Grupo mostrando mapas desenhados na oficina de atualização do PGTA e Plano de Vida.(Foto: Denise Mirella Vidal)

Passados muitos anos desde a publicação dos documentos, é hora de revisitar e refletir sobre os desafios da atualidade para os povos do Oiapoque, como o enfrentamento da crise climática e o aumento das ameaças externas

Texto: Teresa Harari

O ano de 2025 marca uma nova etapa nos acordos de gestão das Terras Indígenas do Oiapoque. O Conselho dos Caciques dos Povos Indígenas do Oiapoque (CCPIO), em parceria com a Associação dos Indígenas em Mutirão (AMIM), deu início à atualização de dois documentos fundamentais para o futuro dos povos indígenas da região: o Plano de Vida e o Programa de Gestão Territorial e Ambiental (PGTA).

A publicação do Plano de Vida das Terras Indígenas do Oiapoque foi em 2009. O documento reafirma os direitos indígenas garantidos pela Constituição e valoriza os saberes, práticas e modos de vida dos quatro povos que habitam a região: Palikur, Galibi Marworno, Karipuna e Galibi Kali’na. 

Já o Plano de Gestão Territorial e Ambiental (PGTA), publicado em 2012, se consolidou como a principal ferramenta de gestão dos territórios. Estruturado em três eixos temáticos (proteção territorial, formação para a gestão indígena e uso sustentável dos recursos naturais), o PGTA nasceu da necessidade de formalizar acordos para garantir a qualidade de vida das atuais e futuras gerações, respeitando os modos próprios de vida de cada povo.

Passados mais de dez anos, o contexto mudou, assim como os desafios. A crise climática tem afetado diretamente o cotidiano das comunidades, alterando os padrões de chuva e temperatura, impactando a agricultura tradicional, a biodiversidade e a disponibilidade de água. Uma das consequências graves foi a crise fitossanitária que atingiu a mandioca, com grande impacto na segurança alimentar, econômica e cultural dos povos indígenas de Oiapoque. Além disso, crescem as ameaças externas, como a iminência da exploração de petróleo na foz do rio Amazonas. 

As comunidades vêm exigindo o respeito ao seu Protocolo de Consulta (publicado em 2019), que garante o direito à consulta livre, prévia e informada sobre qualquer projeto que afete seus territórios. Internamente, as aldeias também enfrentam novos desafios, como o crescimento populacional, a pressão sobre os recursos naturais e acúmulo de lixo.

Grupos de discussão durante a oficina de atualização do PGTA e Plano de Vida. (Foto: Denise Mirella Vidal)

Encontros para refletir sobre o bem viver

Diante desse cenário, a atualização do Plano de Vida e do PGTA se tornou prioridade na agenda do CCPIO. Em parceria com a AMIM, a organização aprovou em 2024 um projeto no edital Dabucury, uma iniciativa da Coiab e Cese, para a atualização dos documentos. O projeto prevê uma série de oficinas com a participação de representantes das comunidades de todas as Terras Indígenas do Oiapoque. Em fevereiro aconteceu a primeira reunião para retomada do Núcleo Técnico do PGTA, validação da metodologia e do cronograma das atividades.

A primeira oficina regional foi realizada em junho, na Aldeia Uahá, Terra Indígena Juminã. Participaram cerca de 40 pessoas entre jovens, anciãos, homens e mulheres das aldeias Kunanã, Uahá, Mahipá. Ao longo do encontro, os participantes foram convidados a refletir sobre o significado de “gestão territorial e ambiental” a partir de suas próprias visões de mundo. 

“Plano é pensar para que as atividades funcionem bem”, destacou Edson dos Santos, da Aldeia Kunanã.  Já o território é “onde a gente se sente seguro, é onde a gente conhece”, completou Edielso Figueiredo. “Território é  identidade”, conclui Ediane Vidal.

Apresentação sobre os principais pontos abordados na oficina sobre o que é bem viver. (Foto: Denise Mirella Vidal)

Durante a oficina, os grupos discutiram o que significa viver bem hoje e refletiram sobre as prioridades identificadas nos primeiros documentos — o Plano de Vida (2009) e o PGTA (2012) — avaliando o que mudou desde então. Um exemplo citado foi a comunicação: antes, a radiofonia era uma demanda central; hoje, a questão do acesso à internet nas aldeias ganha destaque.

A atividade incluiu ainda a produção de mapas com grupos de crianças, jovens e anciões. Essa etapa permitiu atualizar informações sobre locais de caça, pesca, roça etc, subsidiando diagnósticos necessários à elaboração do PGTA. Também estimulou o reconhecimento de territórios antigos, engajando o interesse de jovens que até então não tinham conhecimento sobre eles.  As crianças tiveram um papel especial na oficina. Desenharam suas casas, as casas dos familiares e contribuíram com o levantamento demográfico nas aldeias.

As crianças também participaram desenhando suas casas e comunidades. (Foto: Denise Mirella Vidal)

Próximas etapas

As próximas etapas do projeto incluem a realização de cinco oficinas regionais, contemplando todas as regiões das Terras Indígenas do Oiapoque. Já em 2026, o processo seguirá com a realização de oficinas temáticas a partir das prioridades levantadas nessa primeira etapa. 

A proposta do projeto é fortalecer os acordos internos e promover o diálogo entre as diferentes etnias e aldeias do Oiapoque, reafirmando compromissos com a proteção do território e com o bem viver. 

A atualização do Plano de Vida e do PGTA permitirá o alinhamento das estratégias de gestão com a realidade atual, incorporando novas demandas, conquistas e saberes. O caminho segue sendo construído coletivamente — com escuta, memória, luta e esperança.

*A atualização do PGTA e do Plano de vida das TIs do Oiapoque conta com apoio do edital Dabucury

Sistematização da discussão de como atualizar o PGTA e Plano de vida, na etapa da aldeia Uahá (Foto: Denise Mirella Vidal)

Fonte: https://institutoiepe.org.br/2025/07/povos-indigenas-do-oiapoque-iniciam-atualizacao-do-plano-de-vida-e-pgta/