O contraponto aos quase quatro anos do governo Jair Bolsonaro (PL) é um dos destaques do plano de governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quando o assunto é a Amazônia. Líder nas pesquisas eleitorais, o candidato petista à Presidência da República promete combater os crimes ambientais promovidos por milícias, grileiros e madeireiros e afirma que será implacável contra o desmatamento ilegal. Promete também recompor áreas degradadas e reflorestar biomas.

Os anos do governo Bolsonaro foram marcados pelo desmonte de órgãos ambientais, cortes orçamentários e descaso com a proteção da Amazônia e de seus povos. Os recordes negativos da destruição da floresta chamam a atenção do mundo. De agosto de 2021 a julho de 2022, foram derrubados 10.781 quilômetros quadrados de floresta. Segundo dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), essa é a maior área devastada nos últimos 15 anos.

Para Lula, é dever do País conservar a Amazônia, o cerrado, a mata atlântica, o pantanal e os pampas. Ele cita a biodiversidade brasileira como a maior do planeta e aposta em uma política contra o desmatamento como um sinal de que o Brasil voltará a ter posição destacada nas discussões internacionais sobre a crise climática. Sob Bolsonaro, o Brasil antes protagonista nos fóruns mundiais se tornou uma voz ignorada.

O apoio de Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente, à campanha petista é visto por especialistas como uma sinalização de que a pauta ambiental terá mais força em um possível terceiro mandato de Lula, que chega neste 2 de outubro com chances reais de vencer em primeiro turno. O apoio da ex-ministra e líder ambiental acreana está condicionado à incorporação de compromissos como a criação de uma autoridade nacional para o enfrentamento das mudanças climáticas.

A oposição ao bolsonarismo também aparece nos planos de Lula em relação às populações indígenas, quilombolas e tradicionais da Amazônia. Ele garante estar comprometido com a proteção dos direitos e dos territórios. Durante a campanha, inclusive nas visitas a Belém e Manaus, o ex-presidente prometeu criar o Ministério dos Povos Indígenas. E prometeu fortalecer a Funai (Fundação Nacional do Índio) e do (Sistema Nacional de Meio Ambiente).

“Reafirmamos o nosso compromisso com as instituições federais, que foram desrespeitadas e sucateadas por práticas recorrentes de assédio moral e institucional”, diz o programa de governo de Lula.

O tema da mineração

Área de garimpo ilegal na região do Homoxi, nos limites da Terra Indígena Yanomami, em Roraima (Foto: Bruno Kelly/Amazônia Rea)l.

O petista, presidente da República em dois mandatos (2003-2006 e 2007-2011), defende a mineração “por meio de maiores encadeamentos industriais internos e compromisso com a proteção ao meio ambiente, direitos dos trabalhadores e respeito às comunidades locais”. 

Ele não detalha o que fará, caso eleito, em relação a essa questão sensível e controversa. Afirma apenas que o padrão de regulação minerária deve ser aperfeiçoado e defende que a mineração ilegal, principalmente na Amazônia, seja combatida. No debate presidencial, na TV Globo, na última quinta-feira (29), ele chegou a afirmar que vai proibir a mineração em terras indígenas.

Como é comum em seus discursos, Lula cita em seu plano as conquistas de seu governo. Afirma, assim, que reduziu em 80% o desmatamento na Amazônia e contribuiu de forma importante para mitigar os efeitos das mudanças climáticas. Promete cumprir as metas de redução de emissão de gás carbono, assumidas na Conferência de 2015 em Paris.

“A emergência climática se impõe e a ciência não deixa margem para dúvidas: o aquecimento global é inequívoco, promovido pelo atual padrão de produção e consumo, com resultados cada vez mais catastróficos”, afirma o programa de governo petista, também sem detalhar como equilibrar crescimento econômico com mudanças no padrão de produção e consumo.

O mesmo tom é adotado em relação ao agronegócio. “A produção agrícola e pecuária é decisiva para a segurança alimentar e para a economia brasileira, um setor estratégico para a nossa balança comercial”, diz o plano registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “Precisamos avançar rumo a uma agricultura e uma pecuária comprometidas com a sustentabilidade ambiental e social. Sem isso, perderemos espaço no mercado externo e não contribuiremos para superar a fome e o acesso a alimentos saudáveis dentro e fora das nossas fronteiras”, arremata. 

“Direito ao meio ambiente”

  • Lula (PT) em campanha na cidade de Belém do Pará com lideranças indígenas (Foto: Ricardo Stuckert)
  • Lula (PT) em campanha na cidade de Manaus, Amazonas, com lideranças indígenas (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
  • Jair Bolsonaro (PL) faz “arminha” na Marcha Para Jesus, em 2019 (Foto:Reprodução/Mídia Ninja)
  • Jair Bolsonaro (PL) durante entrevista ao apresentador Sikêra Júnior, em Manaus-Amazonas ((Manaus – AM, 23/04/2021) (Foto: Alan Santos/PR)
  • Ciro Gomes (PDT) em campanha na cidade de Belém-Pará (Foto: Reprodução/Redes sociais)
  • Ciro Gomes (PDT) em campanha na cidade de Belém-Pará (Foto: Reprodução/Redes sociais)
  • Simone Tebet (MDB) visita Belém do Pará em campanha (Foto: Reprodução/Redes sociais)
  • Simone Tebet (MDB)em almoço com o governador Hélder Barbalho no Mercado Ver-o-Peso em Belém (Foto: Divulgação)

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Em busca de uma sobrevida na política, Bolsonaro tenta a reeleição com a defesa da liberdade para exploração econômica da Amazônia. É baseado nesse ponto de vista que ele cita os indígenas e comunidades quilombolas. O atual presidente relaciona os povos tradicionais à defesa de atividades como etnoturismo, comercialização de artesanatos, extrativismo sustentável, criadouros, pecuária, agricultura, mineração e infraestrutura.

Segundo ele, em seu governo a Funai investiu 10 milhões de reais “no suporte a atividades produtivas nas aldeias e no apoio à psicultura, roças de subsistência, confecção de artesanato, produção agrícola, casas de farinha, casas de mel e etnoturismo – turismo em terras indígenas”. 

Em relação ao uso de recursos naturais, Bolsonaro em um segundo mandato seguirá na mesma toada, como fica claro em seu programa de governo que destaca, em letras maiúsculas, o termo liberdade e a citação do artigo 225 da Constituição Federal: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do cidadão e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”, diz o artigo constitucional.

O governo bolsonarista afirma que sua gestão na Amazônia é explorada de maneira distorcida por uma parcela das mídias internacionais e nacionais. Além dos índices históricos de desmatamento, a atual gestão ficou marcada pela postura agressiva de Ricardo Salles, ex-ministro do Meio Ambiente. Em uma reunião ministerial, em abril de 2020, ele defendeu que o governo fosse “passando a boiada” para simplificar as normas vigentes de proteção ambiental.

Na campanha pela reeleição, Bolsonaro, que visitou Belém na reta final da campanha e não citou a palavra “Amazônia” uma única vez, prega que o governo propicie a todos a liberdade para usar de forma responsável os recursos naturais e defende um “crescimento ordenado, equilibrando proteção ambiental com crescimento econômico justo e sustentável”.

Em relação ao agronegócio, um dos setores mais identificados com o atual governo, a defesa é de políticas que tornem o segmento mais competitivo e com acesso a novas tecnologias. O presidente promete intensificar “ações de promoção de competitividade e transformação do agronegócio, por meio do desenvolvimento e da incorporação de novas tecnologias biológicas, digitais e portadoras de inovação, permitindo o crescimento vertical da agropecuária, com sustentabilidade econômica, social e ambiental”.

Crise climática

Queimadas Reserva do Jamanxin, Novo Progresso no Pará (Foto: Cícero Pedrosa Neto/Amazônia Real/2022)

Bolsonaro, que desde antes de assumir o mandato, passou a estimular a mineração, trata a atividade como indispensável ao desenvolvimento socioeconômico do Brasil e como um dos setores básicos da economia nacional, com destaque para a extração de minério de ferro, manganês, nióbio, alumínio e grafeno.

“Segundo publicação da ONU, o setor é responsável por cerca de 200 mil empregos diretos no país e 800 mil indiretos, respondendo por 4% do Produto Interno Bruto (PIB)”, diz o plano bolsonarista. “No próximo governo, a atividade deve ser estimulada para que se atinja o desejado desenvolvimento socioeconômico e a proteção do patrimônio ambiental, binômio que representa o desenvolvimento sustentável.”

A crise climática tem abordagem discreta – e sequer é chamada de crise. O assunto entra no texto quando é citada a necessidade de deter a degradação de ecossistemas. Ao falar sobre controle e fiscalização das queimadas ilegais, desmatamento e crimes ambientais, Bolsonaro parte para a defesa de sua gestão. O plano de governo lista “enormes esforços” que teriam sido realizados para combater os crimes ambientais e afirma que, dependendo do tipo de parâmetro, leitura de dados e estatísticas e tecnologias de imagens utilizadas, os resultados são díspares. 

Como fez durante todo o seu governo, o presidente lança dúvidas sobre as estatísticas que apontam queimadas e desmatamentos recordes. Apesar disso, o programa de governo afirma que em maio de 2022 a Força Aérea Brasileira (FAB) fez o lançamento de satélites para gerar imagens em alta resolução com o objetivo de contribuir para o monitoramento de queimadas e de desastres naturais, além do combate ao tráfico de drogas e à mineração ilegal. Cita também o plano de contratar 6 mil bombeiros para áreas como o pantanal, o cerrado e toda a região Norte.

O documento registrado no TSE estimula que constem nos calendários dos ministérios e das agências que atuam em regiões onde existem maior incidência de queimadas “ações coordenadas periódicas a fim de auxiliar na mitigação desse problema”.

Zoneamento econômico e ecológico

  • Área de Monocultura ao lado da Terra Indígena Uru-Eu-Wau Wau, no município de Seringueiras, em Rondônia. (Foto: Bruno Kelly/Amazônia Real)
  • Focos de incêndio ao longo da vicinal Paraná, via de acesso à Terra Indígena Bau, do povo Kayapó. Novo Progresso-Pa (Foto: Cícero Pedrosa Neto/Amazônia Real)
  • Vista aérea gado em Rondônia (Foto: Alexandre Cruz Noronha/Amazônia Real)
  • Garimpo ilegal nas TIs Sai Cinza e Munduruku, flagrado em sobrevoo realizado entre os dias 17 e 19 de outubro de 2021 pelo Greenpeace (Foto: Chico Batata/Greenpeace)
  • Gado e visto em area desmatada no municipio de Apui, Amaszonas Foto: Bruno Kelly/Amazonia Real.

Ciro Gomes, candidato do PDT à Presidência da República, apresenta no registro de sua candidatura diretrizes para o PND (Projeto Nacional de Desenvolvimento) e não exatamente um plano de governo. Segundo ele, a partir de uma consulta com diversos setores da sociedade será elaborado o programa definitivo.

A principal diretriz é a mudança do modelo econômico adotado pelos últimos governos. Para Ciro, é um modelo que “deixou de acreditar no setor produtivo como o motor do desenvolvimento do País” e privilegia o setor financeiro, minando a capacidade do setor privado para investir, desenvolver novidades e criar empregos.

Sintético, o documento com as diretrizes propõe os seguintes itens relacionados à pauta ambiental: investir em ciência e desenvolvimento tecnológico; reduzir a pobreza e as desigualdades sociais; ampliar o acesso a serviços básicos como água limpa e tratada, saneamento, transporte, moradia e iluminação, cultura e lazer; expandir o acesso à comunicação; garantir o acesso e respeito aos direitos humanos a todos, especialmente às minorias; reduzir o desmatamento, a emissão de gases danosos à atmosfera e viabilizar o crescimento econômico sustentável, sempre de forma soberana, promover uma revolução na educação pública.

Nas diretrizes, também há a defesa da “floresta em pé” que vale muito mais do que desmatada e um zoneamento econômico e ecológico no país, em especial na região amazônica para “defendermos nossos ecossistemas”.

“Uma  estratégia de desenvolvimento regional, associada à maior segurança fundiária, pode contribuir muito para a redução do desmatamento. Trata-se de uma estratégia que mostrará como é possível conciliar e integrar a lavoura, a pecuária e a floresta”, afirma o documento. “A pesquisa científica e tecnológica, realizada pelos próprios órgãos de pesquisa da Amazônia, encontrará novos produtos e formas de produção, os quais serão essenciais para preservar a floresta, possibilitar o seu manejo sustentável e garantir a realização de atividades econômicas à população local.”

Em relação aos povos indígenas, o pedetista afirma que as reservas territoriais destinadas a essa população devem ser respeitadas. “A cultura indígena deve ser preservada, bem como as atividades produtivas que realizam para seu sustento. Também é necessário que médicos sejam capacitados para o atendimento das enfermidades indígenas e cuidem especificamente da saúde desta população, dentre outras medidas”, dizem as diretrizes.

Tolerância zero

Gado pastando em área desmatada, no município de Apuí, Amazonas (Foto: Bruno Kelly/Amazonia Real)

Simone Tebet, candidata pelo MDB, afirma em seu programa de governo que vai cumprir rigorosamente a legislação no que diz respeito aos direitos dos povos originários na proteção de seus territórios. Também promete apoiar a agricultura familiar, as comunidades extrativistas, os quilombolas e os ribeirinhos.

Segundo ela, parte desse apoio virá na forma de crédito, extensão agrícola e cooperação técnica, incluindo melhoria das condições de conectividade e eletrificação no campo; regularização de territórios quilombolas e recuperação da Funai. 

Tebet afirma que a agenda de sustentabilidade estará em todas as políticas e ações do seu governo, caso seja eleita. “Não será algo à parte, mas o coração da nossa gestão. Porque sem preservação não há futuro. O que estão fazendo com nosso meio ambiente hoje na Amazônia, no pantanal, no cerrado, causa vergonha. Aqui e no mundo. Nunca antes se destruiu tanto quanto agora. É preciso e possível fazer diferente”, diz.

Para o setor agrícola, ela promete um plano de safra plurianual, com diretrizes de financiamento e crédito agrícola, seguro rural e armazenagem de médio e longo prazos. Garante que a agricultura familiar merecerá apoio com crédito, extensão agrícola e cooperação técnica.

programa de governo da emedebista defende a retomada do Fundo Amazônia e a criação de uma secretaria executiva para coordenar e integrar políticas intersetoriais para a região, com objetivo de sustentabilidade ambiental, econômica e social.

Em relação à crise climática, a promessa da candidata é a de acelerar o alcance de metas de redução de gases de efeito estufa e de reflorestamento previstas em acordos internacionais, além de fortalecer órgãos como o ICMBio e o Ibama. 

“Vamos deter a devastação da Amazônia, recuperar áreas degradadas e assegurar a oferta de infraestruturas sociais e econômicas que garantam a melhoria das condições de vida”, diz o programa. Segundo Tebet, é preciso enfrentar o crime organizado que patrocina a destruição da floresta. “O compromisso do meu governo é claro: desmatamento ilegal zero”.

A candidata afirma que passará um pente-fino nas medidas tomadas pelo governo atual que resultaram em incentivo ao desmatamento e à devastação. Em sua opinião, é preciso acabar com a “falsa dicotomia” que opõe meio ambiente e desenvolvimento. “Em sua imensa maioria, o setor produtivo brasileiro – e o agro em particular – já produz com sustentabilidade e responsabilidade. No entanto, em contrapartida, os que destroem, devastam e desmatam ilegalmente serão tratados com total rigor e tolerância zero pelo nosso governo”.

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Fonte: https://amazoniareal.com.br/eleicoes-2022/

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