Nesta quinta, a coordenação regional da Funai no Vale do Javari decidiu suspender o atendimento ao público por razões de segurança

José MarquesJoão Gabriel

BRASÍLIA

A juíza responsável pelo processo sobre o homicídio do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, Jacinta Silva dos Santos, da comarca de Atalaia do Norte (AM), decidiu enviar o caso para a Justiça Federal.

A magistrada atendeu a um pedido feito pelo Ministério Público do Amazonas, que considerou que o caso é de competência federal.

Segundo ela, o relatório das investigações feitas pela Polícia Civil e pela Polícia Federal conclui que a motivação do crime estaria relacionada com os direitos indígenas, tema de responsabilidade da Justiça Federal.

“Essas informações não constavam anteriormente nos autos, o que permitia, portanto, a atuação do juízo estadual nesse processo”, afirmou a juíza, em nota enviada à imprensa nesta quinta-feira (7).

Na decisão, a magistrada citou um trecho de relatório das investigações da Polícia Federal, que afirma que “o homicídio ocorreu devido a uma rixa antiga de pescadores ribeirinhos locais e Bruno Pereira, em virtude das fiscalizações realizadas por ele na área da terra indígena Vale do Javari enquanto exercia funções na
Funai, e mesmo depois como colaborador da Unijava”.

“Os relatos indicam que Bruno já tinha sido ameaçado em razão da atuação na defesa de comunidades indígenas localizadas naquela região. Desse modo, a motivação do delito parece não se restringir a problemas interpessoais, alcançando direitos indígenas previstos no art. 231 da Constituição Federal”, afirma o relatório.

A juíza, então, diz que é “forçoso concluir que a competência da Justiça Federal ocorre toda vez que a questão versar acerca de disputa sobre direitos indígenas, incluindo as matérias referentes à organização social dos índios, seus costumes, línguas, crenças e tradições, bem como os direitos sobre as terras que tradicionalmente ocupam”.

A polícia havia solicitado na quarta (6) que convertesse a prisão temporária dos três investigados em prisão preventiva (sem tempo determinado), o que deve ser analisado por um juiz federal.

Ainda há a possibilidade, no entanto, de a Justiça Federal entender que não é de sua competência decidir sobre o tema.

Também nesta quinta, a coordenação regional da Funai (Fundação Nacional do Índio) no Vale do Javari decidiu suspender o atendimento ao público por razões de segurança.

Ofício protocolado pela manhã afirma que a decisão acontece após servidores da fundação serem abordados por duas pessoas, que se diziam colombianos, “fato que gerou medo e pânico diante da situação”, no último dia 1º.

O caso foi registrado em um boletim de ocorrência. Segundo o relato dos servidores, os dois queriam saber informações acerca da morte do “jornalista inglês”, Dom Phillips, assassinado em 5 de junho junto com o indigenista Bruno Pereira.

O ofício emitido pela coordenação regional do Vale do Javari cita também a morte do indigenista Maxciel Pereira da Silva, em 2019, a falta de medidas para garantir a segurança dos servidores na região. Diz ainda que há um “sentimento de exposição, vulnerabilidade e insegurança de toda a equipe” e “risco real de atos de violência física” até contra as pessoas atendidas pela fundação.

“Resolvemos suspender as atividades de atendimento ao público e restringir nossos trabalhos apenas a questões internas e de caráter emergencial, até que sejam tomadas as devidas providências que assegurem a continuidade dos trabalhos desta coordenação com a garantia de dignidade e do bem-estar físico e psicológico de seus servidores e funcionários”, afirma o texto.

O indigenista Bruno Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips foram assassinados quando desciam o rio Itaquaí, ao lado da terra indígena Vale do Javari, rumo a Atalaia do Norte. Os suspeitos são pescadores ilegais de pirarucu.

Quase um mês depois, o caso ainda causa comoção em Atalaia do Norte, que é um município de pouco mais de 20 mil habitantes no extremo oeste do Amazonas.

Foram presos suspeitos de participação no crime até aqui Amarildo Oliveira, o Peladoseu irmão, Oseney da Costa de Oliveira, e Jefferson da Silva Lima, conhecido como Pelado da Dinha, que confessou o crime em seguida, segundo a polícia.

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O primeiro a confessar participação nos assassinatos foi Pelado, segundo informação divulgada pela PF. Ele vivia na comunidade São Gabriel, na margem do rio Itaquaí, fora da terra indígena.

A confissão de Pelado ocorreu na noite de 14 de junho. No dia seguinte, ele foi levado pelos policiais à área isolada onde foram encontrados os primeiros pertences de Bruno e Dom. Os corpos dos dois foram achados no mesmo dia 15, a partir das indicações feitas por Pelado.

No último dia domingo (3), a Defensoria Pública da União e o Ministério Público Federal protocolaram um pedido de indenização por danos morais coletivos contra a União no valor de R$ 50 milhões a serem revertidos em favor dos povos indígenas isolados e de recente contato.

O pedido, segundo a coluna Painel, foi feito em uma ação que já corre desde 2018 na Justiça Federal.

Nela, DPU e MPF acionam a Funai (Fundação Nacional do Índio) e a União e, entre outros pleitos, apresentam um plano para que as bases das Frentes de Proteção Etnoambiental no Amazonas passem a gozar de recursos humanos e materiais mínimos para o efetivo cumprimento de suas finalidades.

A Unijava, ONG na qual Bruno trabalhava quando foi assassinado, participa da ação como parte interessada. O plano proposto teve a participação do próprio Bruno e de outras 44 pessoas de diversas entidades indígenas, etnias e servidores da própria Funai.

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/07/juiza-do-amazonas-envia-caso-bruno-e-dom-para-a-justica-federal.shtml

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