Imagem: Acervo pessoal Museu da Cultura Puri

Por Dauá Puri

Na terra livre das palmeiras e sapucaias, não se canta mais. Foi proibido. Falar a língua Puri foi proibido. Usar a rede foi proibido. Beber o chá da poiaia foi proibido. Caçar e pescar foram proibidos. Então, na mata, o silêncio; no campo, só o vento frio soprava. A tristeza se espalhou; muitos se foram. Outros ficaram, perdidos, escondidos, sufocados. Tornaram-se invisíveis e sem voz. Aprenderam outra língua, outros costumes. Criaram seus filhos e filhas sem pátria, sem registros; vivem exilados, sem serem reconhecidos. Refugiados nas montanhas e matas, trabalharam no campo e na terra. Seus descendentes cresceram sem saber as histórias dos ancestrais. Muitos podem falar somente dos pais, somente dos avós. As histórias das famílias camponesas foram apagadas. Sem memórias, muitos, perdidos, sentem o vácuo do seio fraternal, convivendo com processos de adoecimento mental e identitário.

Desde a lei do vice-rei, de 1808, que determinava a caça aos Puri no médio Vale do Rio Paraíba, até 1988, com a Constituição inserindo os direitos indígenas na carta magna, o Sudeste, e principalmente o Rio de Janeiro, viram o desaparecimento da população indígena ser efetivado através da literatura dos livros escolares, que contam uma história de vencedores e vencidos. Isso foi implementado pelas forças de um Estado monárquico, ditatorial e usurpador do povo da terra. Feito para manter o comércio exterior, alimentando a Europa e dando o bagaço da laranja à nossa gente. Vários povos indígenas sobreviveram, escondidos nas pedras e nas palhoças, e viram um novo tempo chegar. Sua juventude buscou respostas, estudou e se formou para, de igual para igual, construir um novo diálogo de reconstrução das identidades indígenas, como direito de vida das populações pré-colombianas desse território.

Os Puri, num processo de ressurgência, acendem essa luz, inserindo-se nos registros sociais públicos, produzindo arte, música, café, e organizações sociais, e adquirindo suas terras. Fazem escola no campo, cinema, artes plásticas e até o Museu da Cultura Puri, para contar uma história viva, recobrindo as memórias ancestrais em diálogo contemporâneo com o novo tempo, retirando os indígenas do estigma da incapacidade, para sua valorização com protagonismo de contar sua história e comprovar que seus conhecimentos milenares, tecnológicos, sempre foram usados pela humanidade, mas nunca reconhecidos. Fazem da beleza de sua arquitetura, grafismos, cerâmicas, tecelagens, do uso adequado do ambiente e da conservação da natureza, a sua resignação diante da violência e da ignorância de muitos, contra a possível vida de harmonia que se possa ter no planeta, e contra a ganância do acúmulo de capital. Lutam dia a dia e dizem: resolvemos não morrer para contar a história do Puri Bem Vivo.

NÀ THAMATI.

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Fonte: https://radioyande.com/os-invisiveis/

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