Membros de todo o país visitaram o PAE Santo Afonso, em Abaetetuba, para conhecer de perto os desafios vividos pelos povos da Amazônia

Após dois dias de discussões aprofundadas sobre as estratégias que devem ser traçadas pelo Ministério Público Federal (MPF) para impedir a violação de direitos humanos e territoriais de povos indígenas e comunidades tradicionais diante das mudanças climáticas, procuradoras e procuradores da República de todas as regiões do Brasil visitaram o Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Santo Afonso, em Abaetetuba (PA). Com a viagem, o MPF objetivou dialogar com moradores do PAE e de outras comunidades tradicionais da região para conhecer de perto os desafios enfrentados pela população local. A atividade itinerante marcou o encerramento do Encontro Nacional da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR/MPF).

Depois de realizarem uma recepção calorosa, emocionante e acolhedora, com cânticos sobre a preservação da Amazônia, resistência e valorização dos recursos naturais que sustentam a subsistência do modo de vida tradicional, como a água, o peixe, o camarão e o açaí, lideranças de mais de cinco comunidades relataram diversos tipos de violência vividos diariamente pelos povos da região, causados, principalmente, pela instalação de grandes empreendimentos, como complexos portuários e industriais. “Uma das primeiras violências que nós sofremos é dizerem que nós não existimos, nos invisibilizam. Isso dói, isso verdadeiramente nos machuca e nos mata”, declarou a liderança da comunidade Nossa Senhora de Nazaré, Osmana Caripetuba.

Outras violações apontadas pelas comunidades foram a invasão de territórios, a aquisição coletiva de doenças por contaminação da água e de plantações, o acúmulo de lixo jogados nos rios, importunações com o objetivo de impedir a pesca e outras atividades ligadas ao sustento das comunidades e o assédio de empresas com interesse em intermediar a comercialização de créditos de carbono. “Nós não precisamos de créditos de carbono, nós sempre preservamos a natureza”, frisou a liderança da comunidade quilombola do Bom Remédio, Rosicleia Silva Ferreira.

As lideranças também denunciaram que, apesar de a maioria das comunidades já possuir protocolo de consulta, decisões do Poder Público e implementações de empreendimentos que impactam diretamente na existência e no modo de vida dessas populações continuam sendo efetivadas sem Consulta Livre, Prévia e Informada, como determina a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que tem força de lei no Brasil desde 2004.

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Mudança de paradigma – A coordenadora da 6CCR, subprocuradora-geral da República Eliana Torelly, afirmou que o encontro com as comunidades foi uma grande fonte de sensibilização e inspiração para fortalecer a atuação do MPF. “Essa é uma oportunidade que mexeu com a gente. Vamos sair daqui diferentes”, disse Torelly.

O procurador-chefe do MPF no Pará, Felipe Palha, destacou que ir aos territórios e conhecer a realidade desses povos é essencial para que o MPF consiga atender aos anseios das comunidades e combater as mudanças climáticas. “A importância de ter trazido diversos membros do MPF aqui de todo Brasil e com atuação em todas as instâncias do Poder Judiciário é que todos perceberam que o que precisa ser discutido é a mudança de modelo econômico imposto para a Amazônia, porque o atual modelo continua sendo colonial e exploratório, modelo este que viola direitos das comunidades há mais de 525 anos. São exatamente os grandes empreendimentos implantados de maneira sempre violenta na Amazônia e o agronegócio os maiores causadores das mudanças climáticas e de graves violações de direitos humanos de povos e comunidades tradicionais”, explicou.

“Para nós, é muito enriquecedor perceber que nós precisamos aprender com os territórios para fazer melhor o nosso trabalho, seja no judiciário, extrajudicialmente ou nos fóruns de debate sobre a COP30”, concluiu Palha.

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Transporte fluvial, o MPF e as comunidades – Para chegar ao PAE Santo Afonso, que comporta aproximadamente 370 famílias, o MPF utilizou embarcações adquiridas pela própria instituição para se conectar e aproximar de comunidades tradicionais que vivem em lugares de difícil acesso na Amazônia.

Essas embarcações, que funcionam como escritórios de representação fluvial, têm auxiliado o MPF desde maio de 2023, quando o escritório de representação fluvial da unidade de Belém, capital paraense, foi inaugurado. No Pará, o MPF possui embarcações em todos os municípios onde a instituição tem sede própria: Belém, Altamira, Marabá e Santarém. 

Os equipamentos permitem que o MPF ofereça atendimento ainda mais rápido às comunidades porque a equipe não precisa mais depender dos horários e de demais restrições impostas por empresas privadas de transporte. Viagens mais rápidas também proporcionam mais segurança à equipe do MPF.

João Batista, liderança da comunidade Igarapé Areia, comemorou a ida do MPF ao PAE Santo Afonso. “Nós estamos há mais de dez anos nessa luta contra essas empresas e a vinda de vocês aqui nos traz esperança. Enquanto estivermos vivos, vamos continuar lutando para que a Amazônia continue em pé”, disse.

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Sobre o encontro – O Encontro Nacional da 6CCR, realizado entre 21 e 23 de maio, em Belém (PA), reuniu procuradores, lideranças comunitárias, acadêmicos e representantes de órgãos públicos para discutir os desafios enfrentados por povos indígenas e comunidades tradicionais diante da crise climática e das violações de direitos territoriais. O evento abordou a necessidade de políticas públicas que garantam a regularização fundiária, a consulta prévia, livre e informada e a proteção dos modos de vida tradicionais, destacando o papel central dessas comunidades na preservação ambiental e para o combate às mudanças climáticas.

As discussões destacaram problemas como a sobreposição de territórios tradicionais, os impactos do mercado de créditos de carbono e a exclusão de comunidades em projetos de transição energética. O encontro reforçou a importância de ações integradas para combater a omissão estatal e promover justiça climática e territorial, consolidando o compromisso do MPF com a defesa dos direitos dessas populações.

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Fonte: https://www.mpf.mp.br/pgr/noticias-pgr2/2025/mpf-encerra-evento-sobre-mudancas-climaticas-com-escuta-a-povos-tradicionais-no-para