Mais de setecentas pessoas indígenas, dos povos Warao e E’ñepá, procedentes das regiões de Delta Amacuro e Estado Bolívar na Venezuela, encontram-se atualmente abrigadas no espaço do Ginásio de Pintolândia, na cidade de Boa Vista-RR, após uma longa trajetória migratória iniciada em 2015. As instituições Secretaria de Estado para o Bem-estar Social-SETRABES, Fraternidade Internacional e Exército Brasileiro são, neste momento, responsáveis pela administração, gestão econômica e infraestrutura logística do Ginásio habilitado como Abrigo.

No entanto, esta ação de acolhida e proteção das famílias Warao e E’ñepá só foi possível pela determinação e mobilização, já nos primeiros momentos, de entidades da sociedade civil brasileira.

Depois de mais de dois anos de presença no país, o Estado brasileiro, em suas diversas esferas administrativas, resiste ainda em reconhecer as famílias Warao e E’ñepá como povos indígenas sujeitos de direitos específicos e coletivos reconhecidos na Constituição Federal do Brasil e em instrumentos de direito internacional, como a Convenção 169 da OIT e a Declaração de Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Entendemos que toda ação do Estado em relação a estas famílias, dentro e fora do Abrigo, deve pautar-se, não apenas pelas normas próprias relacionadas com a mobilidade humana e a migração, mas também pelo marco específico de direitos coletivos dos povos indígenas, incluindo, entre outros, os direitos: à consulta previa, livre e informada e à participação nas decisões que lhes afetem diretamente; a decidir livremente suas próprias prioridades; e a conservar seus costumes e instituições próprias.

Nenhum destes direitos específicos pode ser desconsiderado, diminuído ou negado pela situação derivada do livre exercício do direito à mobilidade e à migração transfronteiriça.

Fatos acontecidos no dia 15 de abril ao lado das dependências do Ginásio de Pintolândia e na Delegacia do 5ª Distrito Policial, envolvendo três indígenas Warao e membros do Exército, da Polícia Militar e da Polícia Civil, ainda não suficientemente apurados, deixaram lesões corporais em um dos indígenas e motivaram, paradoxalmente, a expulsão dos três indígenas do Abrigo.

Esta decisão, que significa sua exclusão da condição de abrigados passando a ficar sem proteção  na rua e a consequente separação de suas famílias, nos deixa gravemente preocupados. Entretanto, diversos relatos de outros indígenas Warao confirmam que o ambiente dentro do Abrigo e a relação entre representantes das entidades responsáveis e os Warao ficou tensionada os dias seguintes ao episódio. Além disso, entidades sociais foram impedidas de entrar ao Abrigo em diversas ocasiões nos últimos dias.

Diante desta situação, solicitamos

• A imediata e efetiva apuração dos fatos acontecidos no dia 15 de abril, a verificação dos relatos em relação à convivência dentro do Abrigo de Pintolândia e a proteção e reunificação familiar dos três indígenas atualmente expulsos;

• A necessária transparência na definição das funções e competências de cada uma das três instituições que atuam, neste momento, dentro do Ginásio habilitado como Abrigo, bem como da gestão dos recursos públicos especificamente destinados à ação de acolhida e proteção no Abrigo;

• A garantia e implementação efetiva dos direitos específicos e coletivos dos povos indígenas Warao e E’ñepá, assegurando-lhes o direito à consulta e à participação nas decisões sobre quaisquer medidas administrativas que lhes afetem diretamente, bem como o direito às próprias formas de organização social;

• A garantia de uma gestão do Abrigo por parte do Poder Público pautada pela ação humanitária e a garantia dos direitos, a participação das famílias acolhidas e o diálogo com as entidades da sociedade civil que de forma organizada podem contribuir com as ações, assegurando também a devida formação e preparação específica a todas as pessoas, voluntárias ou contratadas, de entidades públicas ou particulares, que participem na gestão e administração do Abrigo.

• A necessidade de uma discussão ampla sobre os modelos de abrigamento envolvendo os povos indígenas neste processo migratório, tema que já estava presente desde a primeira audiência pública realizada em Boa Vista em 2017 e em pareceres técnicos produzidos pelo MPF. O modelo do Abrigo atual reúne um grande número de pessoas, fato incomum entre as comunidades indígenas Warao e E’ñepá, que possuem formas de organização e convivência diferenciadas e pautadas por laços de parentesco.

ASSINAM:

Associação Brasileira de Antropologia – ABA

Associação dos Estudantes de Roraima – ASSOER

Associação Nacional de História, seção estadual de Roraima – ANPUH RR

Cáritas Diocesana Roraima

Cátedra Sérgio Vieira de Mello / UFRR

Central Única dos Trabalhadores – CUT/RR

Centro Acadêmico de História da UFRR

Centro Ciências e História – CCH/UFRR

Centro Migrações e Direitos Humanos – CMDH

Centro Estudos Bíblicos – CEBI

Colégio Advogados para Democracia – COADE

Coletivo Rede Migração Rio

Comissão de Assuntos Indígenas – CAI/ABA

Comissão Pastoral da Terra – CPT Roraima

Conectas Direitos Humanos

Conferência Religiosos Brasil – CRB Núcleo Roraima

Conselho Indígena de Roraima – CIR

Conselho Indigenista Missionário – CIMI

Conselho Regional Psicologia – CRP 20

CSP Conlutas Roraima

Grupo de Estudo Interdisciplinar sobre Fronteiras – GEIFRON/UFRR

Instituto Autonomia – INAU

Instituto Socioambiental – ISA

Laboratório de Estudos e Pesquisas em movimentos indígenas, política indigenista e indigenismo – LAEPI/UnB

Movimento Puraké

Observatório da Violência Policial e Direitos Humanos

Observatório dos Direitos e Políticas Indigenistas – OBIND/UnB

Partido Comunista Brasileiro – PCB/CR-RR

Pastorais Sociais – Diocese Roraima

Pastoral Familiar Diocese de Roraima

Pastoral Indigenista Diocese de Roraima

Pastoral da Juventude Diocese de Roraima

Pastoral do Migrante Diocese de Roraima

Pastoral Universitária Diocese de Roraima

Projeto Apoio aos Refugiados em Roraima / UFRR

Seção Sindical dos Professores da Universidade Federal de Roraima – SESDUF

Serviço Jesuíta Migrantes e Refugiados – SJMR

Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil e do Mobiliário de Roraima – SINTRACOMO

União da Juventude Comunista Roraima

Unidade Classista RR

Rede Eclesial Panamazônica – REPAM

Rede Um Grito pela Vida Roraima

Fonte: http://ela.unb.br/pt-br/laboratorios/laepi/documentos

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