Principal linha de investigação da polícia aponta para homicídio; entidades cobram solução do caso
Ao avistar aves sobrevoando uma região de mata à beira de uma lavoura, nas proximidades da Terra Indígena Guarita, no município de Redentora, noroeste do Rio Grande do Sul, um agricultor encontrou o corpo de uma jovem kaingang, com a parte inferior dilacerada, na última quarta-feira (4).
A menina foi identificada como Daiane Griá Sales, 14, moradora da terra indígena, a maior do Rio Grande do Sul, com cerca de 23 mil hectares e quase 8.000 moradores e que teve demarcação há mais de um século. A identificação, segundo a Polícia Civil, foi feita pela própria mãe.
A garota saiu de casa no último sábado (31), por volta das 16h, e encontrou amigos em uma reunião na localidade conhecida como Vila São João, onde dançaram e ouviram músicas por meio de equipamentos de carros estacionados.
A reportagem teve acesso a vídeos que mostram a jovem e outras meninas dançando em frente a um carro branco, que foram encaminhados por lideranças da comunidade para a investigação policial. Depois da reunião, ela não retornou mais para casa.
A família deu falta da menina no dia seguinte, mas não chegou a registrar o desaparecimento dela, achando que regressaria, segundo relatos feitos à investigação. Eles só voltaram a ter notícias dela quando o corpo foi localizado pelo agricultor.
Segundo o delegado responsável pelo caso, Vilmar Alaídes Schaefer, a menina foi encontrada com a parte inferior do corpo dilacerada, provavelmente por ação de animais. Há também vestígio de amassamento da vegetação perto do local onde o corpo foi localizado, o que é objeto de investigação.
A principal linha de apuração, diz Schaefer, é a de homicídio, mas a polícia busca apurar se a menina foi ainda vítima de crime sexual e se houve ocultação do cadáver, devido ao local onde o corpo foi encontrado.
No corpo da jovem, de acordo com informações preliminares passadas pelo médico legista à investigação, não havia sinais de ferimentos por arma branca ou arma de fogo.
“Estamos aguardando o laudo conclusivo para dizer qual é a causa da morte. Ela foi encontrada morta, há um sinal de estrangulamento no pescoço dela, mas se isso produziu efetivamente a morte dela ou não, não se sabe. Isso tudo o laudo pericial e as investigações vão nos dizer”, disse o delegado.
O delegado afirmou ainda que o caso parece ser um episódio isolado, mas que depende da investigação para falar conclusivamente sobre as motivações.
Nesta sexta-feira (6), a polícia ouviu testemunhas, além de encaminhar exames complementares e análise de imagens e vídeos que podem servir de pistas.
“Há suspeitos que estão sendo investigados, mas de forma concreta ainda não há nomes a apontar”, disse Schaefer.
Carlinhos Alfaiate, que é cacique na TI Guarita há cerca de três anos, afirmou que a comunidade está em contato com a polícia e espera ver o caso solucionado. A terra indígena tem população kaingang, como ele, e guaranis.
“Nós não vamos deixar impune isso. Hoje temos quase 8.000 índios na nossa comunidade, a preocupação aumenta a cada dia. O culpado vai pagar, não importa quem. Eu, como cacique, não concordo com isso, não aceito. Esse vídeo que foi gravado foi fora da reserva”, disse ele, se referindo às imagens encaminhadas à investigação.
A Apib (Associação dos Povos Indígenas do Brasil) publicou uma nota em redes sociais repudiando a violência contra mulheres indígenas e pedindo justiça pela jovem, qualificando a morte como crime bárbaro.
“A Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com todas as organizações regionais de base, repudiam toda e qualquer violência contra mulheres indígenas e exige que a justiça seja feita a quem cometeu tal atrocidade”.
O Cimi (Conselho Indigenista Missionário), também por meio de nota, manifestou indignação pelo caso e pediu que a Funai (Fundação Nacional do Índio) e órgãos de investigação federal promovam ações para coibir violências e responsabilizar autores dos crimes, além de verificar se eles estão vinculados à intolerância e ao racismo contra os povos indígenas.
“A violência que se pratica contra indígenas se intensifica na medida em que se proliferam os discursos de ódio e intolerância contra os povos em âmbito nacional. Lamentavelmente os jovens, especialmente meninas, têm sido vítimas preferenciais de homens perversos, assassinos e estupradores. Exige-se justiça e medidas de proteção aos territórios e aos direitos dos povos indígenas”, diz o texto.
A Funai informou que acompanha o caso junto às autoridades policiais e que está à disposição para colaborar com as investigações.
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