas em prol da segurança alimentar, reflorestamento, destinação de recursos via financiamento ambiental para os territórios e segurança para mulheres indígenas de contexto urbano.

Formado por jovens, o Grupo 4 pediu protagonismo em discussões sobre gestão ambiental, garantia de representação na COP 30 e maior incidência da visão da juventude indígena na forma como são educados e como são tratados pelo sistema escolar.

Participaram do evento representantes dos seguintes povos indígenas: Tupi Guarani, Guarani Mbya, Terena, Kaingang, Pataxó, Fulnyô, entre outros.

Apresentações 

O evento contou com uma apresentação do chefe da Assessoria Internacional dos Povos Indígenas, Francisco Filippo, que abordou detalhes sobre a organização e funcionamento interno da 30ª edição da Conferência. Ele também especificou como está sendo planejada a participação indígena encabeçada pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI) ao sanar dúvidas e responder perguntas do público presente.

Carolina Delgado de Carvalho, servidora da coordenação-geral de Gestão Ambiental da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), teceu um histórico sobre as COPs e temas que serão tratados ao longo das COPs e de possibilidades de incidência indígena no evento, como a redução dos gases de efeito estufa, financiamento climático para países em desenvolvimento, adaptação e impactos sociais das mudanças climáticas, preservação das florestas e da biodiversidade e justiça climática.

Já Elis Nascimento, diretora substituta do Departamento de Justiça Climática da Secretaria Nacional de Gestão Ambiental e Territorial Indígena (SEGAT) do MPI, trouxe uma apresentação sobre a importância da Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial Indígena (PNGATI) como estratégia de fortalecimento demarcatório, preservação ambiental e injeção de verba proveniente de fundos ambientais.

Lideranças indígenas pedem reconhecimento e demarcação

A Aldeia Renascer é fruto de uma retomada que ocorreu a partir de 1998, em Ubatuba. O território possui atualmente sete lideranças e tem 25 famílias – cerca de 120 pessoas, a maioria jovens e crianças -, porém ainda não foi demarcado e segue em fase de estudos para delimitação por parte da FUNAI. 

“Por mais que haja organização e infraestrutura, nosso território ainda não oferece a segurança necessária por conta da ausência de regularização. Então, levaremos para a COP a necessidade de demarcação não só da nossa aldeia, mas para todos os povos que habitam o bioma Mata Atlântica. Ele carece de um olhar mais atencioso porque o estado de São Paulo não têm apenas prédios. Ainda permanecemos aqui em meio à natureza”, descreveu Bianca Kunha Djú, secretária da Associação Indígena Mbaiapo da Aldeia Renascer.

Para Awá Tenodegua, coornador-geral da ARPINSUDESTE, o principal foco de atuação da organização é o reconhecimento e demarcação de territórios e retomadas nos estados que ela abrange. Contudo, além da insegurança jurídica fruto da falta de regularização fundiária que assola diversos povos, ainda é necessário lidar com outros problemas, como desapropriações, ocupações irregulares e avanço de não indígenas em territórios.

“Nós temos o desafio de fortalecer os direitos dos nossos povos no Sudeste, tanto os aldeados quanto os de contexto urbano. Vemos essa etapa pré-COP como uma chance justamente de dialogar com organizações parceiras que caminham no mesmo sentido e para chamar atenção para nosso bioma, pois queremos mostrar para o mundo, durante a Conferência, que há indígenas com modos de viver que precisam ser preservados, assim como a Mata Atlântica. Somos povos diversos em contextos múltiplos assim como os biomas do Brasil”, disse o coordenador.

Dignidade via políticas públicas

Conforme Cristiano Kiririndju, coordenador de Políticas para os Povos Indígenas da Secretaria de Justiça e Cidadania de São Paulo, o estado possui cinco povos (Guarani, Tupi Guarani, Terena, Krenak e Kaingang) divididos em 39 territórios indígenas, dos quais aproximadamente 80% não estão demarcados e 90% convivem com a ausência de saneamento básico e água tratada. A coordenadoria foi criada em agosto de 2023, com o objetivo de articular políticas públicas para os territórios do estado. Portanto, mesmo sem ter orçamento próprio, transita por todas as secretarias do governo estadual desenvolvendo políticas públicas demandando investimento das demais pastas.

Nos territórios indígenas de São Paulo, segundo o último Censo, há cerca de oito mil indígenas, mas devido à fragilidade de desenvolvimento de políticas públicas, a evasão dos territórios levou 40 mil deles a viverem em contexto urbano. Já o Rio de Janeiro possui 12 territórios majoritariamente ocupados pelo Guarani Mbya.

“As políticas para indígenas costumam ser muito baseadas nas que foram implementadas no Norte do país, mas isso torna os demais territórios de fora do bioma amazônico coadjuvantes, pois nem sempre são contemplados dentro de necessidades específicas de suas localidades. A meu ver, não adiante muito falar em preservação do ambiente sem incluir a preservação dos indígenas que lutam para manter os biomas em pé”, avaliou o coordenador.

Fonte: https://www.gov.br/povosindigenas/pt-br/assuntos/noticias/2025/05/organizacoes-indigenas-elencam-demandas-e-prioridades-do-sudeste-para-encaminhar-a-cop-30