A articulação para a gestão compartilhada do Sítio Ramsar do Rio Negro ganhou os primeiros contornos nesta semana. José Pedro de Oliveira Costa, Secretário de Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente (MMA), técnicos do MMA, representantes da Funai, do ICMBio e do governo do Amazonas se reuniram entre os dias 13 e 16 de maio, em São Gabriel da Cachoeira, no noroeste Amazônico e em Manaus, capital do Estado, para discutir a governança da maior área úmida protegida do mundo, criada em março.
A agenda incluiu encontros com indígenas, militares, ongs e gestores públicos para que o sítio Ramsar – tratado intergovernamental que visa proteger as áreas úmidas – seja implementado com um inovador sistema de governança. O Brasil tem outros 24 sítios Ramsar reconhecidos pela Convenção, que leva esse nome em homenagem à cidade do Irã onde foi criada, em 1971. No Brasil, a Convenção Ramsar foi incorporada ao arcabouço legal em 1996, pela promulgação do Decreto 1.905/96.
Como resultado desta primeira etapa de diálogo, o Ministério do Meio Ambiente deve editar uma portaria para criar o comitê de governança do Sítio Ramsar Rio Negro. O comitê deve ser composto pelo setor público, incluindo as Forças Armadas (já que a área é próxima de uma zona de fronteira, estratégica geopoliticamente), organizações da sociedade civil e instituições de ciência e pesquisa. Na versão atual, o Ramsar Rio Negro excluiu a faixa de fronteira. A inclusão dessa região deve ocorrer em uma segunda etapa, após análise do Conselho de Defesa Nacional.
O Ramsar Rio Negro está em uma das maiores áreas de florestas tropicais preservadas do mundo, com uma variedade de paisagens amazônicas, como matas de igapó e arquipélagos fluviais. A alta diversidade biológica da região inclui animais em extinção como o peixe-boi-da-Amazônia e o boto-cor-de-rosa. Essa biodiversidade, sítios arqueológicos e diversos locais sagrados na mitologia dos povos rionegrinos estão relacionados à presença de 23 etnias indígenas na região.
“Nossa visita a São Gabriel da Cachoeira foi muito produtiva. Tivemos a oportunidade de nos reunir com as principais lideranças da região, com o Exército, Prefeitura e representantes dos povos indígenas. Além do privilégio de conhecer uma das áreas mais significativas do país em termos étnicos e ambientais, alcançamos indicações importantes de como dar início a um sistema de coordenação do Sítio Ramsar do Rio Negro. Chegamos a um consenso com todos com quem conversamos de que o sítio Ramsar deve valorizar as agremiações e estruturas positivas já existentes para a calha desse rio”, contou o Secretário da Biodiversidade do MMA.
Governança com “conectividade”
O Sítio Ramsar Rio Negro é inovador porque é o primeiro no Brasil a unir um mosaico de unidades de conservação municipal, estadual e federal junto com oito terras indígenas demarcadas. Assim, um modelo pioneiro de governança capaz de conectar essas áreas é necessário para que esse título possa materializar benefícios à região. Recursos internacionais destinados à proteção de áreas úmidas e ao desenvolvimento sustentável poderão ser acessados, como o GEF (Global Environmental Fund).
Conectividade, segundo o secretário da Biodiversidade do MMA, é a palavra que rege essa iniciativa. Conectar instituições locais, regionais e nacionais é a estratégia para que o Ramsar Rio Negro seja mais que um selo internacional e possa alavancar iniciativas já em curso na região. O ecoturismo, turismo de base comunitária em terras indígenas, artesanato, produtos do sistema agrícola tradicional do rio Negro e toda a gama de iniciativas sustentáveis relacionadas à economia local (com forte presença indígena), podem ser beneficiadas.
No Alto Rio Negro, o MMA reuniu-se com a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN), que representa 23 povos indígenas por meio das 93 associações de base filiadas à Federação, com o general Omar Zendim, comandante da 2ª Brigada de Infantaria de Selva, com a Prefeitura de São Gabriel da Cachoeira e com representantes de diversas instituições que atuam na região, como o Instituto Socioambiental (ISA), Instituto Federal do Amazonas(IFAM), o Instituto do Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Amazonas (IDAM), Igreja Católica, Funai, ICMBio, entre outras.
“Foi importante poder dialogar com o Ministério do Meio Ambiente e demais instituições logo nesses primeiros passos para a criação de um conselho gestor do sítio Ramsar. Por termos muitos povos indígenas nessa região, é fundamental que estejamos incluídos nesse processo e possamos ter os nossos planos de gestão territorial e ambiental como instrumento de diálogo também no âmbito do Ramsar”, conclui o presidente da Foirn, Marivelton Barroso Baré.
A Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial em Terras Indígenas (PNGATI) estará na esfera do comitê de governança do Ramsar Rio Negro, conforme debatido nas rodadas de conversa em São Gabriel da Cachoeira. O antropólogo Artur Nobre Mendes, assessor da presidência da Funai, juntou-se à Comitiva do MMA nesta agenda representando o novo presidente da Funai, Wallace Moreira Bastos, que estaria presente nesta viagem, mas desmarcou de última hora.
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