• Diante das previsões de eventos climáticos extremos, o PNUMA publicou um especial sobre como o conhecimento indígena pode ajudar a humanidade no enfrentamento da crise ambiental.
  • O planeta abriga mais de 476 milhões de pessoas indígenas que vivem em 90 países. Juntas, elas possuem, administram ou ocupam cerca de um quarto das terras do mundo. É um território que se saiu muito melhor do que a maioria do resto da Terra.
  • O PNUMA conversa com Nemonte Nenquimo, condecorada pelas Nações Unidas como Campeã da Terra em 2020.
  • Líder do povo indígena Waoroni do Equador, ela liderou um processo em 2019 que proibiu a extração de recursos em 500 mil acres de suas terras ancestrais — uma vitória judicial que deu esperança às comunidades indígenas em todo o mundo.
  • A matéria surge como resposta diante do novo relatório global do IPCC, que indica que a temperatura média do planeta tende aumentar 1,5 ºC muito antes do previsto, trazendo devastação generalizada.

Liberado na última semana, o novo relatório global do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), figurou como um dos fatos científicos mais relevantes do ano. Ao apresentar uma compilação de milhares de trabalhos sobre o tema produzidos na última década, ele indica que a temperatura média do planeta tende aumentar 1,5 ºC muito antes do previsto, trazendo devastação generalizada.

Pela primeira vez, o IPCC quantificou o grau de influência das mudanças climáticas à frequência e à intensidade de eventos extremos, como secas prolongadas, ondas de calor, tempestades e furacões. Muitas das mudanças descritas são sem precedentes. Algumas estão em andamento agora, enquanto outras — como o aumento contínuo do nível do mar — permanecerão “irreversíveis” por séculos a milênios. Diante do cenário devastador, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) publicou um especial sobre como o conhecimento indígena pode ajudar a humanidade no enfrentamento dessa crise.

No Dia Internacional dos Povos Indígenas, especialistas afirmam que governos devem aprender com os exemplos ambientais dados pelas comunidades indígenas, algumas das quais viveram em harmonia com a natureza por milhares de anos. Caso contrário, corremos o risco de acelerar a tripla crise planetária que o mundo enfrenta devido às mudanças climáticas, perda de biodiversidade e poluição.

“A perda de biodiversidade e as mudanças climáticas, em combinação com a gestão insustentável de recursos, estão levando os espaços naturais ao redor do mundo, de florestas e rios a savanas, ao ponto de não retorno”, disse Siham Drissi, oficial do Programa de Biodiversidade e Gestão de Terras do PNUMA.

“Precisamos proteger, preservar e promover o conhecimento tradicional, o uso sustentável tradicional e a experiência das comunidades indígenas se quisermos interromper os danos que estamos causando – e, finalmente, salvar a nós mesmos.”

Uma luta de todos – Nemonte Nenquimo passou anos combatendo mineradores, madeireiros e empresas de petróleo que pretendiam se estabelecer na floresta amazônica. Líder do povo indígena Waoroni do Equador, ela liderou um processo em 2019 que proibiu a extração de recursos em 500 mil acres de suas terras ancestrais — uma vitória judicial que deu esperança às comunidades indígenas em todo o mundo.

Condecorada pelas Nações Unidas como Campeã da Terra em 2020, Nenquimo não espera apenas salvar os Waoroni. Ao proteger a Amazônia, um importante estoque de gases de efeito estufa, ela espera salvar o planeta.

“Se permitirmos que a Amazônia seja destruída … isso nos afeta como povos indígenas, mas também afetará a todas as pessoas por causa das mudanças climáticas”, diz Nenquimo. “A luta que fazemos é por toda a humanidade.”

Uma Terra adoecida – O planeta abriga mais de 476 milhões de pessoas indígenas que vivem em 90 países. Juntas, elas possuem, administram ou ocupam cerca de um quarto das terras do mundo. É um território que se saiu muito melhor do que a maioria do resto da Terra.

Um relatório marcante de 2019 da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES), apoiada pelas Nações Unidas, descobriu que o mundo natural está diminuindo a um ritmo sem precedentes na história humana. Cerca de três quartos do território seco do planeta foi “significativamente alterado” pelas ações humanas, o que colocou em perigo ecossistemas cruciais, incluindo florestas, savanas e oceanos, levando 1 milhão de espécies para a extinção.

Embora o declínio ambiental esteja acelerando em muitas comunidades indígenas, ele tem sido “menos severo” do que em outras partes do mundo, concluiu o relatório.

Especialistas indicam que isso se deve em parte a séculos de conhecimento tradicional e, em muitas comunidades, a uma visão predominante de que a natureza é sagrada. Esse conhecimento, “engloba formas práticas de garantir o equilíbrio do meio em que vivemos, para que possa continuar a prestar serviços essenciais como água, solo fértil, alimentação, abrigo e medicamentos”, afirma Drissi.

Líderes da conservação – Em muitas partes do mundo, as comunidades indígenas estão na vanguarda da conservação, de acordo com um relatório recente apoiado pelo PNUMA. Na República Democrática do Congo, a comunidade Bambuti-Babuluko está ajudando a proteger uma das últimas áreas remanescentes de floresta tropical primária da África Central. No Irã, o povo Chahdegal Balouch supervisiona 580 mil hectares de matagal e deserto. E no extremo norte do Canadá, os líderes Inuit estão trabalhando para restaurar os rebanhos de caribus, cujos números estavam em declínio acentuado.

O estudo indica que incluir povos indígenas e comunidades locais na governança ambiental e aproveitar seus conhecimentos melhora a qualidade de vida. Também melhora a conservação, restauração e uso sustentável da natureza, o que beneficia a sociedade em geral. Também sugere que os povos indígenas geralmente estão em melhor posição do que os cientistas para fornecer informações sobre a biodiversidade local e as mudanças ambientais, e são contribuintes importantes para a governança da biodiversidade em níveis local e global, observou o relatório do IPBES.

Apesar disso, grupos indígenas costumam ver suas terras exploradas e desapropriadas e lutam para ter serem ouvidos sobre o que acontece em seus territórios.

“Governos precisam reconhecer que a herança cultural e o conhecimento tradicional dos povos indígenas e comunidades tradicionais contribuem significativamente para a conservação e podem melhorar a ação nacional e global sobre a mudança climática”, afirmou Drissi.

Uma parte fundamental desse processo, acrescentou, é reconhecer as reivindicações de terras indígenas e abraçar as formas tradicionais de gestão da terra.

Ameaças crescentes – Como as suas vidas costumam estar intimamente ligadas à terra, as comunidades indígenas estão entre as primeiras a enfrentar as consequências das mudanças climáticas. Do deserto do Kalahari e montanhas do Himalaia à floresta amazônica, secas, inundações e incêndios afetaram comunidades que já lutam contra a pobreza e invasões em suas terras. Isso torna ainda mais imperativo para o mundo exterior reconhecer os direitos e práticas das comunidades indígenas, disse Nenquimo.

“Os extrativistas, os capitalistas, o governo – eles dizem que os indígenas são ignorantes”, diz. “Nós, povos indígenas, sabemos por que as mudanças climáticas estão acontecendo … [a humanidade] danificando e destruindo nosso planeta. Como indígenas, devemos nos unir em um único objetivo: exigir que eles nos respeitem”.

Dia Internacional dos Povos Indígenas é comemorado globalmente em 9 de agosto. A Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas exige que o consentimento livre, prévio e informado dos povos indígenas seja obtido em questões de importância fundamental para seus direitos, sobrevivência, dignidade e bem-estar. Marcando o início da Década das Nações Unidas da Restauração de Ecossistemas (2021-2030), o PNUMA está trabalhando com o Fórum Permanente das Nações Unidas sobre Questões Indígenas para publicar trabalhos sobre o conhecimento tradicional para restauração e resiliência de ecossistemas. O PNUMA também estabeleceu uma política para promover a proteção dos defensores ambientais e envolve líderes religiosos e comunidades para trabalhar com os povos indígenas em defesa de políticas florestais sólidas e na proteção dos direitos de seus guardiões por meio da Iniciativa Interfaith Rainforest.

 

 

Fonte: https://brasil.un.org/pt-br/140293-conhecimento-indigena-pode-indicar-o-caminho-na-prevencao-de-crises-ambientais

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