Com delegação indígena em plataforma da ONU, povos têm desafio de articulação em âmbito nacional, aponta assessora da secretaria-executiva da Rede de Cooperação Amazônia em entrevista à OPAN.

Adiada devido à pandemia do novo coronavírus, ainda sem data definida, a Conferência do Clima da ONU (COP-26) deverá ocorrer na cidade escocesa de Glasgow, em 2021. Em ano recorde de queimadas no Pantanal e na Amazônia, os debates sobre a forma como o Estado brasileiro trata o meio ambiente ecoaram no mundo todo.

Para traçar ações concretas para mitigação e adaptação frente às  alterações no clima, uma plataforma com a participação de povos indígenas, comunidades tradicionais e governos do mundo todo foi criada, em 2018, na COP-24, como parte da Convenção Quadro das Nações Unidas para Mudanças do Clima (UNFCCC, sigla em inglês).

A UNFCCC é o órgão da ONU criado a partir da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento Mundial do Clima. É formada por 195 países que se comprometeram a adotar medidas para a redução das emissões dos gases do efeito estufa, assegurando a produção de alimentos e que as decisões econômicas se pautem em formas sustentáveis de desenvolvimento.

Na UNFCCC, a Rede de Cooperação Amazônia (RCA) atua na articulação entre as organizações indígenas de base e os sete representantes indígenas do mundo, que compõem a representação na plataforma. Em entrevista à Operação Amazônia Nativa (OPAN), Patrícia Zuppi, assessora da secretaria-executiva da RCA, aponta quais são os principais desafios dos povos indígenas após um ano do início dos trabalhos da plataforma e conta um pouco quais temas devem estar em destaque na cúpula da ONU e entre as organizações sociais, em 2021.

Delegação da RCA acompanhando a agenda da Plataforma de Comunidades Locais e Povos Indígenas, em Bonn, na Alemanha, para a Primeira Reunião do Grupo de Trabalho Facilitador da Plataforma de Comunidades Locais e Povos Indígenas no Órgão de Mudanças Climáticas da ONU. Foto: Reprodução Facebook/RCA.

OPAN: Como a plataforma funciona e quais são seus objetivos?

Patrícia Zuppi: Na plataforma, um grupo de trabalho facilitador tem a missão de tocar a implementação do plano de inserção dos indígenas na UNFCCC, composto por várias atividades propostas. Entre elas, a promoção de workshops sobre as questões climáticas locais, com indígenas e membros dos governos. A plataforma visa intercambiar e trazer para as discussões de soluções climáticas saberes tradicionais. E isso tem que ser feito por aqueles que são os sabedores, que são os conhecedores. O objetivo é pressionar governos em âmbito internacional sobre a urgência da preservação socioambiental e a garantia de direitos das populações tradicionais. A iniciativa também pretende promover uma melhora na participação dos povos indígenas inseridos na UNFCCC.

OPAN: Quais são os principais desafios da implementação da plataforma de povos indígenas e comunidades tradicionais na UNFCCC?

Patrícia Zuppi: A nossa meta, que é também nosso maior desafio, é colaborar para estreitar a relação da representação da plataforma na UNFCCC com os povos indígenas da base, que nem sempre são aqueles sete representantes que têm incidência política na ONU. Eles são poucos, podem falar dos conhecimentos dos seus próprios povos, mas o desafio de como contemplar essa enorme diversidade está posto. Além disso, a criação da plataforma vem de uma perspectiva de parceria com os governos, que não temos mais.

Outra coisa é que existe uma linguagem técnica da UNFCCC. É importante que eles se apropriem dessa linguagem para que também consigam participar de forma autônoma e trazer suas questões e olhares próprios. Os desafios passam não só pelo financiamento, mas a participação também precisa de apoio de tradução.

OPAN: Diante dessas dificuldades, já existe alguma estratégia para facilitar a inclusão dos povos?

Patrícia Zuppi: Enquanto RCA, estamos investindo em capacitação e agora deveremos ampliar essa estratégia para apoiar os povos indígenas na agenda da plataforma, sobretudo com a possibilidade de incluir os parceiros da Operação Amazônia Nativa e da Rede Juruena Vivo. Estamos vivendo um contexto de violação do próprio governo, de não demarcação de terras indígenas, de buscar regularizar a mineração nos territórios indígenas, então poder incidir internacionalmente é fundamental.

OPAN: Como a plataforma pode contribuir no para melhorar a situação dos povos indígenas no Brasil? 

Patrícia Zuppi: A plataforma foi criada a partir do Acordo de Paris, como demonstração do reconhecimento internacional dos direitos das comunidades locais e para que os povos possam trazer a sua colaboração de uma forma mais visível. Se aqui no Brasil não há um reconhecimento dos direitos indígenas, esses mecanismos internacionais trazem muito claramente a necessidade e a prerrogativa de respeito a esses direitos, é algo possível nesse momento tão adverso.

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