Parte da comunidade vive em conflito interétnico com os Kariri Xocós em território de Alagoas e a outra, em terreno sem estrutura no interior de Sergipe
O Ministério Público Federal (MPF) entrou com ação civil pública contra a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e a União exigindo a adoção de medidas assistenciais imediatas à comunidade indígena Pankariri, que atualmente vive dividida nos estados de Alagoas e Sergipe. A ação pede que sejam disponibilizadas terras para o assentamento dos indígenas de forma adequada e digna, considerando a situação socioeconômica e cultural do grupo. A presença dos Pankariri em território reconhecido dos Kariri Xocó, localizado no município de Porto Real do Colégio (AL), tem gerado animosidades entre as comunidades, uma vez que as práticas culturais e os rituais religiosos dos dois povos são distintos.
O MPF cobra na ação que Funai e União adotem, com urgência, as medidas necessárias para assentar o grupo Pankariri em outra área rural. Segundo relatos do cacique, por não poderem praticar seus rituais sagrados na Terra Indígena Kariri Xocó, 25 famílias Pankariri se mudaram para uma propriedade privada que estava abandonada na região, em 2018. No entanto, com a pressão de indígenas kariri, que passaram a rondar a fazenda, o imóvel foi desocupado. Novamente sem terras, o cacique comprou um pequeno terreno no município de Propriá (SE), para onde levou 12 dessas famílias. O restante do povo Pankariri permanece no território Kariri, em Alagoas.
Vulnerabilidade – Na ação, o procurador da República Flávio Matias cita visita de campo feita ao local onde vivem as 12 famílias Pankariri, em Sergipe. Na ocasião, constatou a situação de vulnerabilidade da comunidade. No terreno não há fornecimento de água encanada e energia elétrica, não há espaço para plantar e colher, nem prestação de assistência básica de saúde. Segundo ele, cabia à Funai sanar o conflito entre as duas comunidades, mas a omissão do órgão “vem causando sérios prejuízos aos indígenas pankariris”, que tentam, sem sucesso, estabelecer tratativas para viabilizar assentamento em outra área.
A ação também destaca tentativas do Ministério Público de solucionar o impasse. Em 2019, após diligência na Terra Indígena Kariri Xocó, o órgão emitiu laudo técnico em que atestou a existência de uma outra etnia compartilhando a aldeia e alertou para o risco de conflito interétnico decorrente da presença dos Pankariri na área. Já em 2021, o MPF solicitou aos órgãos de agricultura e reforma agrária de Alagoas para que informassem sobre a existência de terras públicas que pudessem ser doadas ou direcionadas ao usufruto dos Pankariri, em região próxima ao local onde viviam em Porto Real. Não houve resposta.
No pedido de tutela provisória (decisão urgente e temporária), o procurador afirma que é inegável a demora da Funai em garantir a devida proteção à comunidade indígena afetada, o que afronta o princípio constitucional da razoável duração do processo e tem gerado graves prejuízos aos Pankariri. Por isso, ele pede que a Justiça obrigue o órgão a atender, de imediato, às situações emergenciais desses indígenas, empreendendo todos os esforços necessários para assegurar a tutela da saúde, moradia, integridade física e dignidade do povo Pankariri. Solicita, ainda, que seja fixada multa no valor de R$ 10 mil para cada dia de atraso na tomada dessas ações.
Aquisição de terras – Um dos pontos levantados pelo MPF na ação é a possibilidade de destinação de terras à ocupação e posse pelos indígenas, a partir da aquisição desses territórios pela União. Segundo Flávio Matias, essas áreas não se confundem com aquelas cuja posse os indígenas exercem de forma imemorial. Ou seja, são destinadas especificamente para as comunidades indígenas que de alguma forma foram privadas das terras que tradicionalmente ocupavam. Para o procurador, a aquisição de terras paras os indígenas que sofrem discriminação impedirá a desagregação deles em busca de melhores condições de vida. “O sentido de território indígena, portanto, é essencial ao desenvolvimento de qualquer comunidade, bem como à manutenção de seus costumes e tradições. Ou seja, imprescindível para a própria sobrevivência dos povos tradicionais”, ressaltou.
De acordo com o MPF, a prática de adquirir terras e destiná-las a indígenas que estão em situação de vulnerabilidade por não se encontrarem agrupados ou por vivenciarem conflitos interétnicos vem sendo reiteradamente adotada pela Funai há mais de 15 anos. Para esse tipo de aquisição, o órgão esclarece que deve estar comprovada a existência de um conflito inconciliável no âmbito da comunidade indígena ou a impossibilidade do retorno às terras tradicionalmente ocupadas, como é o caso dos Pankariri.
Além disso, a ação ressalta a importância de se preservar o desenvolvimento das manifestações culturais e religiosas das populações indígenas em um ambiente propício. Esses rituais e costumes, como lembrou o MPF, são marcadamente de cunho coletivo e o desaldeamento torna difícil a realização dessas celebrações. “A aquisição de uma área para que os Pankariri possam se instalar com suas famílias e dela retirar seu sustento é medida que ao mesmo tempo em que protege culturalmente a comunidade indígena, realiza o direito subjetivo à moradia”, esclareceu Matias.
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