Foto: Mário Vilela/Funai
Saiba o que teve de mais importante no monitoramento do Observatório dos Direitos e Políticas Indigenistas no mês de Outubro (01/10-31/10).
O Censo Demográfico de 2022, realizado pelo IBGE, identificou 391 etnias indígenas no Brasil, um aumento expressivo em relação às 305 registradas em 2010. A população indígena total é de 1.694.836 pessoas, das quais cerca de 74,5% declararam pertencer a uma etnia específica. As três maiores etnias do país são Tikúna (74.061 pessoas), Kokama (64.327) e Makuxí (53.446). O levantamento também revelou a presença de 295 línguas indígenas faladas por pessoas de dois anos ou mais, número superior ao registrado no censo anterior, que havia identificado 274. Entre as línguas com mais falantes estão Tikúna (51.978), Guarani Kaiowá (38.658), Guajajara (29.212) e Kaingang (27.482).
Apesar do aumento no número absoluto de falantes de línguas indígenas, que passou de 293,8 mil em 2010 para 434 mil em 2022, houve uma redução proporcional: de 37,3% para 28,5% entre os indígenas com cinco anos ou mais. Dentro das Terras Indígenas, porém, a proporção de falantes cresceu, de 57,3% para 63,2%, o que indica uma preservação linguística mais forte nesses territórios. Segundo o IBGE, o crescimento no número de etnias e línguas identificadas se deve tanto à melhoria dos métodos de coleta quanto ao fortalecimento das identidades étnicas, além de movimentos migratórios recentes, como a chegada de povos indígenas vindos da Venezuela.
Uma das principais inovações do Censo 2022 foi a ampliação da autodeclaração indígena, permitindo que cada pessoa informasse até duas etnias, em vez de apenas uma, como em 2010, e até três línguas indígenas faladas ou utilizadas. Essa mudança reconheceu a diversidade de uniões entre povos diferentes e a realidade plurilíngue de muitas comunidades, oferecendo um retrato mais fiel da identidade indígena no país. O salto de 305 para 391 etnias no total nacional, e de 250 para 336 dentro das Terras Indígenas, resultou de um novo tratamento das listas de nomes: o IBGE desagregou 25 etnias antes agrupadas e individualizou 8 que anteriormente apareciam na categoria genérica “outras etnias das Américas”, incluindo povos migrantes como os Warao (da Venezuela) e os Aimara (presentes em Roraima e Amazonas). Durante a coleta, recenseadores frequentemente registraram novos nomes de etnias e línguas: não por serem recém-formadas, mas porque, pela primeira vez, o IBGE passou a reconhecê-las formalmente, anotando as “entradas textuais” informadas pelos indígenas para posterior validação junto a especialistas e órgãos indigenistas como a Funai.
Retomada da TI Guyraroká. O Conselho Indigenista Missionário (CIMI) denunciou uma onda de violência em torno da retomada de parte da área da Terra Indígena Guyraroká pelos povos Guarani e Kaiowá, no Mato Grosso do Sul: as famílias indígenas relatam ataques das forças de segurança do Estado, inclusive destruição de barracos, ferimentos, até enterro de animais vivos, em um contexto onde já vinham denunciando uso de agrotóxicos e despejo de veneno aérea por fazendeiros dentro da TI, com o objetivo de proteger monoculturas ao redor.
Um relatório de escuta realizado por autoridades públicas revela que a ocupação da sede da Terra Indígena Guyraroká, no município de Caarapó (MS), pelos povos Guarani e Kaiowá foi motivada por um sequestro de uma jovem de 17 anos e forte suspeita de abuso sexual. Segundo o documento, a garota teria sido retirada de uma área próxima à comunidade durante uma caçada, abordada por homens armados, encapuzados, transportada em uma caminhonete branca e deixada chorando sob uma mangueira na sede da fazenda. Ao chegarem ao local, indígenas teriam sido recebidos com tiro e fogo em bambuzal por homens armados, o que levou o grupo a decidir permanecer na sede para impedir o retorno dos suspeitos até a intervenção da Força Nacional de Segurança Pública. A comunidade indígena exige investigação rápida e apoio integral à vítima e denuncia que o episódio se soma a quatro ataques policiais e inúmeras agressões realizadas por milícias em sua área de retomada.
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) reviu uma decisão e determinou que seja a Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) ou a Polícia Federal (PF), e não a Polícia Militar (PM), a responsável pela segurança da área da Terra Indígena Guyraroká, no município de Caarapó (MS), durante uma retomada ocorrida em 21 de setembro. Na decisão, o desembargador Cotrim Guimarães estabeleceu que a atuação da FNSP ou da PF permaneça no local “até que o juiz suscitante delibere sobre tais questões”, de modo a “evitar supressão de instância e violação às normas recursais” do tribunal. Além disso, a decisão reconhece que a competência para julgar o pedido de reintegração de posse cabe à Justiça Federal de Dourados, que havia expedido mandado para atuação da PM na fazenda arrendada à Agropecuária Esperança S/A.
Comissão da Verdade. O Fórum Memória, Verdade, Reparação Integral, Não Repetição e Justiça para os Povos Indígenas – composto por mais de 60 organizações indígenas, entidades da sociedade civil, órgãos públicos e acadêmicos – apresentou nesta terça-feira (21) em Brasília ao Ministério dos Povos Indígenas (MPI) uma minuta de decreto para a criação da Comissão Nacional Indígena da Verdade (CNIV), cuja missão será apurar violações de direitos cometidas contra os povos originários durante o regime militar brasileiro. O documento sugere que a comissão tenha duração mínima de três anos, seja composta majoritariamente por indígenas — sete membros indicados pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e outros sete de uma lista enviada pelo Fórum — e atue para investigar assassinatos, desaparecimentos, remoções forçadas, esbulhos de terras, torturas e formas análogas de trabalho escravo. A ministra Sônia Guajajara defendeu o caráter histórico da proposta e se comprometeu a conduzir os diálogos necessários para o reconhecimento e reparação dessas violências, destacando que “a violência contra os povos indígenas ainda não cessou”. A iniciativa se apoia nas recomendações da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que em seu relatório final de 2014 indicou que ao menos 8.350 indígenas foram mortos entre 1946 e 1988 — número considerado subestimado dado que abrangia apenas parte dos povos indígenas existentes.
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