Philip M. Fearnside, Lucas Ferrante, Aurora M. Yanai e Marcos Antonio Isaac Júnior


Um ramal ilegal está sendo construído para conectar Tapauá, no rio Purus, com a rodovia BR-319. Isto ameaça não só as duas Terras Indígenas e um Parque Nacional que estão localizados entre Tapauá e a BR-319, mas também forneceria uma porta de entrada à região Trans-Purus. O ramal illegal, já visível em imagens de satélite em 2007, vem sendo construido a partir de Tapauá em direção à BR-319, seguindo quase exatamente a rota da planejada AM-366 (Figuras 2-4). O ramal ameaça as Terras Indígenas Apurinã do Igarapé São Jõao e Apurinã do Igarapé Tauamirim, além do Parque Nacional Nascentes do Lago Jari.

Segundo o cacique Waldemiro Farias da Silva Apurinã, o ramal está sendo construído por fazendeiros locais com o encorajamento da prefeitura de Tapauá, com uso de máquinas da prefeitura. Ouvimos vários relatos em Tapauá sobre um acordo com fazendeiros na margem da BR-319 para que esses construíssem um ramal na direção oposta para encontrar com o ramal que está sendo construído a partir de Tapauá. A ameaça é imediata.

Figura 2. Imagem de satélite de 2018 mostrando um ramal ilegal saindo de Tapauá em direção à rodovia BR-319. O ramal é a linha fina descendo diagonalmente de Tapauá, no canto esquerdo superior, em direção ao centro da imagem.

Figura 3. Traçado do ramal ilegal a partir de imagens LANDSAT de 2007, 2018 e 2019.

Figura 4. Localização do ramal com relação à rota planejada da AM-366 (conforme [1]), o Parque Nacional Nascentes do Lago Jari e as Terras Indígenas Apurinã do Igarapé São João e Apurinã do Igarapé Tauamirim, com desmatamento (em vermelho) até 2019 segundo o projeto PRODES do INPE [2].

O cacique Waldemiro Apurinã confirmou em 20/08/20 que o ramal está avançando rapidamente e que invasores estão desmatando dentro da Terra Indígena Apurinã do Igarapé São João, como é mostrado pelas suas fotos (Figuras 5-7). O cacique relatou que os invasores não são indígenas e que os indígenas têm muito medo de ir a estas áreas, pois a derrubada de árvores é massiva mesmo dentro da Terra Indígena, colocando todas as aldeias em risco. Segundo o cacique, indígenas estão sendo ameaçados.

Figura 5. Ramal ilegal beirando Terra Indígena Apurinã do Igarapé São João. Foto: Cacique Waldemiro Apurinã.

Figura 6. Desmatamento mostrando a placa da Terra Indígena Apurinã do Igarapé São João. Foto: Cacique Waldemiro Apurinã.

Figura 7. Desmatamento por invasores não indígenas na Terra Indígena Apurinã do Igarapé São João. Foto: Cacique Waldemiro Apurinã.

Em 25 de agosto, o Cacique protocolou uma denúncia junto ao Ministério Público Federal e pediu para que seja divulgada (Figura 8) . A carta também pode ser lida aqui.

REFERÊNCIAS

[1] DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes). 2002. Mapa Rodoviário Amazonas. DNIT, Ministério dos Transportes, Brasília, DF.

[2] INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). 2020. PRODES – Monitoramento da Floresta Amazônica Brasileira Por Satélite. INPE, São José dos Campos, SP.


A imagem deste artigo mostra o rio Purus próximo a Tapauá durante a seca de 2005 (Foto Daniel Beltrá/Greenpeace)


Leia o primeiro artigo da série:

Região Trans-Purus, a última floresta intacta: 1 – Por que é importante?

Philip Martin Fearnside é doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 600 publicações científicas e mais de 500 textos de divulgação de sua autoria que estão disponíveis aqui.

Lucas Ferrante é doutorando em Biologia (Ecologia) no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). Tem pesquisado agentes do desmatamento, buscando políticas públicas para mitigar conflitos de terra gerados pelo desmatamento, invasão de áreas protegidas e comunidades tradicionais, principalmente sobre Terras indígenas e Unidades de Conservação na Amazônia.

Aurora Miho Yanai é pós-doutoranda no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) trabalhando com modelagem de desmatamento na região Trans-Purus. Ela tem mestrado e doutorado pelo Inpa em ciências de florestas tropicais e tem experiência na análise e modelagem de desmatamento no sul do Amazonas.

Marcos Antonio Isaac Júnior é pós-doutorando no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) trabalhando com modelagem de desmatamento na região Trans-Purus. Ele tem mestrado e doutorado em engenharia florestal pela Universidade Federal de Lavras e tem experiência em modelagem e redes neurais.

 

Fonte: https://amazoniareal.com.br/regiao-trans-purus-a-ultima-floresta-intacta-2-a-ameaca-do-ramal-de-tapaua/

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