Por Leanderson Lima

Empresário Rubén Dario da Silva Villar, financiador de pescadores ilegais no Vale do Javari, nega participação no duplo homicídio; estratégia de defesa vai tentar a libertação dos réus confessos, por “excesso de prazo” nas prisões (Foto: Reprodução redes sociais).


Manaus (AM) – Rubén Dario da Silva Villar, conhecido como “Colômbia”, negou qualquer participação no caso do duplo homicídio do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips. Financiador de pescadores ilegais na Terra Indígena Vale do Javari, entre eles os réus Amarildo da Costa Oliveira (“Pelado”), Oseney da Costa Oliveira (“Dos Santos”) e Jefferson da Silva Lima, (“Pelado da Dinha”), presos pelos assassinatos, “Colômbia” foi ouvido nesta segunda-feira (17) como testemunha em audiência na Vara de Justiça de Tabatinga, cidade vizinha de Atalaia do Norte, onde fica a terra indígena. A defesa vai tentar a libertação dos réus confessos, uma vez que o processo da pesca ilegal será incluído na denúncia original.

Rubén Dario da Silva Villar não é réu no caso Bruno e Dom, mas foi indiciado pela Polícia Federal (PF), pela morte dos dois, no dia 31 de maio deste ano, juntamente de Jânio Freitas de Souza. A PF disse à época que a quebra de sigilo telefônico mostrou que entre 1º de junho de 2021 e 6 de junho de 2022 [um dia após as mortes brutais do indigenista brasileiro e do jornalista britânico], “Colômbia” e Jânio trocaram nada menos do que 419 ligações. 

Jânio teria sido uma das últimas pessoas a se encontrar com Bruno e Dom, mortos numa emboscada no rio Itacoaí. E ele disse várias vezes que conhecia “Colômbia” apenas de vista, o que contradiz as informações reveladas na vasta troca de ligações entre os dois no período de um ano.  

dom e janio
Dom Phillips e o pescador Jânio Freitas de Souza. Imagem tirada do celular de Bruno Pereira em 5 de junho de 2022. Crédito: TVGLOBO / GLOBOPLAY

Na audiência desta segunda-feira, “Colômbia” foi ouvido como testemunha de defesa, junto de Josenete Campos de Freitas, esposa de Amarildo; Eliclei Costa de Oliveira, irmão de Amarildo; Otávio da Costa de Oliveira, irmão de Oseney; e o pescador Laurimar Lopes Alves “Caboco”. 

A denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF), baseada nas investigações da PF, considerou “Colômbia” como mandante dos crimes, já que ele controlava um grupo criminoso envolvendo os pescadores da região, “fornecendo-lhes os materiais necessários para a pesca e caça ilegais”. Bruno Pereira atuava junto aos indígenas para ensiná-los a se proteger das constantes invasões desses pescadores na Terra Indígena do Vale do Javari, a mais de 1.100 quilômetros de distância de Manaus.

Amarildo, que confessou o assassinato de Bruno e Dom, tinha, segundo a denúncia do MPF, uma atuação proeminente na comunidade e “se reportando diretamente a ‘Colômbia’”. Ele teria recebido inclusive barcos e motores do empresário, e que o pagamento das embarcações era realizado com pirarucu pescado de maneira ilegal. O barco de 60 HP utilizado no dia do duplo homicídio foi comprado por Rubén Villar. 

Jefferson, o outro réu confesso, também confirma o patrocínio das atividades criminosas por parte do empresário, corroborando com a informação de “Colômbia” ser o mandante dos crimes. Ele, “Pelado” e “Dos Santos”, que alega inocência, se encontram presos em penitenciárias de segurança máxima. Eles vão ser interrogados novamente nesta nova etapa das audiências, que seguem nos dias 20 e 27.

Estratégia de defesa

Américo Leal
Américo Leal (de barba) durante audiência de instrução do caso Bruno e Dom (Foto: Reprodução/Redes sociais)

advogado Américo Leal, em entrevista à Amazônia Real, revelou que teve de entrar com uma correição parcial, justamente por conta dessa questão da pesca ilegal. “Quando acontece um caso de homicídio como esse e existem crimes correlatos, entrelaçados, dependentes um do outro, o processo do tribunal do júri atrai os demais crimes. O tribunal do júri vai julgar o homicídio, ocultação de cadáver, esse negócio todo e a pesca ilegal”, explica.

Isso porque o processo da pesca ilegal estava separado do caso de homicídio, que foi para a 2ª Vara Federal de Manaus, onde houve uma mudança de entendimento processual. “O juiz de Manaus deu uma exceção e não admitiu que o processo fosse a julgamento separadamente do tribunal do júri”, acrescenta. Segundo o advogado, que integra a banca de defesa dos réus,  composta por Gilberto Alves, Larissa Rubim e Lucas Sá, todos sob comando da advogada Goreth Rubim, o procurador de Justiça já sinalizou ser favorável que o processo de homicídio e o  crime de pesca ilegal sejam julgados conjuntamente.

De acordo com o advogado Américo Leal, o MPF deverá aditar a  denúncia [quando se faz uma emenda à denúncia], ou fazer uma nova denúncia incluindo agora a questão da pesca ilegal.  “Com isso vai abrir novo prazo para que a defesa conteste a denúncia do Ministério Público. Só que tem um porém aí: como o processo vai começar novamente, os presos estão presos com excesso de prazo. Nesse prazo, o Ministério Público tem na faixa de 180 dias para chegar ao termo da instrução criminal, que é ouvir as testemunhas de acusação e defesa, e interrogar os presos”, alerta. 

Ou seja, como o processo já se encontra na fase intermediária da instrução criminal, a inclusão da questão da pesca ilegal pode fazer com que o processo volte para a fase inicial. “Aí dá o excesso de prazo no tempo da prisão dos acusados e eles têm que ser colocados em liberdade”, acrescenta o advogado dos réus.

Poucos esclarecimentos

Manifestação em frente da Funai,, em Manaus, após a notícia da confirmação dos homicídios de Bruno Pereira e Dom Phillips (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)

O consultor técnico da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), Orlando Possuelo, comentou o depoimento de “Colômbia”. “A questão com o ‘Colômbia’, quem apontou ele como mandante foram as investigações da Polícia Federal. Aparentemente ele tem culpa no cartório”, diz. “A gente aqui da Univaja espera que a justiça seja feita. Que a partir das investigações tudo possa ser comprovado.”

Para o advogado da família do jornalista Dom Phillips, Rafael Fagundes, a avaliação é que os depoimentos de segunda-feira não contribuíram muito para o esclarecimento dos fatos. Já o advogado da família do indigenista Bruno Pereira, João Calmon, afirma que aguarda “com serenidade” o término dessa primeira fase da instrução processual da ação penal e torce para que os trabalhos continuem sendo desenvolvidos com a seriedade que é a marca desta ação desde o seu início.

A defesa, que quer transferir o julgamento para Manaus, conseguiu que a etapa das audiências, que precede o julgamento em si, fosse refeito, para ouvir testemunhas não ouvidas antes. Além desse atraso (o processo começou a tramitar em março) para decidir se os réus vão a júri popular, o que é mais provável, as audiências voltaram a enfrentar o problema tecnológico de comunicação. Américo Leal relatou que a audiência transcorreu de forma normal, apesar das dificuldades. “A internet de Tabatinga estava ruim e aí a gente tinha que repetir de vez em quando, mandar falar de novo, aquele negócio todo, mas, no final das contas, ocorreu tudo bem”, diz.

Fonte: https://amazoniareal.com.br/colombia-mandante/

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