Foto: Zeca Ribeiro/Sinacom/MPF
Promovido pela Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais (6CCR), evento busca ampliar e aprofundar a compreensão do tema por membros e servidores da instituição
Com o objetivo de trazer conhecimento técnico, fomentar o compartilhamento de boas práticas e aprimorar a atuação em defesa dos povos tradicionais e do meio ambiente, o Ministério Público Federal (MPF) promoveu, na última quarta-feira (21), o curso Patrimônio Genético e Conhecimento Tradicional Associado. Dezenas de membros e servidores participaram da capacitação, que está disponível no Canal MPF no Youtube.
O evento é uma iniciativa da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais (6CCR). Durante a abertura, o procurador da República Daniel Luis Dalberto – representante do MPF no Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGen) e coordenador do Grupo de Trabalho Comunidades Tradicionais – ressaltou a importância de ampliar e aprofundar a compreensão da instituição sobre o tema, que envolve várias áreas de atuação.
“Enquanto MPF, temos diversas atribuições constitucionais e legais e precisamos muito desse conhecimento para atuar na matéria, no âmbito criminal, ambiental e de proteção de direitos indígenas e das comunidades tradicionais”, afirmou. Segundo o procurador, os desafios impostos à humanidade pela civilização ocidental, como os problemas climáticos e o risco de extinção em massa, levam à busca e revelam a importância, cada vez maior, do conhecimento ancestral das comunidades tradicionais, “umbilicalmente ligados a biodiversidade”.
Nessa contexto, cabe ao MPF atuar para assegurar os direitos e interesses das populações tradicionais, como a autodeterminação, a consulta prévia e a repartição de benefícios. “Essa matéria precisa ser vista com o olhar das comunidades indígenas e tradicionais, porque são elas que nos levaram a essa imensa biodiversidade e nos legam esse rico conhecimento milenar”, completou Luis Dalberto.
O debate contou com a participação da indigenista especializada da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e integrante da coordenação do Cgen, Maira Smith, e do analista ambiental e coordenador do Núcleo de Fiscalização e Proteção dos Recursos Genéticos do Ibama, Isaque Medeiros Siqueira. Eles abordaram o contexto histórico de criação da Lei de Biodiversidade, suas formas de regulamentação, fiscalização, repartição de benefícios, proteção e acesso ao conhecimento tradicional associado; bem como os direitos, demandas e papel dos povos indígenas e dos povos e comunidades tradicionais no processo produtivo e de pesquisa científica. Os expositores usaram exemplos e casos práticos importantes na proteção do patrimônio genético com conhecimento tradicional associado.
Saiba mais – A discussão acerca da necessidade de legislação específica que regulamentasse a exploração da biodiversidade brasileira e o papel dos povos e comunidades tradicionais nesse processo teve impulso com a Convenção sobre Diversidade Biológica, assinada durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento realizada em 1992, no Rio de Janeiro (ECO 92). O tratado estabeleceu que cabe a cada país regular, por legislação nacional, o acesso, a repartição de benefícios e o consentimento prévio fundamentado, relativos aos recursos genéticos e aos conhecimentos tradicionais.
A Medida Provisória nº 2.186-16, de 2001, foi editada para responder a essa demanda, estabelecendo mecanismos de combate a biopirataria, além de ser responsável pela criação do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGen). Contudo, a norma sofreu críticas da comunidade acadêmica, pela burocratização das diretrizes, e por parte dos povos e comunidades tradicionais, que sempre demandaram maior participação no processo de tomada de decisão.
Passados quase quinze anos, a Lei nº 13.123/2015, conhecida como Marco da Biodiversidade, estabeleceu diretrizes para o uso do conhecimento tradicional associado à biodiversidade pela ciência e pela cadeia econômica produtiva. A norma também previu a inclusão de representação no CGen do setor empresarial, do setor acadêmico, e de populações indígenas, comunidades tradicionais e agricultores tradicionais.
Na avaliação de Maira Smith, porém, esses povos ainda são sub-representados, compondo 1/3 do total de participantes no colegiado. “Com a Lei da Biodiversidade, temos uma mudança de paradigma e um grande avanço com a participação da sociedade civil, mas ainda podemos perceber a assimetria de participação dos guardiões do CTA [Conhecimento Tradicional Associaldo]. Há também uma luta dos povos indígenas para o reconhecimento da dimensão identitária e espiritual do CTA, que geralmente não é percebida e nem considerada pela sociedade e pelo sistema jurídico”, ponderou.
Para garantir que todas as informações relativas ao CTA sejam rastreáveis, indicando a origem do conhecimento tradicional, foi criado pelo Decreto nº 8.772, de 11 de maio de 2016, o Sistema Nacional de Gestão do Patrimônio Genético e do Conhecimento Tradicional Associado (Sisgen). A ferramenta auxilia o CGen na gestão do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado, viabilizando a aplicação da lei.
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