Em carta, entidades da Via Campesina Brasil reiteraram postura irresponsável de Bolsonaro por basear sua política a partir do conflito constante contra as instituições e promover sistemático desmonte dos direitos das classes populares e da soberania nacional.

As organizações que compõe a Via Campesina Brasil tornaram público nesta segunda-feira, 30, um documento “em defesa da vida, solidariedade, organização e luta”. No texto, grupo chama atenção para as distintas crises desencadeadas pela pandemia do Coronavírus e direciona as instabilidades a um único motor propulsor: o atual modelo econômico. “É possível estarmos diante de uma crise que vai redefinir o mundo com profundas repercussões na reorganização econômica, política e ideológica impactando Estados, territórios e os povos”, pontua a nota.

A posição das organizações está embasada em análises conjunturais internacionais impulsionada pela pandemia, que evidencia como primeiro fator a grave crise de saúde pública, agravada no Brasil pela crise política-institucional “marcada pela ascensão neofascista”.

O texto a reiterada postura irresponsável do governo Bolsonaro por basear ” sua política a partir do conflito constante contra as instituições, a ciência, a cultura e promove sistemático desmonte dos direitos das classes populares e da soberania nacional”. Para grupo, Bolsonaro “se abstém da condição de presidente concentrando seu esforço em produzir polêmicas para animar sua base eleitoral alimentada pela maquinaria de notícias falsas – Fake News – nas redes sociais”

“Nós defendemos a vida em primeiro lugar e, vivos, vamos recuperar a economia, pois não queremos o genocídio do povo brasileiro” – Via Campesina

As medidas tomadas pelo Governo Federal no campo da economia também é denunciada como “exclusivo conteúdo de proteger bancos e grandes empresas em completo detrimento de políticas de Estado”. No texto, entidades destacam a ineficiência do Estado brasileiro diante urgentes ações “que protejam trabalhadores formais e informais, assim como setores vulneráveis”.

A presente postura do Governo Federal “tende a agravar ainda mais a crise, produzindo quadro simultâneo de pandemia aguda, fome e violência social”. Contudo, movimento  presente em todo o território nacional que reúne campesinos, pequenos agricultores, indígenas, migrantes, afirma não admitir “que mais uma vez os mais ricos se apoderem dos recursos públicos para não contabilizarem qualquer tipo de prejuízo individual, em especial o capital financeiro”.

Como medida a ser estabelecida e que visem a proteção dos/as trabalhadores/as, a via Campesina Brasil pede que Governo Federal e Congresso Nacional caminhem para taxar grandes fortunas, moratória da dívida pública e imediata suspensão da Emenda Constitucional 95, que congelou os gastos da União com despesas primárias, como saúde, por 20 anos.

“Os recursos do Estado devem ser para salvar o povo da pandemia e da crise econômica” – Via Campesina Brasil

A Via Campesina Brasil ainda faz um chamado aos movimentos populares do campo e da cidade, igrejas, artistas, intelectuais, estudantes, governos estaduais e municipais a defender a vida e a solidariedade como base para gerar um ambiente sem pânico e exigir medidas sanitárias e econômicas adequadas do governo. “O objetivo é criar as condições materiais e psicossociais para convocação da sociedade brasileira a responsabilidade e cooperação social para vencer a pandemia”, clama o documento.

Leia a nota na íntegra:

EM TEMPOS DE CRISE: DEFESA DA VIDA, SOLIDARIEDADE, ORGANIZAÇÃO E LUTA

O mundo enfrenta uma combinação de crises jamais vivenciadas na era moderna: uma vasta crise sanitária, de saúde pública, ocasionada pela pandemia do COVID-19; uma crise estrutural nos padrões de acumulação de capital sob predomínio do capital financeiro e fictício, afetando cadeias globais de produção como petróleo e o mercado de capitais; e uma crise geopolítica derivada da emergência da China e outros países da Eurásia como potências econômicas e políticas depois de décadas de supremacia estadunidense.

Estas crises combinadas ao aquecimento global e mudanças climáticas, agora menos evidente, denunciam a grave crise civilizatória que a ordem do capital produziu e os desafios históricos colocados para as sociedades humanas. É possível estarmos diante de uma crise que vai redefinir o mundo com profundas repercussões na reorganização econômica, política e ideológica impactando Estados, territórios e os povos.

No Brasil se soma uma crise política-institucional marcada pela ascensão neofascista do governo Bolsonaro, que baseia sua política a partir do conflito constante contra as instituições, a ciência, a cultura e promove sistemático desmonte dos direitos das classes populares e da soberania nacional.

Diante da grave crise de saúde pública, a reiterada postura irresponsável do governo Bolsonaro frente as medidas sanitárias, bem como as medidas econômicas com exclusivo conteúdo de proteger bancos e grandes empresas em completo detrimento de políticas de Estado que protejam trabalhadores formais e informais, assim como setores vulneráveis, tende a agravar ainda mais a crise, produzindo quadro simultâneo de pandemia aguda, fome e violência social.

Nós defendemos a vida em primeiro lugar e, vivos, vamos recuperar a economia, pois não queremos o genocídio do povo brasileiro. E nem admitiremos que mais uma vez os mais ricos se apoderem dos recursos públicos para não contabilizarem qualquer tipo de prejuízo individual, em especial o capital financeiro. Os recursos do Estado devem ser para salvar o povo da pandemia e da crise econômica.

Uma crise de proporções catastróficas no Brasil deverá ser responsabilizada ao governo Bolsonaro e seus aliados que, ao invés de coordenar com estados e municípios, gerar ambiente de unidade e cooperação nacional, tomar medidas sanitárias e econômicas adequadas com base nas experiências exitosas de combate a pandemia, insiste em realizar ajuste fiscal em meio a crise e se abstém da condição de presidente concentrando seu esforço em produzir polêmicas para animar sua base eleitoral alimentada pela maquinaria de notícias falsas – Fake News – nas redes sociais.

Defesa da Vida e Solidariedade
Diante do quadro, duas grandes questões se colocam na ordem de prioridade frente às demais: a defesa intransigente da vida e a solidariedade como valores centrais para a superação da crise. Neste contexto, a Via Campesina Brasil conclama movimentos populares do campo e da cidade, igrejas, artistas, intelectuais, estudantes, governos estaduais e municipais a defender a vida e a solidariedade como base para gerar um ambiente sem pânico e exigir medidas sanitárias e econômicas adequadas do governo com objetivo de criar as condições materiais e psicosociais para convocação da sociedade brasileira a responsabilidade e cooperação social para vencer a pandemia.

A Via Campesina, presente em todo o território nacional, se compromete através de suas organizações a impulsionar as seguintes ações:

  1. Reforçarmos as medidas de autocuidado, de não aglomeração social e tomada de medidas sanitárias orientadas pelos profissionais e organismos de saúde com objetivo de evitar a disseminação da doença. 2. Estimular a produção de alimentos agroecológicos, de modo especial os imunoestimulantes – como gengibre, açafrão, própolis, limão e alho -, manter a oferta de alimentos a preços acessíveis e desenvolver ações voltadas ao abastecimento popular de alimentos às populações urbanas. 3. Estimular a disputa política e ideológica via redes sociais, difundindo informações verídicas e combatendo as notícias falsas. Engajar-se nas campanhas organizadas pela Via Campesina e suas organizações. 4. Aproveitar o período para estimular a criação artística e cultural, fazer exercícios, avançar nos

estudos e fortalecimento ideológico, acumulando energias para a continuidade da luta. 5. Promover o diálogo e o trabalho com amplitude junto as organizações engajadas no enfrentamento da crise, agindo de maneira coletiva e fortalecendo nossas organizações, preparando-nos para ações de solidariedade, cooperação e acolhimento com agravamento da crise e retomada da luta de massas assim que as condições sanitárias permitirem. 6. Fazer o enfrentamento a todas as formas de violência sofrida pelas mulheres, que neste período de isolamento social tem aumentado, entendendo que é preciso construir novas relações entre homens e mulheres e destes com a natureza, para constuirmos uma sociedade sem violência, sem discriminação, sem destruição e sem morte.

Contudo, compreendemos que todo o esforço das organizações populares e da sociedade civil não substitui o papel determinante e estrutural do Estado para o enfrentamento da crise, assim exigimos as seguintes medidas do governo federal

  1. Saúde: estímulo a quarentena; destinação de recursos para a plena operação do Sistema Único de Saúde com foco na prevenção, detecção e ampliação da oferta de leitos de UTI com equipamentos apropriados para o tratamento do Coronavírus; reativação do programa Mais Médicos.
  2.  Medidas econômicas de proteção dos/as trabalhadores/as: taxação de grandes fortunas, moratória da dívida pública e imediata suspensão da EC 95. Suspensão das tarifas de energia, água e distribuição gratuita de gás de cozinha em botijão para famílias de baixa renda, isenção do pagamento de aluguel; aprovação no Senado e Presidência da República do programa Renda Básica de um salário mínimo por mês.
  3.  Produção e abastecimento popular de alimentos: a. Programa específico – plano safra – para produção e abastecimento de alimentos agroecológicos; ampliação do fornecimento de alimentos via PNAE com utilização das escolas para entrega de cestas de alimentos para famílias dos alunos matriculados; manter em funcionamento restaurantes populares, bancos de alimentos e outros equipamentos de Segurança Alimentar e Nutricional adequando rotinas e protocolos para garantir a segurança dos trabalhadores/as e consumidores/as; fornecer cestas básicas à população das periferias atingidas diretamente pelas políticas de contenção, sendo os alimentos adquiridos através do PAA; apoiar e estimular fornecimento de alimentos pela agricultura familiar diretamente aos consumidores/as – delivery; manter feiras livres em funcionamento readequando horários e disposição de bancas com sistemática de orientação da vigilância sanitária. b. Manutenção da produção e abastecimento dos alimentos através da garantia de fornecimento de insumos básicos para produção agrícola e pecuária, sobretudo ração animal para as criações sob coordenação da CONAB; disponibilização e desburocratização do crédito agrícola (fomento, custeio e investimento) a juro zero; formação de estoques nas cooperativas e micro e pequenas empresas: capital de giro e estrutura de armazenagem como silos, conteineres e galpões); aquisição dos excedentes não comercializados em função da epidemia: especial atenção aos produtos hortifrútis concentrados nos CEASAS e à cadeia do leite, ampliando o programa PAA Leite, dando apoio para indústrias processarem e estocarem produtos lácteos como leite em pó.

Organização e Luta
A profunda crise de saúde pública que enfrentamos, obriga o conjunto das forças sociais a atuar de maneira coordenada, estimulando valores como a defesa da vida e a solidariedade com o objetivo de produzir unidade e cooperação nacional para sua superação. Sabemos que vencida a crise sanitária enfrentaremos o prolongamento da crise econômica com impactos tão ou mais profundos que a pandemia.

Se formos exitosos nessa tarefa e caminharmos firmemente junto ao povo contra a doença, a fome e a violência poderemos tirar energias para alterarmos a atual correlação de forças tão desfavoráveis a classe trabalhadora e as forças populares e retomarmos o caminho estratégico da luta de massas e organização política para construção do Projeto Popular para o Brasil, onde vida e solidariedade serão as bases e não faltarão!

Via Campesina Brasil. Março de 2020.

 

 

Fonte: https://cimi.org.br/2020/03/coronavirus-organizacoes-alertam-para-pandemia-aguda-fome-e-aumento-da-violencia/

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