Associações se opõem à legalização de garimpo e exigem mais recursos para a saúde
Em viagem repudiada por associações yanomamis, o presidente Jair Bolsonaro planeja visitar nesta quinta-feira (27) à comunidade Maturacá, no município de São Gabriel da Cachoeira (AM). Caso não desmarque, será a sua primeira visita a uma terra indígena como presidente.
Próxima do Pico da Neblina e da fronteira com a Venezuela, Maturacá tem 2.000 habitantes e é distante da comunidade Palimiú, alvo de constantes ataques armados de garimpeiros ilegais nas últimas semanas.
O Planalto confirmou apenas a visita de Bolsonaro a uma cidade do Amazonas, mas um avião da Presidência aterrissou em São Gabriel no domingo (23). O presidente deve chegar lá em outro avião e depois pegar um helicóptero até Maturacá, a cerca de meia hora de voo.
Em uma live no dia 29 de abril, Bolsonaro disse que planeja visitar um pelotão de fronteira do Exército (PEF), “conversar com indígenas” e “aterrisar” em um garimpo ilegal. Ele voltou a defender a regularização da atividade.
A visita foi informada aos yanomamis por militares do 5ª PEF, vizinho da comunidade Maturacá, e não foi bem recebida por líderes locais, que publicaram uma carta de repúdio à presença de Bolsonaro.
“Reiteramos nossa posição legítima de repudiar a visita do presidente, senhor Jair Messias Bolsonaro, no nosso território yanomami”, diz o documento, assinado pelo presidente da Ayrca (Associação Yanomami do Rio Cauaburis e Afluentes), José Mario Góes, pela presidente da Kumirayoma (associação de mulheres), Erica Figueiredo, e por outros quatro líderes locais.
Para eles, a visita é para “tratar e tentar acordar conosco a legalização de mineração no território yanomami, portanto, essa não é a nossa ansiedade yanomami”.
“Ao contrário disso, exigimos que o governo deve implementar ações de fiscalização de forma contínua nos entornos e limites dos territórios indígenas já demarcados”, diz a carta.
“Governo deve retirar invasores dos nossos territórios em caráter urgente como tentativa de garantir a nossa saúde e a da mãe terra.”
No documento, os yanomamis também exigem mais recursos para o Dsei (Distrito Sanitário Especial Indígena), que registra falta de medicamentos, de estrutura e de pessoal em meio ao aumento dos casos de malária falciparum, a variedade mais letal, e de crianças com quadro grave de desnutrição.
“Informamos ainda que, na política tradicional yanomami, só um cacique, só um líder, não deve tomar decisão antecipada sem consentimento coletivo”, diz a carta. “Essa diferença de organização social e governança do território deve ser respeitada pelo governo.”
Recentemente, as duas associações também publicaram uma carta denunciando ações truculentas do 5º PEF e exigindo a retirada de casas de militares construídas fora do perímetro da base do Exército.
No início do mês, quando a visita ainda estava em especulação, cinco associações yanomamis e ye’kwanas , entre as quais a Hutukara, de maior abrangência, já haviam se oposto à presença de Bolsonaro: “Não estamos interessados em discutir sobre garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami, não queremos negociação de legalização de garimpo, somos contra a exploração de mineração nas terras indígenas”.
A oposição de Bolsonaro a demarcações de terras indígenas começou já no primeiro mandato de deputado federal (1991-1995), quando tentou impedir a criação da Terra Indígena Yanomami, homologada em 1992 pelo então presidente Fernando Collor.
Ecoando a posição de setores do Exército, ele apresentou um projeto de decreto legislativo para anular o decreto de Collor.
Na iniciativa, que acabou arquivada, ele afirmou que se tratava de uma ameaça à segurança nacional por permitir a circulação de yanomamis entre o Brasil e a Venezuela, além de ser uma área “riquíssima em madeiras nobres e metais raros”.
Em 1998, o então deputado disse: “A cavalaria brasileira foi muito incompetente. Competente, sim, foi a cavalaria norte-americana, que dizimou seus índios no passado e hoje em dia não tem esse problema em seu país.”
Durante a campanha presidencial, Bolsonaro disse que não iria homologar mais nenhuma terra indígena, promessa que vem mantendo durante o mandato, apesar de ser um direito previsto na Constituição de 1988.
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