Torneio aconteceu durante o 11º Encontro e Feira dos Povos do Cerrado, em Brasília
Brasília (DF) — A 1ª Copa Povos do Cerrado foi um golaço na programação do 11º Encontro e Feira dos Povos do Cerrado, realizado entre os dias 10 e 13 de setembro, em Brasília. A iniciativa teve como proposta promover a interação entre a diversidade dos Povos do Cerrado, engajar as juventudes e mulheres de Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais e, ainda, aproveitar a popularidade do futebol para falar sobre mudanças climáticas, COP 30 e o protagonismo desses povos nessa agenda.
A Copa reuniu 14 times, seis masculinos e oito femininos, formados por Povos Indígenas e Povos e Comunidades Tradicionais do Cerrado. A iniciativa foi realizada em parceria entre o IEB, representantes da Associação Quilombo Kalunga e o Observatório do Clima, por meio da Central da COP. A Central aproveita a linguagem do futebol para popularizar o debate sobre mudanças climáticas e a Conferência do Clima, que neste ano acontece em Belém do Pará.

Andreia Bavaresco, coordenadora executiva do IEB e integrante do comitê de coordenação do Observatório do Clima, destacou:
“Os Povos e Comunidades Tradicionais do Cerrado precisam estar unidos, e o que estamos fazendo aqui é criar esse espaço, seja nas discussões, nas oficinas, e por que não, até no futebol. Este encontro fortalece nosso diálogo, para levar nossas vozes à COP 30 e construir estratégias comuns em defesa dos territórios.”
Tradição, identidade e bola rolando
A 1ª Copa Povos do Cerrado teve representantes dos povos indígenas Bororo, Xavante, Timbira, Canela, Gavião, Krikati, Krahô, Apinajé, Fulni-ô, Kariri-Xocó, Guajajara, Guarani-Kaiowá, Terena, Xerente e Xakriabá, além de quilombolas do Quilombo Kalunga, geraizeiros, quebradeiras de coco, groteiros-chapadeiros, pantaneiras, agricultoras familiares e parceiros de Organizações da Sociedade Civil. Os jogos foram divididos em duas categorias: seis times masculinos e oito femininos, que trouxeram ao campo muito mais do que talento com a bola no pé.
O grande campeão masculino foi o time CF A UWE Xavante, que venceu a final por 2 x 1 contra o time CAA e CAV Teimosos F.C. Norte de Minas, composto por geraizeros, groteiros-chapadeiros e parceiros de Organizações da Sociedade Cível (OCSs).

As grandes campeãs femininas foram do time Mulheres 6, equipe mista composta por mulheres Xakriabá, uma representante da Rede Solidária de Mulheres do Urucuia Grande Sertão Veredas e uma pantaneira. O Mulheres 6 venceu a grande final nos pênaltis, após empate em 2 x 2 contra o time Apinarente, uma aliança entre mulheres Apinajé e Xerente do Tocantins.

No dia seguinte ao torneio, André Timbira, representante dos dois times Timbira masculinos, enviou uma mensagem no grupo de WhatsApp que reunia capitães e técnicos da Copa. Ele agradeceu:
“Venho agradecer, em nome do Povo Timbira, a organização da primeira Copa dos Povos Cerrado, uma iniciativa muito importante para ter interação entre Povos. Estou muito grato por ter participado e espero que seja o primeiro de muitas outras Copas do Cerrado. Valeu a todos e um bom retorno. Até o próximo encontro.”
Maria Terena, representante do time Cerrado MT, também deixou sua mensagem no grupo de WhatsApp:
“Nós mulheres Terena/ Guarani/ Kaiowá também agradecemos pela oportunidade. Foi maravilhoso essa Copa do Cerrado, depois de um dia inteiro de agendas chegar ao fim do dia e poder distrair é maravilhoso. Parabéns a organização e às Campeãs”
Além do espírito esportivo, o evento foi marcado por um forte simbolismo cultural e ambiental: os troféus entregues aos vencedores foram produzidos com vasos das mulheres da Associação Comunitária dos Artesãos e Pequenos Produtores de Mateiros (ACAPPM), feitos com capim dourado do Jalapão, conhecido como “o ouro do Cerrado”.

Cerrado, clima e territórios
O Cerrado é o berço das águas do Brasil: de suas nascentes brotam rios que abastecem oito das doze grandes bacias hidrográficas do país e sustentam a produção de alimentos, a geração de energia e o abastecimento urbano. A conservação desse bioma é, portanto, uma questão climática central, já que sua destruição compromete o regime de chuvas e a disponibilidade de água em todo o território nacional.
Nesse contexto, os Povos Indígenas e as Comunidades Tradicionais do Cerrado têm papel essencial: ao protegerem seus territórios e manterem práticas de manejo sustentáveis, garantem a preservação das águas, da biodiversidade e da estabilidade climática, beneficiando toda a sociedade.
Além de inúmeros Povos Indígenas, o Cerrado abriga diversos Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs), como geraizeiros, quebradeiras de coco, quilombolas, pequenos agricultores familiares, ribeirinhos, seringueiros, extrativistas de pequi e baru, além de assentados da reforma agrária, e artesãos tradicionais, que mantêm saberes centenários de manejo da terra e da biodiversidade. Esses povos vivem em harmonia com o bioma, cultivando alimentos, coletando frutos, e preservando áreas naturais, muitas vezes em territórios já reconhecidos legalmente como territórios tradicionais ou indígenas. Suas práticas são fundamentais para a conservação do Cerrado, garantindo nascentes, vegetação nativa e a regulação do ciclo hídrico, impactando diretamente o clima da região e do país.

“Sem a demarcação desses territórios, não tem jogo”
Para a ativista indígena Wasady Xakriabá (MG), a realização da Copa é um lembrete de que o esporte pode ser uma ferramenta importante para a defesa dos territórios.
“Sem a demarcação desses territórios, não tem jogo”, afirmou Wasady, durante a cerimônia de encerramento. “Nossa luta não é apenas por lazer, mas pela vida, pela terra, pela continuidade das nossas culturas.”
COP 30 e a centralidade dos povos do Cerrado
A 1ª Copa Povos do Cerrado também serviu como plataforma para articular a presença ativa dos povos tradicionais na COP 30, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, que será sediada pela primeira vez na Amazônia brasileira.
Durante o Encontro, a Central da COP fez uma ativação da Estação Central da COP, um espaço de diálogo e informação sobre a COP 30 mobilizando os participantes da feira e distribuindo materiais lúdicos e informativos sobre o tema. Acesse o site www.centraldacop.oc.eco.br para saber mais, baixar materiais e pedir kits para montar a sua Estação também!


Esporte como mobilização climática
Para Adriano Maneo, do IEB e um dos organizadores da Copa, o futebol é mais do que um jogo, é um elemento mobilizador e agregador em territórios de Povos Indígenas e Povos e Comunidades Tradicionais.
“O futebol é um fator mobilizador, agregador e sempre está presente nas comunidades tradicionais, quilombolas e indígenas do Cerrado. Ele mobiliza e engaja as juventudes, as mulheres e os homens, além de ser saúde e lazer, direitos fundamentais de todos nós. Não podíamos deixar de aproveitar o 11º Encontro e Feira dos Povos do Cerrado para realizar essa troca entre esses povos dentro do campo”, disse.
A 1ª Copa Povos do Cerrado mostrou que o futebol pode ir muito além de um jogo: dentro de um contexto de encontro, diálogo e mobilização climática, ele se transformou em um espaço de fortalecimento coletivo.

Texto: Ekuná Fulni-ô Kamayurá
Comentários