Por Leanderson Lima

Entidades publicam carta de repúdio à indicação do vereador de Barreirinha, Mecias Pereira Batista Júnior, o Bulete (PDS), para ser coordenador do Distrito Sanitário Especial de Saúde Indígena; o pai, ex-prefeito, já foi condenado a devolver 2,5 milhões de reais por não comprovar como gastou recursos para uma escola (Foto: Câmara Municipal de Barreirinha).


Manaus (AM) – Golpe, falta de respeito, ameaça. Sem rodeios, lideranças condenaram a tentativa de emplacar um político sem legitimidade junto aos indígenas como coordenador do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Parintins, no Baixo Amazonas. Tão logo souberam da ida do ex-prefeito de Barreirinha, Mecias Pereira Batista, e de seu filho, o vereador Mecias Pereira Batista Júnior, o Bulete (PDS), para Brasília, os indígenas produziram uma carta de repúdio a essa movimentação de bastidor.

O Conselho Geral da Tribo Sateré-Mawé, Associação dos Tuxauas do Rio Marau, Miriti, Manjuru e Urupadi-Tumupe, Associação dos Kapi, entre outras lideranças, souberam que Mecias e Bulete se reuniram dia 2 de março com o novo secretário de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, Weibe Tapeba, como foi noticiado pela imprensa de Barreirinha. Além de pai e filho, estiveram no encontro o coordenador do Departamento de Assistência ao Índio de Barreirinha, Jecinaldo Sateré; e Darlan Taveira, que é representante da capital Manaus.

O documento foi encaminhado à Casa Civil, Ministério da Saúde, Ministério dos Povos Indígenas, Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), à Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e à Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Amazonas (Apiam). As lideranças exigem participação dos povos indígenas na escolha do novo ocupante do cargo.

“O Lula criou o Ministério dos Povos Indígenas, colocou na Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), uma presidente indígena (Joenia Wapichana). Não podemos ficar olhando políticos bagunçando os nossos direitos”, criticou o capitão-geral das 63 aldeias Sateré-Mawé, do rio Andirá, João Sateré. Ele lembrou que os povos indígenas contam com quadros altamente qualificados para assumir funções na administração pública.  “Nós temos indígenas que são doutores, advogados, administradores, para colocar em qualquer setor administrativo do governo”, pontuou João.

O líder indígena lembra que o correto seria a realização de uma consulta, conforme prevê o artigo 231 da Constituição Federal, no inciso 3º, para então ser composta uma lista tríplice que indicaria o novo coordenador para o Dsei de Parintins.

“E nós não fomos ouvidos. A nossa grande preocupação é levar para Brasília essa indicação política. O pai dele [Mecias Pereira Batista] já foi prefeito [de Barreirinha] e não fez coisa nenhuma pela aldeia. Na Terra Indígena Andirá, deixou problemas na educação e saúde. Ele expulsou um projeto de saúde que eu trouxe em 1989. Ele não fazia todos os repasses do governo estadual. Nunca entregou nada na reserva. É realmente um golpe para nós”, lamenta a liderança Sateré-Mawé.

“Olha, para mim isso é uma falta de respeito”, resumiu o presidente da Organização das Lideranças Indígenas Sateré-Mawé dos rios Marau, Miriti, Urupadi e Manjuru (Tumupe), Samuel Lopes. “Antes de tudo as bases devem ser consultadas e isso não aconteceu. Isso revolta muito, principalmente porque é parente e se diz representante do povo. Não é esse tipo de representante que precisamos, que quer manipular as lideranças a troco de favores políticos em benefício próprio. Se for uma indicação política, não serve. Se torna uma ameaça para a nação porque enfraquece o movimento indígena.”

Histórico familiar 

Mecias Sateré e Bulete (Foto: Câmara Municipal de Barreirinha)

Ex-prefeito de Barreirinha, o pai de Bulete, Mecias Pereira Batista, o Mecias Sateré, responde na Justiça Federal por apropriação de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio; [tipificada no art. 1º, I, do Decreto-Lei 201/1967].

O processo N° 0011674-80.2018.4.01.3200 tramita na 2ª Vara da Justiça Federal, no Amazonas. Na denúncia de 28/8/2016, consta que o ex-prefeito teria desviado recursos públicos recebidos pelo município, através do Termo de Compromisso PAC 0353/2010 firmado com o Fundo Nacional de Saúde (Funasa).

O objetivo do convênio era a construção de 199 melhorias sanitárias no município. Segundo a denúncia, o ex-prefeito teria deixado de prestar contas da terceira parcela do convênio. Uma vistoria feita por engenheiros do Ministério da Saúde constatou que 74,87% das obras não haviam sido concluídas. Por meio do parecer técnico, houve desvio de pelo menos 25% do valor das obras, estimado em 301.303,40 reais à época. A denúncia aponta que o ex-prefeito deveria ter prestado contas em 2016, mas não foi isso que aconteceu.

A denúncia foi aceita em 30 de agosto de 2018, e a última movimentação da ação penal  N° 0011674-80.2018.4.01.3200 foi realizada no dia 10 de outubro de 2018. 

O ex-prefeito de Barreirinha também foi denunciado por suspeita de desviar aproximadamente 400 mil reais para a compra de passagens aéreas para familiares. Segundo o Ministério Público Estadual os desvios promovidos por Sateré ocorreram entre os anos de 2009 a 2016. Filhos, cunhados e netos do prefeito teriam se beneficiado das viagens. 

Além do processo na Justiça Federal, em 2020, Mecias Sateré também foi condenado pelo Tribunal de Contas do Estado do Amazonas, a devolver  2,5 milhões de reais aos cofres públicos. Ele foi condenado por não conseguir justificar o gasto de 1,4 milhão de reais em uma escola pública.

Exoneração em massa

Ação do COE Yanomami – Assistência às comunidades indígenas na Casai de Boa Vista (Foto: Ministério da Saúde)

No Brasil, existem 34 Dseis que são divididos por critérios territoriais que não apenas cidades ou estados, mas áreas contíguas, e a função deles é de atuar junto às comunidades indígenas. A estrutura de atendimento conta com várias unidades básicas de saúde indígena, nos polos-base e também nas chamadas Casas de Saúde Indígena (Casai).

Durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), a política indígena passou por um desmonte. Tanto que depois de decretar a situação de emergência na Terra Indígena Yanomami, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva exonerou de 11 coordenadores distritais de saúde indígena do Ministério da Saúde. A agência Amazônia Real conferiu a situação precária de atendimento da Casai em Boa Vista (RR), para onde parentes e indígenas esperam por um retorno às suas aldeias.

Entre os exonerados, estava o coordenador do Dsei de Parintins, Átila Rocha. O órgão é responsável pela saúde indígena de povos que ficam nos municípios de Barreirinha, Nhamundá, Boa Vista do Ramos e Maués.

Sem resposta 

A reportagem de Amazônia Real procurou o vereador Mecias Júnior e o pai dele. Na Câmara Municipal de Barreirinha, informaram que o vereador estava em viagem. Pelo celular, Mecias também não retornou as ligações. A agência procurou também o Ministério da Saúde, já que  o Dsei de Parintins é subordinado à pasta, mas também não obteve retorno. 

Fonte: https://amazoniareal.com.br/dsei-de-parintins/

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