Por Francisco Costa
Em operação, agentes da Polícia Federal incendiaram 94 dragas no rio Madeira, o que gerou manifestações contrárias, como o bloqueio da BR-319, em Porto Velho. Na imagem, momento da destruição das balsas e dragas dos garimpeiros ilegais (Foto: Reprodução/PF)
Porto Velho (RO) – Garimpeiros em Rondônia incendiaram pneus e bloquearam o acesso à BR-319 em Porto Velho, no sentido Humaitá ao Amazonas, no fim da tarde da quarta-feira (12) e nesta quinta-feira (13). A reação violenta foi uma resposta à Polícia Federal (PF), que incendiou 94 dragas que faziam a extração ilegal no Rio Madeira. Novos protestos já estão sendo organizados, caso a destruição do maquinário não seja interrompida, prometem os garimpeiros.
De acordo com a PF, foi necessário destruir os equipamentos dos garimpeiros para impedir a continuidade dos crimes ambientais. A operação, que ocorreu em Rondônia e no Amazonas, contou com apoio do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). A PF disse que só irá se manifestar após a conclusão da operação.
Os garimpeiros reagiram contra a destruição das dragas, também chamadas de balsas. “É um abuso o que estão fazendo, somos trabalhadores. Estão agindo de maneira ilegal para nos prejudicar. Nem tivemos tempo de remover nossos pertences das balsas. Essa operação já chegou destruindo tudo”, disse Jerry Nunes, representante do movimento dos trabalhadores do garimpo. É Nunes quem assegurou que mais protestos serão realizados caso a PF continue atuando “para impedir nosso trabalho e sustento de nossas famílias”.
O clima ficou tenso entre os manifestantes e a Polícia Militar, que negociou a liberação da BR-319. Foram mais de três horas de bloqueio que resultou em um grande congestionamento. O manifesto impediu o trânsito de pedestres, carretas, caminhões, carros de pequeno porte e motoqueiros. O Corpo de Bombeiros foi acionado para impedir que as chamas dos pneus queimando se propagassem. O protesto tinha como objetivo cobrar respostas do governo estadual e federal para a destruição das dragas usadas para remover ouro do leito do Madeira.
Mulheres dos garimpeiros filmam destruição
Vídeo do site Rondôniavivo
Em circunstâncias normais, as autoridades oficiais procurariam se afastar de protestos praticados por garimpeiros ilegais. Mas na tarde desta quinta-feira (13) o governador coronel Marcos Rocha (UB), que tenta a reeleição em Rondônia contra o senador Marcos Rogério (PL), reuniu-se com os manifestantes e decidiu que o Estado vai tentar uma reunião com o Ministério da Justiça. Objetivo: mediar um diálogo para impedir que novas balsas de garimpo sejam destruídas. O governo de Jair Bolsonaro, e o presidente particularmente, são defensores do garimpo na Amazônia.
“Certamente o presidente (Bolsonaro), vai ser contrário a isso. Vou tentar falar com o ministro (da Justiça) Anderson (Torres). Vamos verificar o que o Estado poderá fazer”, disse o governador, que comentou que pedirá apoio da bancada federal. Em diálogo com os garimpeiros, Marcos Rocha afirmou ainda: “O Estado está ao lado de vocês, estou tentando descobrir uma forma de ajudá-los. E não pediria a vocês que liberassem a BR para que outros possam trabalhar se eu não estivesse ao lado de vocês”. Na conversa, ele chamou os garimpeiros de “trabalhadores” diversas vezes.
O tenente-coronel do Corpo de Bombeiros, Felipe Bernardo Vital, 38, que foi nomeado como secretário de segurança pública de Rondônia, também seguiu no mesmo discurso. “O Estado reconhece o garimpo como atividade econômica e entende que trata-se do sustento de muitos. O governador está tentando com o Ministério da Justiça, que aqueles que apresentem irregularidades tenham outra solução, que não a destruição de seus equipamentos”, afirmou.
A operação da Polícia Federal iniciada nesta quarta-feira (12), ainda não tem data para ser concluída. “Após a constatação de diversas irregularidades e observando se tratar da estrutura que permite a realização de atividades de garimpo ilegal, foi necessária a realização de medidas para a inutilização dos equipamentos irregulares”, informou a PF em um comunicado à imprensa. “É importante observar que as embarcações eram destinadas à prática de atividades ilegais de garimpo, acarretando prejuízos ao meio ambiente e à saúde da população, e havia impossibilidade fática de guarda, transporte ou apreensão do equipamento.”
As dragas ou balsas dos garimpeiros são embarcações ou estruturas flutuante destinadas a retirar o ouro do fundo do rio. A atividade poluiu o meio ambiente pelo uso de produtos químicos, especialmente mercúrio. Cada equipamento pode custar mais de R$ 1 milhão reais, segundo garimpeiros do Amazonas.
Apoio de políticos
- Balsas de garimpo na região do Rosarinho no rio Madeira, em Autazes, Amazonas, em julho deste ano (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
- Balsas de garimpo na região do Rosarinho no rio Madeira, em Autazes, Amazonas, em julho deste ano (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
- Balsas de garimpo na região do Rosarinho no rio Madeira, em Autazes, Amazonas, em julho deste ano (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
- Balsas de garimpo na região do Rosarinho no rio Madeira, em Autazes, Amazonas, em julho deste ano (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
- Balsas de garimpo na região do Rosarinho no rio Madeira, em Autazes, Amazonas, em julho deste ano (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
- Balsas de garimpo na região do Rosarinho no rio Madeira, em Autazes, Amazonas, em julho deste ano (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
- Balsas de garimpo em estaleiro no Cacau Pirêra, em frente de Manaus, próximo à ponte do rio Negro, em julho deste ano (Foto; Alberto César Araújo/Amazônia Real)
- Balsas de garimpo na região do Rosarinho no rio Madeira, em Autazes, Amazonas, em julho deste ano (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
- Balsas de garimpo na região do Rosarinho no rio Madeira, em Autazes, Amazonas, em julho deste ano (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
- Balsas de garimpo na região do Rosarinho no rio Madeira, em Autazes, Amazonas, em julho deste ano (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
Essa é a terceira operação que a Polícia Federal faz para destruir dragas no rio Madeira entre os estados do Amazonas e Rondônia, em quase um ano. Em novembro de 2021, foram destruídas 165 embarcações nas operações Uiara I e Uiara II. Os garimpeiros afundaram ou esconderam as dragas nos lagos encobertos por vegetação para escapar da ação nas regiões de Autazes, Nova Olinda do Norte e Borba, no Amazonas. No total, mais de 300 dragas foram localizadas na região de Rosarinho, o que teria levado ao local, cerca de 1,8 mil garimpeiros para o município.
Em julho deste ano, a Amazônia Real fez um sobrevoo no rio Madeira e flagrou ao menos 20 dragas de garimpeiros operando livremente na parte mais ao centro do Amazonas. As dragas estavam no entorno das comunidades ribeirinha Rosarinho e indígena Urucurituba, no município de Autazes (AM), nas proximidades do município de Nova Olinda do Norte. Na mesma região, a reportagem identificou desmatamentos no entorno das terras indígenas do povo Mura. Após a publicação, a PF destruiu o maquinário e as embarcações dos garimpeiros.
No Amazonas, a exploração ilegal de minérios conta com o apoio de políticos locais. Na ocasião da descobertas das 20 dragas em Autazes, o deputado estadual Roberto Cidade, do partido União Brasil, o mesmo do governador Wilson Lima, e ambos da base governista do presidente Jair Bolsonaro (PL), afirmou que é a favor da legalização do garimpo no rio Madeira. “Preciso ser realizada uma audiência pública para não acontecer o que aconteceu meses atrás, a Polícia Federal foi lá explodiu tudo, as pessoas perderam sua balsa, pessoas de bem que estavam lá. Sou a favor da legalização”, disse no plenário, ignorando a decisão da Justiça Federal.
Decreto pró-garimpo
Em janeiro de 2021, o governador Coronel Marcos Rocha publicou um decreto regulamentando o garimpo no Madeira e revogou lei anterior de 1991, que proibia extração de minério ou garimpagem no rio, compreendido pela Cachoeira Santo Antônio e a divisa interestadual de Rondônia com Amazonas.
Em junho deste ano, o Tribunal de Justiça de Rondônia tornou inconstitucional um trecho da lei publicada pelo governo estadual. O pedido do TJ, seguiu orientação do Ministério Público Estadual (MPE) que justificou dizendo que “quanto à permissão para a utilização de substâncias químicas no exercício da atividade de garimpo, o decreto foi além da mera complementação ou regulamentação legislativa, prevista para esse tipo de instrumento, divergindo do compromisso internacional do Estado Brasileiro na Convenção de Minamata e de disposições legais que regulam o uso de mercúrio e de cianeto na extração de minério”. Segundo o MPE, a legislação de 1991 defendia a preservação do meio ambiente, além da saúde da população abastecida pelo rio e o patrimônio histórico, cultural e paisagístico.
A PF, no comunicado à imprensa, reitera que a ação para desestruturar as “organizações criminosas que lucram causando imensos prejuízos ambientais com atividades ilegais de mineração” procura frear a destruição do meio ambiente, o que inclui a modificação do curso original do rio, a destruição da vegetação ribeirinha, a contaminação das águas e dos peixes por mercúrio.
O garimpo ilegal na Amazônia movimenta mais de 3 bilhões de reais e ultrapassa 20 milhões de toneladas por ano a quantidade de metais preciosos que circulam sem conhecimento das autoridades reguladoras. Os conflitos na corrida do ouro no Rio Madeira em Rondônia acontecem desde os anos 1980.
Veja o vídeo: governador Coronel Marcos Rocha apoia o garimpo
https://www.facebook.com/watch/live/?ref=watch_permalink&v=1284557572297144
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