Segundo general, bases de proteção e patrulhas nos rios ajudam a ‘estrangular’ a logística de garimpeiros
Chefe do Comando Militar da Amazônia, o general Guilherme Cals Theophilo Gaspar de Oliveira, 60, afirma que a mineração ilegal em regiões de fronteira envolve uma “questão multifatorial” e que a abordagem do problema não pode ser atribuída apenas ao Exército.
Em entrevista à Folha por email, ele evita expor sua visão sobre a demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR). “Não opino sobre decisões do governo”, afirma.
Em várias regiões da faixa de fronteira, como as Terras Indígenas Yanomami (AM/RR) e Raposa Serra do Sol (RR), há uma proliferação de mineração ilegal. Por que o Exército não consegue impedir esse crime, mapeado por imagens de satélite? O Comando Militar da Amazônia atua em conformidade com os preceitos constitucionais e legais, o que inclui o cumprimento de suas atribuições subsidiárias. Nelas, atuando de forma independente ou em cooperação com outros órgãos do Poder Executivo, e respeitando as competências exclusivas das polícias judiciárias, realiza ações preventivas e repressivas contra os delitos transfronteiriços e ambientais na faixa de fronteira, onde estão as Terras Indígenas Yanomami e Raposa Serra do Sol.
Além disso, coopera frequentemente com órgãos federais, quando demandado, na repressão aos delitos de repercussão nacional e internacional, no território nacional, na forma de apoio logístico, de inteligência, de comunicações e de instrução.
Nesse sentido, várias ações são desencadeadas pelas tropas deste comando, como o estabelecimento de Bases de Proteção Etnoambiental e as patrulhas nos rios Mucajaí e Uraricoera, para estrangular a logística de garimpeiros.
Além de bases, também são desencadeadas ações visando a desativação de garimpos, sendo as mais recentes as executadas nas comunidades indígenas Homoxi 1, na Estação Ecológica de Maracá 2 e nas regiões da Serra do Atola 3 e de Surucucu 4.
Ocorre que a mineração ilegal é uma questão multifatorial, ensejando abordagem abrangente, sendo o Comando Militar da Amazônia apenas um dos atores a atuar nessa abordagem.
Um dos seus antecessores no CMA, o general Augusto Heleno, disse em 2008 que considerava a demarcação da TI Raposa Serra do Sol (RR) um risco à soberania nacional. O sr. compartilha da mesma visão? Eu, como comandante militar da Amazônia, não tenho a atribuição de comentar a opinião de meus antecessores, assim como não opino sobre decisões do governo.
Recentemente, o Exército deixou de operar na Ilha das Flores (próxima a São Gabriel da Cachoeira, na fronteira com Colômbia e Venezuela), em um momento em que está aumentando o fluxo de drogas pelo rio Negro, segundo a Polícia Civil. Qual o motivo da desativação? O Comando Militar da Amazônia articula suas organizações militares, pelotões, bases e postos na imensidão da Amazônia Ocidental visando o monitoramento e controle da região, com propósitos que incluem o de prevenir e reprimir os crimes transfronteiriços.
Nesse sentido, decidiu estabelecer um Posto de Controle e Inspeção Fluvial na Ilha das Flores para atuar de forma ostensiva e permanente durante determinado período.
Entretanto a partir de fevereiro deste ano, fatores operacionais levaram à decisão por modificar a forma de atuação na área, priorizando executar ações inopinadas e intermitentes, não apenas de controle de inspeção fluvial, mas também de outras técnicas operacionais.
Destaca-se, portanto, que as tropas do Comando Militar da Amazônia não deixaram de operar na região, sendo oportuno informar que, dentro desta concepção de atuação, em 11 de fevereiro, foram apreendidos 1.144,9 kg de skank, numa ação do 5º Batalhão de Infantaria de Selva, neste local.
Em algumas regiões, o Exército assume outras funções do Estado, como a administração dos hospitais em Tabatinga e São Gabriel. O CMA pretende mudar isso no médio prazo? Em São Gabriel da Cachoeira, o hospital é do governo, sendo administrado pelo Exército. Já em Tabatinga, o Hospital de Guarnição é do Exército. Ambos seguem prestando o mesmo serviço, sem previsão conhecida de mudança em suas atividades. Cabe salientar que ambos os hospitais atendem a população civil, que representa inclusive a maioria dos atendimentos, conforme convênio realizado com o estado do Amazonas.
Em São Gabriel da Cachoeira, centenas de indígenas se alistam todos os anos, mas não há notícia de que algum deles tenha conseguido se tornar oficial de carreira do Exército. Por quê? A carreira de oficial combatente do Exército Brasileiro é acessada mediante concurso realizado todos os anos. Existem ainda vagas de oficiais de carreira em outras especialidades, que também são preenchidas mediante concurso.
Os colégios militares são considerados públicos, e os seus alunos se beneficiam dos programas de cotas em universidades federais, por exemplo. O sr. acredita que o Exército deveria ter política semelhante em suas escolas militares de nível superior? Os concursos do Exército seguem as políticas públicas do Estado Brasileiro. Cita-se, por exemplo, que no concurso da ExPECEx (Escola Preparatória de Cadetes) de 2020 existia uma cota de 20% (dos universos masculino e feminino) para candidatos autodeclarados negros, conforme previsto em lei.
Em São Gabriel, são recorrentes os casos de mulheres indígenas que engravidam de militares e depois são abandonadas. O CMA tem uma política específica para prevenir casos assim, principalmente nos Pelotões Especiais de Fronteira (PEFs)? O fato mencionado não é de conhecimento deste comando militar de área.
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