O avanço da Covid-19 entre povos da floresta levou um grupo de personalidades e voluntários a criar o Movimento União Amazônia Viva para captar R$ 6 milhões em caráter emergencial.
Recursos a serem destinados a ações no Alto Rio Negro (AM), no Baixo Amazonas (PA) e junto às comunidades do Vale do Javari (AM) e Yanomami (AM e RR).
Lançado oficialmente nesta sexta-feira( 3), o fundo filantrópico já captou R$ 1,2 milhão rateados entre quatro ONGs de referência na região amazônica: Expedicionários da Saúde, Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN), Instituto Socioambiental (ISA) e Saúde & Alegria.
Todo o dinheiro captado será destinado a ações de prevenção, saúde e segurança alimentar em municípios como São Gabriel da Cachoeira (AM), que tem 90% da população indígena e registrou disparada de casos de Covid-19 a partir de abril.
Na próxima semana, 31 toneladas de alimentos angariadas pelo movimento vão ser levadas de Manaus para a localidade em uma viagem de três dias de barco.
“Esse movimento é uma esperança na luta contra esse vírus que pode exterminar etnias inteiras”, afirma o cacique Marivelton Baré, presidente da federação que agrega 23 povos indígenas.
A escolha das instituições beneficiadas foi definida por atuarem nos territórios em colapso sanitário e que já contavam com planos de ação para combate ao novo coronavírus entre populações mais vulneráveis.
“O fundo chega no momento em que os recursos emergenciais começam a ficar escassos, enquanto a curva da pandemia na região está longe de se estabilizar”, diz Eugenio Scannavino, da Saúde & Alegria, vencedor do Prêmio Empreendedor Social em 2005. “A concepção também é perfeita ao captar para apoiar organizações que têm capacidade de entrega e credibilidade, financiando ações concretas e urgentes.”
A União Amazônia Viva vai custear, por exemplo, 10 mil testes em áreas indígenas e ribeirinhas na bacia do Tapajós. Os mundurucus, que perderam dois líderes para a Covid-19 no começo de junho, estarão entre os beneficiados. “É a comunidade mais vulnerável, numa área isolada e invadida por garimpeiros que levaram coronavírus e surto de malária”, relata Scannavino.
O movimento financia compra de EPIs, testes rápidos, cilindros de oxigênio e equipamentos hospitalares, além de remoções de doentes graves por barcos e aviões e enfermarias de campanha. Prioridades definidas diante da situação de vulnerabilidade social e as grandes distâncias e dificuldade de acesso a centros com infraestrutura médica.
“O índice de mortalidade entre as populações indígenas é 150% maior do que a média no Brasil e a pandemia exacerba falhas históricas no cuidado à saúde e na preservação dessas comunidades”, afirma Marcella Coelho, cofundadora do movimento, ex-presidente do conselho do Greenpeace no Brasil.
Marcella explica que a União Amazônia Viva segue os moldes do movimento União BR, do qual é uma das lideranças, que já arrecadou R$ 85 milhões para o enfrentamento da pandemia em 20 estados.
Capacidade de engajamento e captação bem-vinda no momento em que a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) computou 10.341 casos confirmados de Covid-9 e 409 mortes em 121 comunidades impactadas pela pandemia, até a quinta-feira (2).
São dados coletados pela Secretara de Saúde Indígena do Ministério da Saúde e pelo Comitê Nacional de Vida e Memória Indígena que demostram a situação crítica e ajudaram a aglutinar nomes de peso ao movimento.
“Eles precisam da nossa ajuda já. Participe com quanto puder”, afirma Sebastião Salgado, no vídeo da campanha, ao saudar a criação do fundo União Amazônia Viva.
Com versão em português e inglês para captar também doações internacionais, a campanha é assinada pelo cineasta Fernando Meirelles e conta com 14 imagens inéditas cedidas por Salgado.
Personalidades como Caetano Veloso, Gisele Bundchen, Taís Araújo e Luciano Huck também aderiram ao movimento. “Vi o Amazônia Viva nascer, sei da credibilidade das pessoas envolvidas. É um oportunidade para quem está longe, quer contribuir e não sabe como”, afirma Huck.
Para o economista Armínio Fraga, o movimento é mais do que um gesto de resistência. “É parte de uma grande virada que temos que construir.” Ao lado da mulher, Lucyna, ele se somou a um grupo de apoiadores e voluntários, entre eles Ilona Szabo (Instituto Igarapé) e Ana Lúcia Villela (Instituto Alana).
Administrado pela Sitawi Finanças do Bem e gerido por um comitê técnico, o fundo filantrópico já atraiu grandes doadores, como Klabin, e os institutos Humanize e Galo da Manhã.
“O nosso desafio é aproximar da realidade dos povos da floresta os doadores do eixo Rio-São Paulo, que já aderiram a outras causas durante a pandemia, e engajá-los nessa nova emergência”, explica Nina Valentini, cofundadora do movimento, que é responsável pela captação.
Vencedora do Prêmio Empreendedor Social do Futuro em 2016 com a plataforma Arredondar, Nina aposta na adesão de pessoas físicas e de doadores internacionais para cumprir a meta inicial de R$ 6 milhões.
O fundo receber aportes pelo site www.uniaoamazoniaviva.com. O apoio também se dá por doação de alimentos, insumos e materiais de limpeza.
“Por ironia do destino, os povos da floresta estão morrendo por falta de ar”, conclui Natalie Unterstell, também fundadora do movimento e responsável por toda a complexa logística para socorrer os habitantes do pulmão do planeta ameaçados pelo coronavírus.
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