Após a conclusão de três oficinas de formação voltadas à proteção territorial, Departamento de Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato irá auxiliar indígenas a elaborarem os Planos de Vigilância Indígena Regionais
– Foto: MPI ASCOM
Realizada pelo Departamento de Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (DEPIR) da Secretaria de Direitos Territoriais Indígenas (SEDAT), o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) finalizou a terceira oficina do Programa de Formação Yanomami e Ye’kwana. A oficina aconteceu nas regiões de Palimiú e Maloca Paapiú, entre os dias 11 e 27 de agosto, e contou com o apoio técnico do Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (CENSIPAM).
Reconhecido como referência nacional em operações de monitoramento por sensoriamento remoto e veículos aéreos não tripulados, o CENSIPAM contribuiu para o fortalecimento técnico e estratégico da capacitação. Além de ampliar a autonomia das comunidades indígenas, o uso de drones reduz o contato direto com ameaças, fortalece estratégias de proteção ambiental e reforça a segurança territorial na Amazônia.
A terceira oficina faz parte de um total de quatro módulos, que foram desenvolvidos no âmbito do Programa Piloto de Formação em Monitoramento Territorial Colaborativo e Noções Técnicas de Segurança da Terra Indígena Yanomami, criado em 2024 pelo MPI. As oficinas vêm sendo promovidas junto a coletivos de vigilância locais formados pelas próprias comunidades.
Segundo Beatriz Matos, diretora do Departamento de Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato da SEDAT do MPI, a formação de monitoramento territorial dá ferramentas para que os indígenas aprimorem o trabalho que já fazem de vigilância e ajuda a prevenir o retorno do garimpo, assim como qualifica as informações a serem transmitidas aos órgãos públicos.
“Através da Coordenação-Geral de Povos Indígenas de Recente Contato foi feita uma escuta qualificada em várias comunidades e aldeias Yanomami. Constatamos que havia uma ausência de ações no sentido de vigilância devido à presença do garimpo. Com a retirada dos invasores que faziam a atividade ilegal, foi possível iniciar as ações de formação por meio de quem melhor conhece a região”, disse a diretora.
Oficinas
A primeira das oficinas abordou o tema do Monitoramento Colaborativo e Vigilância Indígena, com enfoque na utilização da ferramenta implementada pelas associações Yanomami em conjunto com o ISA, e adotada pelo programa, o Sistema de Alertas. A segunda foi sobre Nivelamento Técnico e Protocolos de Segurança. Após a realização da terceira – Meios Aéreos e Drones -, a quarta será sobre a Elaboração de Planos de Vigilância Indígena Regionais, com data ainda a definir.
“As oficinas combinam aulas teóricas, exercícios práticos, simulados e dinâmicas de grupo, com o objetivo de proporcionar uma aprendizagem mais completa e significativa”, afirma o Plano de Trabalho do Programa de Formação.
A proposta do Programa de Formação surgiu a partir de uma demanda dos povos Yanomami e Ye’kwana durante o processo de desintrusão iniciado em 2023. A iniciativa conjunta do MPI, Funai, ISA e Hutukara Associação Yanomami (HAY) foi subsidiada com recursos provenientes da Lei 14.922, aprovada pelo Congresso Nacional em julho de 2024, e que destinou crédito extraordinário superior a R$ 1 bilhão para a crise emergencial na TI Yanomami.
Estratégia
A formação de equipes de vigilância indígena é uma estratégia crucial para fortalecer as comunidades e assegurar seus direitos territoriais. Com essa capacitação, as comunidades poderão monitorar seus territórios de forma mais eficiente e segura, identificar e denunciar ameaças, além de atuar na proteção de seus recursos naturais.
É importante destacar que, embora as ações de vigilância possam ser complementares às ações de fiscalização dos órgãos do Estado, dentro do contexto da proteção territorial é de fundamental importância distingui-las. Enquanto a vigilância constitui-se no monitoramento pelo grupo indígena do seu território, a partir de atividades que já fazem parte do seu cotidiano, a fiscalização é a aplicação exclusiva pelo Estado de uma norma jurídica referente à proteção da Terra Indígena, que envolve ações de comando e controle.
ADPF 709 – A desintrusão da TI Yanomami está prevista na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709, instrumento jurídico pelo qual a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) propôs, em agosto de 2020, medidas de proteção às comunidades indígenas no Superior Tribunal Federal para conter o avanço da pandemia nos territórios indígenas. Na ação, a entidade pediu a retirada dos não indígenas das Terras Indígenas Yanomami, Karipuna, Uru-Eu-Wau-Wau, Kayapó, Arariboia, Munduruku e Trincheira Bacajá.
Terra Indígena Yanomami
A Terra Indígena Yanomami se encontra inserida na Amazônia Legal Brasileira, situando-se nos municípios de Alto Alegre/RR, Caracaraí/RR, Iracema/RR, Mucajaí/RR, Amajari/RR, Barcelos/AM,, Santa Isabel do Rio Negro/AM e São Gabriel da Cachoeira/AM.
A Terra Indígena possui superfície aproximada de 96.650 km², devidamente reconhecida pelo Estado Brasileiro, estando com status de homologada com a edição do Decreto s/n, de 26 de maio de 1992. A população é estimada em cerca de 31 mil pessoas (SESAI/2023), que falam 6 línguas distintas que compõem a Família Linguística Yanomami, mais o povo Ye’kwana, falante de uma língua Karibe.
De acordo com a FUNAI, na região existem 13 registros de povos indígenas isolados na TI Yanomami, sendo um registro confirmado, uma informação em estudo e 11 informações a serem qualificadas. Portanto, trata-se de uma área com grande diversidade linguística e cultural.
Presença do garimpo
Entre os anos de 1970 e 1980, o desenvolvimento do estado de Roraima gerou grande impacto na Terra Indígena Yanomami. Tais impactos foram oriundos da atividade de projetos de colonização, estradas, canteiros de obras, fazendas, serrarias e garimpos, destacando-se, nesse sentido, a abertura da Perimetral Norte, entre 1973 e 1976. O contato descontrolado com os não indígenas provocou um choque epidemiológico de grande magnitude, causando altas perdas demográficas, uma degradação sanitária generalizada e, em algumas áreas, graves fenômenos de desestruturação social.
Entre o fim dos anos de 1980 e início dos anos de 1990 verificou-se a intensificação da atividade de exploração mineral ilegal através da abertura de grande número de áreas de garimpo no curso superior dos principais afluentes do Rio Branco. As associações Yanomami e Ye’kwana estimaram que nos últimos anos cerca de 40 mil garimpeiros atuaram ilegalmente no território com exploração mineral ilegal em diferentes regiões no interior da Terra Indígena realizada com a utilização de maquinários pesados, balsas, dragas e com uso indiscriminado de mercúrio metálico.
Desintrusão
Em 2023, iniciaram-se as ações de desintrusão da TI Yanomami, a partir da execução do plano aprovado no âmbito da ADPF 709. Nos primeiros cinco meses da desintrusão verificou-se uma redução significativa da atividade ilegal, principalmente no eixo do rio Uraricoera, principal via de acesso fluvial ao território indígena, onde os indicativos de desmatamento foram reduzidos em 80%.
Essas mudanças foram verificadas pelos diversos órgãos que monitoram o território indígena, onde os indicativos de desmatamento foram reduzidos em 80%. Essas mudanças foram verificadas pelos diversos órgãos que monitoram a degradação ambiental dentro do território e constatadas pelo Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia – CENSIPAM.
O Governo Federal, por meio da Casa de Governo em Roraima, alcançou 7.054 ações de fiscalização e controle na Terra Indígena Yanomami (TIY), reafirmando o compromisso no combate ao garimpo ilegal e a outras atividades ilícitas no território. As operações também se estendem às áreas de entorno, com forte atuação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pela proteção das unidades de conservação estratégicas e pelo bloqueio das rotas usadas para abastecer garimpos ilegais.
Desde a abertura da Casa de Governo, em março de 2024, as ações já resultaram em R$ 491,3 milhões de prejuízo ao garimpo ilegal e em uma redução de 98% da atividade dentro da TIY. Esse resultado é fruto da atuação conjunta das forças de fiscalização no território, da articulação promovida pelo MPI e das operações do ICMBio para proteger as áreas de conservação no entorno.
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