Acesse a página de homenagem que criamos no Armazém Memória

Marcelo, desde jovem, era impossível! Saiu da casa dos pais, largou a faculdade e se aproximou de padres franciscanos, suas ideias e práticas. Com eles, aprendeu sobre a teologia da libertação e a nunca naturalizar as desigualdades. De 1983 a 1988, vivendo na Favela do Autódromo de Interlagos, na zona sul da cidade de São Paulo, Marcelo desenvolveu trabalhos ligados à educação e comunicação popular, à montagem de bibliotecas comunitárias, participou de lutas por terra e moradia. Nessa mesma época, concluiu o curso de psicodrama e atuou em ações e projetos como ego-auxiliar. Abraçou as causas em defesa dos direitos humanos e atuou junto a Dom Paulo Evaristo Arns no jornal O São Paulo, quando a ditadura ainda submetia o país à miséria, prendia, torturava e matava o povo brasileiro.

Marcelo criou o Armazém Memória em 2001. Desde então, foram inúmeros projetos voltados para a digitalização e disponibilização de arquivos da história, da cultura e das lutas dos povos brasileiros, documentados em textos, fotografias e vídeos. Colaborou com o MST, participando ativamente de caminhadas para Brasília e organizando a memória da luta pela terra. Criou centros de referência virtuais temáticos junto a entidades e organizações populares, colaborando assim para a construção de uma visão popular sobre o direito à memória, à verdade e à justiça.

Contribuiu com o projeto Memórias Reveladas e participou da concepção e realização do “Brasil Nunca Mais: Digital”, que digitalizou o acervo do Brasil Nunca Mais, com mais de 850 mil páginas de processos do Supremo Tribunal Militar do período ditatorial. Em 2012, participando dos processos da Comissão Nacional da Verdade(CNV), Marcelo encontrou e tornou públicos documentos fundamentais para a memória do Brasil: o Relatório Figueiredo, de 1967, que relata violações contra povos indígenas durante a ditadura militar; e um vídeo de 1970 da formatura da Guarda Rural Indígena, que aparece aplicando a tortura do pau de arara em um indígena.

Na CNV, foi um dos principais defensores da inclusão das violações contra os povos indígenas nas apurações e no relatório da Comissão, tendo ainda impulsionado e colaborado em Comissões Estaduais da Verdade, como a do Pará, cujo relatório final foi entregue em 31 de março de 2023. Foi vice-presidente do Grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo, e integrava a Comissão Justiça e Paz de São Paulo.

Apostando na força da memória e da articulação política, Marcelo batalhou junto com os povos indígenas para visibilizar a repressão, a usurpação de terras e as violações da ditadura contra os indígenas – para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça. Atualmente, Marcelo dedicava todo seu tempo à formulação e instauração de uma Comissão Nacional Indígena da Verdade, capaz de visibilizar e reparar graves violações de direitos humanos contra os povos indígenas, no passado e no presente, combatendo as violências a partir da proposição de ferramentas de não repetição. 

Desde a eleição do Lula em 2022, Marcelo estava a todo vapor, confiante nos avanços das lutas dos povos indígenas por demarcação e reparação. Esteve em Brasília duas vezes em 2023. Reuniu-se com lideranças indígenas, com o Ministério dos Povos Indígenas e a FUNAI, fez pronunciamentos na Câmara dos Deputados, participou com muita alegria do Acampamento Terra Livre, sempre levantando a bandeira da necessidade da Comissão Nacional Indígena da Verdade.

Marcelo definia o Armazém Memória como “um resgate coletivo da história”.  Por vezes mais solitário, muitas vezes com pouquíssimos recursos, o trabalho diário de Marcelo no Armazém Memória sempre foi uma militância em rede, baseada na articulação em nível nacional e latino-americano. O Armazém foi concebido como uma ferramenta para articular a memória nas políticas do presente: lembrar, denunciar, reparar, transformar.

Marcelo deixou um legado grandioso, que cabe a nós cuidar, fazer crescer e frutificar. Marcelo Zelic presente!

Acesse: https://armazemmemoria.com.br/marcelo-zelic-presente/