Casos suspeitos são isolados em escola dentro da tribo; ervas medicinais são usadas para prevenir doença
Os portões da aldeia Krukutu, em uma área isolada de Parelheiros (extremo sul de SP), estão fechados com cadeado. Na entrada, uma placa avisa que a entrada de estranhos é proibida devido ao coronavírus.
Mesmo com isolamento geográfico da terra indígena e a quarentena, o coronavírus já chegou até a aldeia. Um grupo de índios contaminados está isolado em uma escola, enquanto os demais passam por testagem em massa.
A aldeia Krukutu, a cerca de 40 km do centro de São Paulo, é habitada por aproximadamente 30 guaranis. A terra fica na área de Proteção Ambiental Capivari – Monos, às margens da represa Billlings, na divisa com São Bernardo do Campo.
A terra indígena fica a 16 km do centro de Parelheiros, bairro do extremo sul onde as mortes ligadas ao coronavírus (suspeitas ou não) mais crescem —elas subiram 142% na primeira quinzena de maio, passando de 24 para 58, o maior crescimento do período.
Dentro da unidade, o clima é de apreensão. Na terça-feira (19), a educadora Janinha Gabriel, 42, chegou ao local desesperada, procurando lideranças da aldeia.
Ela teve o filho e um genro infectados pela doença. “Meu filho está em casa ainda, mas vai ser trazido daqui a pouquinho para o isolamento. Meu genro já está isolado”, diz. “Não sei como eu faço, estamos isolados aqui”, diz ela, que chora ao falar da situação.
Na aldeia, há um posto de saúde que auxilia no tratamento e na testagem dos casos suspeitos. Além disso, o Ceci (Centro de Educação e Cultura Indígena Krukutu), que teve as aulas interrompidas, tem servido para abrigar os casos confirmados.
Segundo moradores da tribo, ao menos três pessoas já tiveram a infecção confirmada por testes. Eles não sabem dizer, porém, quantos são os casos suspeitos.
A maioria das famílias que vivem ali já foram testadas para Covid-19 e os resultados devem sair em breve. Enquanto isso, a saída é reforçar o isolamento.
As visitas de turistas, nas quais os indíos divulgam sua cultura e aproveitam para vender artesanato, foram todas canceladas.
“A gente fechou o portão para os brancos não chegarem aqui na aldeia. Como a gente mora no meio da floresta, tem uma tranquilidade melhor. Porque a gente vê que na cidade a coisa tá feia. Como as casas aqui são uma longe da outra, a gente fica mais prevenido”, diz o escritor Olívio Jekupé, 54, morador da tribo.
Ele afirma que o modo de viver dos indígenas favorece a quarentena. “Na prática, a gente já vive numa quarentena, porque a gente já tem esse costume de ficar isolado”.
Jekupé afirma que, embora a aldeia esteja assistida por médicos, o conhecimento indígena também ajuda a combater a doença.
“Tem um postinho de saúde, que tem uma equipe médica que trabalha de segunda a sexta. A gente sempre tem a parte do branco, que seria o médico, mas a gente tem o pajé, que tem esses conhecimentos de remédio, porque a gente tem que fazer tudo junto”, diz.
“Onde branco vê mato, para nós é remédio. Se você anda pelo mato está cheio de remédio. O remédio, se você toma, de repente se você pegar [coronavírus] ele vai ajudar a equilibrar”, completa Jekupé, que não quis dizer à reportagem os nomes das ervas, temendo que alguém resolvesse patentear.
Essa não é a única tribo de São Paulo que convive com a doença. Em abril, os habitantes da Terra Indígena do Jaraguá, divulgaram que a doença chegou até lá.
“É triste a notícia, mas também já era algo esperado, por estarmos na terra indígena mais exposta no momento, no meio da cidade de São Paulo, no meio dessa grande metrópole, onde mais vêm ocorrendo os casos de covid. Estando nessa situação, já era previsto que a covid-19 ia chegar até a nossa comunidade, que ia nos alcançar e que íamos passar por esse momento”, afirmou Thiago Henrique Karai Djekupe, apoiador de saúde indígena da Terra Indígena do Jaraguá, no mês passado.
Segundo o setor de saúde indígena do Ministério da Saúde, no país houve ao menos 526 casos confirmados nesta população, com 27 óbitos.
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