Ministra dos Povos Indígenas e secretário executivo se reúnem com a Assembleia Geral do Povos Guarani e Kaiowá da FAIND

Na segunda e na terça-feira (9 e 10), o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) compareceu à Faculdade Intercultural Indígena (FAIND), vinculada à Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), para cumprir a fase final da 5ª etapa do Ciclo COParente no Centro-Oeste do Brasil. A equipe do ministério promoveu palestras, debates e diálogos para orientar os indígenas do cone sul do Mato Grosso do Sul, representados pela organização de base Aty Guasu, e estudantes indígenas da instituição para orientá-los sobre os processos de participação na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a COP 30.

Na semana passada, a equipe compareceu à aldeia Buriti para realizar a mesma dinâmica com o Conselho Terena e os povos Guató, Kinikinau e Kadiwéu, que representam os povos pantaneiros da unidade federativa. Com a conclusão do Ciclo no Estado, o MPI já esteve com organizações de base, lideranças e representantes indígenas dos biomas Caatinga, Pampa, Mata Atlântica, Cerrado e Pantanal e se prepara para iniciar o COParente nos nove estados brasileiro abrangidos pelo bioma amazônico, uma vez que a COP 30 será realizada em Belém, no Pará, em novembro. 

Na manhã da segunda-feira, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, e o secretário executivo, Eloy Terena, compareceram à Reserva Indígena de Dourados, composta pelas aldeias Bororó e Jaguapiru, para participar de um ritual Guarani Kaiowá em um casa de reza. Em seguida, a comitiva do MPI foi à FAIND para compor a mesa do Ciclo COParente e se pronunciar aos indígenas.

Olhando para o contexto indígena do MS, a ministra citou que os territórios indígenas dos Guarani Kaiowá foram entregues pelo Estado no passado sem respeitar a ocupação tradicional indígena local e que a emissão de gases de efeito estufa e degradação ambiental na região é majoritariamente proveniente do agronegócio, pecuária, desmatamento e incêndios florestais.

“Para reduzir as emissões, temos que encontrar formas para reduzir o desmatamento e conter o avanço das pastagens que avançam sobre nossos territórios. Por isso, esta tem que ser a COP da implementação de medidas de mitigação e adaptação em nossas terras via mecanismos de financiamento climático vindo dos países ricos que mais poluem”, definiu Sonia Guajajara.

Avanços da pauta indígena do MS

Ainda sobre a realidade indígena do MS, segundo o secretário Eloy Terena, há uma série de Grupos de Trabalho (GTs) da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI) referente aos estudos e delimitações de territórios Guarani Kaiowá no estado do MS, que se arrastam há mais de duas décadas, e foram paralisados durante a gestão passada do governo federal. No mesmo período, o ministro da Justiça da gestão anterior orientou a Advocacia-Geral da União (AGU) para retroceder os processos de demarcação de Terras Indígenas locais. 

“Contudo, nos primeiros 100 dias de MPI um mutirão foi feito para elencar os processos prontos para a homologação e foi constatado que os processos relacionados ao Guarani Kaiowá estavam engavetados. Assim, todos os GTs foram reativados com recursos provenientes da FUNAI”, afirmou. 

Além disso, o secretário divulgou que apesar de o MS não ter nenhum Plano de Gestão Ambiental e Territorial Indígena (PGTA) em curso, o total de seis Planos estão em fase de construção pelo MPI para atender aos Guarani Kaiowá, mais três para os Terena e mais um para o povos Kadiwéu. O PGTA é uma das principais políticas públicas indígenas, instituída via decreto em 2012, que visa empregar conhecimento indígena para aprimorar as condições ambientais das áreas de maneira harmoniosa.

 Após a mesa de abertura na FAIND, a ministra e o secretário compareceram à uma área de retomada Guarani Kaiowá para uma visita a um poço emergencial. Ao todo, 12 poços de um total de 20 foram entregues para viabilizar o acesso à água ao povo Guarani Kaiowá, que busca reaver territórios tradicionalmente ocupados há décadas através de retomadas. O valor do projeto é de R$ 575 mil e, por meio de uma articulação com o parlamento do Estado, o montante de R$ 53 milhões será injetado nas na região para resolver a falta de água para comunidades indígenas em parceria com a UFGD. 

Além disso, o secretário acrescentou que, em março de 2025, o governo brasileiro e o Secretariado da Conservação de Espécies Migratórias de Animais Silvestres (CMS) determinaram que Campo Grande, capital do MS, será a sede da Conferência das Partes (COP 15) sobre espécies migratórias no mês de março de 2026.

Depoimentos dos Guarani

Fora as autoridades do ministérios, a mesa do COParente foi formada por Tonico Benites, coordenador regional da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em Ponta Porã; Norivaldo Mendes, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB); Voninho Benites Pedro, do movimento de professores Guarani-Kaiowá; Salim Nhandeva, representante da juventude Guarani-Kaiowá; Valdelice Veron, da Aty Guasu, pelo reitor da UFGD, Jones Goettert, o secretário de direitos humanos de Dourados, Luiz Carlos Calado, e por políticos como a deputada federal Gleice Jane e vereadores do município.

Já a comitiva do MPI trouxe à Aty Guasu e aos estudantes da FAIND apresentações sobre como funciona a COP, quais são os principais resultados esperados por meio do evento e do que se trata a PNGATI. Por sua vez, os indígenas esclareceram dúvidas junto aos representantes do governo e discutiram critérios para indicar 10 representantes para a Conferência. O mesmo procedimento também ocorreu na terça-feira. 

“A COP 30 vai acontecer na nossa casa: o Brasil. Com nossas 10 vagas, vamos conseguir levar nossas demandas para apresentar tanto nossas denúncias quanto nosso conhecimento. É importante não só para abordar a crise climática, mas como ela está relacionada com o agronegócio, o agrotóxico e como isso afeta a vida de quem vive em território indígena e no mundo de forma geral”, avaliou Inair Lopes Guarani Kaiowá, doutorando em geografia.

Para Anastácio Peralta Guarani Kaiowá, doutorando da UFGD formado pela FAIND, o aquecimento global é uma herança do colonialismo e do capitalismo. O fenômeno é entendido pelos Guarani Kaiowá como uma febre no planeta.

“A Terra está doente e, ao pesquisar nossos anciãos, percebi que para todas as ações do homem há uma resposta. Desmatar é tirar a roupa, a proteção da Terra. Já a mineração afeta os ossos da Terra e envenenar os rios é como contaminar o sangue da natureza. O COParente nos permite elaborar esse tipo de reflexão para o evento no Pará.” 

Contexto Guarani Kaiowá no MS 

Conforme Janio Kaiowá, coordenador da Aty Guasu, há 8 Reservas Indígenas Guarani Kaiowá no Estado e dezenas processos de retomada no Mato Grosso do Sul. Criada em 1917, a Reserva Indígena de Dourados possui a maior em concentração populacional, com mais de 20 mil Guarani, Kaiowá, Nandeva, Terena, entre outros povos, como Xavante, Marubo e Ofaié, vivendo em 3,5 mil hectares. 

O Censo 2022, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aponta a existência de mais de 43 mil indígenas Guarani Kaiowá no país. Se somados aos Guarani Nhandeva o número ultrapassa os 60 mil.

“A quantidade de retomadas e o espaço espremido da Reserva de Dourados retratam a necessidade de demarcação de nossas Terras Indígenas para que possamos superar problemas de infraestrutura que nos afetam, como a falta de saneamento básico e abastecimento de água, saúde, educação, lazer, cultura e a construção de política públicas para a manutenção de nossas áreas”, declarou.

FAIND

Maria Aparecida de Oliveira, diretora da FAIND, relatou que o curso intercultural indígena foi construído pelo movimento indígena da Aty Guasu a partir dos anos 2000, mas teve início em 2006 com o uso do idioma internamente para atender exclusivamente a população Guarani Kaiowá. A Faculdade hoje tem 450 alunos matriculados na licenciatura intercultural, na pedagogia intercultural e na licenciatura do campo. Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira(INEP) apontam que 538 professores indígenas do cone sul do Estado tem ensino superior, mais de 80% são formados na licenciatura intercultural da UFGD. 

A Faculdade habilita professores indígenas para atuarem no ensino básico e médio em quatro áreas de conhecimento: matemática, ciências da natureza (física, química e biologia), ciências (geografia, história, sociologia e filosofia) e linguagens, com foco no fortalecimento da língua Guarani. Há também um curso de pedagogia intercultural indígena que forma professores guarani para atuar em séries iniciais. No segundo semestre será lançado o curso de agroecologia para indígenas. 

“O curso é intercultural porque reconhece o conhecimento indígena como ciência. A presença dos indígenas na Faculdade abre a possibilidade da Universidade compreender que existem outros conhecimentos para além do euro centrado. O indígena tem outra condição de poder ao trazer conhecimento para a instituição”, descreveu a diretora. Ela ainda acrescentou que, a partir dos anos 2000, o Brasil viveu um movimento de criação de diferentes cursos de licenciatura indígena. A FAIND foi a primeira faculdade intercultural instalada dentro de uma universidade federal.

“Aqui, vários de nós se formaram. Essa escola permite a nossos indígenas aprender novamente a cultura Guarani, como a fala e as crenças, para repassá-las aos territórios. Ainda assim, aqui, os não indígenas também aprendem com a vivência dos povos Guarani”, concluiu Leila Rocha Guarani Nhandeva, moradora da retomada de Ivy Katu há 23 anos. 

Fonte: https://www.gov.br/povosindigenas/pt-br/assuntos/noticias/2025/06-1/mpi-conclui-5a-etapa-do-ciclo-coparente-e-apresenta-avancos-no-ms