O relatório final da Comissão Externa da Câmara dos Deputados, apresentado nesta quarta-feira (30), responsabiliza o Estado brasileiro por não se fazer presente no Vale do Javari, no Amazonas, que está tomado pelo tráfico de drogas internacional, a pesca e o garimpo ilegal. Em 5 de junho, o indigenista Bruno Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips foram brutalmente assassinados na região, caso que ganhou repercussão mundial e chamou a atenção para a inexistência do poder público na proteção dos povos indígenas. 

Segundo o relatório, é necessária, e de forma imediata, a criação e implementação de um Plano Emergencial para Ações de Proteção Territorial no Vale do Javari. O documento mostra como a região está tomada pelo tráfico de drogas internacional, a pesca e o garimpo ilegal, o que causa um sentimento de insegurança para os ribeirinhos e indígenas que vivem na área. Um grupo de parlamentares da comissão visitou o Vale do Javari, onde teve conversas com a população.

O relatório, apresentado pela deputada federal Vivi Reis (Psol/PA), foi produzido em parceria com o Senado. Dividido em seis partes, ele apresenta um resumo sobre um aprofundamento das investigações, alertando as ações que devem ser tomadas para evitar novas “tragédias anunciadas”, como afirmou a parlamentar. No dia 25 deste mês, a deputada havia apresentado o relatório aos familiares e entidades da sociedade civil, que fizeram contribuições e que já foram incluídas no texto final.

Além dos fatos circunstanciais sobre os assassinatos de Bruno e Dom, o relatório também cita a morte do indigenista Maxciel Pereira dos Santos, em setembro de 2019, que continua impune. Para a construção do documento, foram ouvidos indígenas, indigenistas, parentes das vítimas, servidores da Funai e outras autoridades, além da realização de visitas técnicas em Atalaia do Norte, região que fica próxima à fronteira com o Peru.

O documento, aprovado pelos presentes na sessão do Congresso para que as diligências sejam providenciadas, contradiz “o discurso inicial de autoridades governamentais”, que afirmavam que os crimes foram praticados por pescadores de menor porte, tratando-se de um caso isolado. O relatório afirma que os delitos na região “envolvem uma rede milionária interligada à pesca ilegal e a outros delitos praticados no território indígena”, conforme a própria Amazônia Real noticiou à época.

A Justiça Federal marcou para os dias 22, 23 e 24 de janeiro as audiências de instrução e julgamento dos três acusados, Amarildo da Costa Oliveira (o “Pelado”) – assassino confesso das vítimas –, seu irmão, Oseney da Costa Oliveira (o “Dos Santos”), e Jefferson da Silva Lima (o “Pelado da Dinha”). O Ministério Público Federal acusa o trio por duplo homicídio qualificado e ocultação dos cadáveres de Bruno e Dom. Segundo as investigações da Polícia Federal, há uma atuação criminosa e armada de ribeirinhos das comunidades São Gabriel e São Rafael, localizadas às margens do rio Itacoaí, no município de Atalaia do Norte, na divisa com a Terra Indígena (TI) Vale do Javari. Esse grupo seria responsável por invasões e pesca predatória de pirarucus e tracajás na TI Vale do Javari – crimes que foram denunciados por Bruno Pereira e que fez dele um alvo dos criminosos.

Tragédia anunciada

A deputada Vivi Reis na leitura do Relatório (Foto: Agência Câmara)

Para Vivi Reis, as autoridades públicas sabem das atividades ilegais e mesmo assim, pouco ou nada fazem para evitá-las. “Infelizmente, é mais uma tragédia anunciada na Amazônia e, se nada for feito, outras tragédias irão ocorrer. É urgente tomar medidas de proteção para os indígenas, servidores e representantes de entidades indigenistas locais, da mesma forma, que é preciso concluir as investigações e, após o devido processo criminal, responsabilizar os executores, os mandantes e os financiadores”, afirma.

O relatório traz uma cronologia das investigações sobre os fatos, até culminar com os assassinatos de Bruno e Dom. Ressalta, por exemplo, a exoneração, sem nenhuma razão administrativa, do indigenista na época em que era servidor da Funai. A própria Fundação reconhece que Bruno Pereira colaborava em defesa dos povos indígenas e do meio ambiente.

Por fim, o relatório recomenda a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para continuar a apuração dos fatos e também que o documento seja levado à equipe de transição do governo do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva. Mesmo que às vésperas do fim do mandato de Jair Bolsonaro, o documento faz a indicação para o Ministério da Justiça pela substituição imediata do presidente da Funai, Marcelo Augusto Xavier da Silva. Outras duas recomendações são a adoção de medidas urgentes de combate à criminalidade no Vale do Javari e o convite para que o Ministério das Relações Exteriores atue também nas investigações.

Relatório entregue hoje pela Comissão da Câmara (Foto: Ascom Vivi Reis)

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É paraense, filha das periferias belenenses. Graduada em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo. Também concluiu um MBA em Gestão Estratégica de Marketing e Comunicação Digital. Atuou como assessora de comunicação no terceiro setor na Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH) e da UNIPOP (Instituto Universidade Popular), entre os anos de 2015 a 2020, no Estado do Pará. Faz reportagens que abordam diversas temáticas indígenas.

Fonte: https://amazoniareal.com.br/relatorio-final/

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