Por Sara Villén-Pérez, Luisa F. Anaya-Valenzuela, Denis Conrado da Cruz e Philip M. Fearnside
Cerca de metade das terras indígenas que contêm grupos isolados na Amazônia Legal brasileira (25 terras, 45%) registraram interesse para mineração. Essas terras contêm aproximadamente a metade do total de grupos indígenas isolados (43 grupos, 48%; Figura 1). Onze dessas terras (20% do total) têm mais de 50 solicitações de mineração (Figura 2) e respondem por 96,7% de todas as solicitações de mineração (ou seja, 3.526 solicitações). Essas terras indígenas altamente ameaçadas contêm 21 grupos isolados (24% do total). Grupos isolados estão distribuídos em terras indígenas por toda a Amazônia Legal brasileira, embora as terras indígenas com maior número de grupos isolados estejam localizadas na metade oeste da região (Figura 3A, Material Suplementar Figura S-2). Os pedidos de mineração estão concentrados em terras indígenas no centro e norte da região (Figura 3B).
As terras indígenas com grupos indígenas isolados têm um total de 3.645 pedidos de mineração ocupando 10,6 milhões de ha. Os pedidos de mineração ocupam uma parcela substancial de algumas terras indígenas. Especificamente, eles afetam mais de 20% da área de nove terras, ocupando até 82% de uma única terra (Material Suplementar Figura S-3). A maioria dos pedidos (93,5%) são pedidos de pesquisa (Material Suplementar Figura S-4), e estes ocupam a maior parte das terras afetadas (95,5%). Em cada terra indígena afetada, o número de solicitações de mineração varia de 1 a 1.020 e a área total de impacto varia de 11 ha a 3,3 milhões de ha (Material Suplementar Figura S-5). O número de pedidos de mineração registrados em uma terra indígena é altamente correlacionado com a área que ocupam, independentemente do tipo de pedido, considerando todos os pedidos (coeficiente de correlação de Spearman ρ = 0,986; Material Suplementar Figura S-6A), apenas os pedidos de pesquisa (ρ = 0,995, Material Suplementar Figura S-5A) ou somente solicitações de licença de operação (ρ = 0,990, Material Suplementar Figura S-6A).
O número de pedidos de mineração em todas as terras indígenas na Amazônia Legal brasileira está significativa e positivamente correlacionado com a presença de povos indígenas isolados, mas não com a área da terra indígena (Tabela 1, Figura 4A). Este modelo é globalmente significativo (gl = 383, Chi quadrado = 58,57, p-valor << 0,001), e explica 21,6% da variação.
Tabela 1. Resultados do modelo GLM para o número de solicitações de mineração em todas as terras indígenas da Amazônia Legal brasileira. * = efeito significativo.
gl | Estimativa | Erro Padrão | valor z | Pr (>|z|) | |
Intercepto | 383 | 3.014 | 0,316 | 6.189 | < 2 · 10 – 16 * |
Povos indígenas isolados (Presença | Ausência) | 383 | -1,591 | -6.102 | -5,480 | < 2 · 10 – 16 * |
Tamanho da Terra Indígena (ha) | 383 | -8 · 10 -11 | -0,936 | 1,587 | 0,349 |
O número de solicitações de mineração nas terras indígenas que continham grupos indígenas isolados está significativa e negativamente relacionado ao nível de conhecimento sobre grupos isolados (Tabela 2, Figura 4B). Este modelo foi globalmente significativo (gl = 49, Chi quadrado = 23,88, p-valor << 0,001), e explicou 41,7% da variação. A mineração ilegal relatada por Ricardo & Gongora [1] atinge 39 grupos isolados (43% do total) localizados em 21 terras indígenas (Figuras 1 e 2), embora esse fator não tenha relação significativa com o número de solicitações de mineração em terras indígenas. [2]
Tabela 2. Resultados do modelo GLM para o número de solicitações de mineração em terras indígenas na Amazônia Legal brasileira com grupos indígenas isolados. * = efeito significativo.
gl | Estimativa | Padrão Erro | valor z | Pr (>|z|) | |
Intercepto | 49 | 1.460 | 1.030 | 1.417 | 0,156 |
Número de grupos indígenas isolados | 49 | -0,155 | 1,008 | -0,153 | 0,878 |
Conhecimento de grupos isolados (Em estudo | Confirmado) | 49 | -2,761 | 0,661 | -4.179 | < 2 · 10 – 16 * |
Conhecimento de grupos isolados (Sob informação | Em estudo) | 49 | -0,158 | 0,484 | -0,327 | 0,744 |
Mineração ilegal (Presença | Ausência) | 49 | -0,506 | 0,436 | -1,159 | 0,246 |
Tamanho da Terra Indígena (ha) | 49 | 8 · 10 -7 | 4 · 10 -7 | 2.063 | 0,039 |
A imagem que abre este artigo de um povo isolado que vive na fronteira do Acre com o Peru (Foto: Gleison Miranda/Funai/2008).
Fontes:
[1] Ricardo, F. P., Gongora, M. F. (2019) Cercos e resistências. Povos indígenas isolados na Amazônia Brasileira. Instituto Socioambiental, São Paulo, SP.
[2] Este texto é traduzido de: Villén-Pérez, S., L.F. Anaya-Valenzuela, D.C. da Cruz & P.M. Fearnside. 2022. Mining threatens isolated indigenous peoples in the Brazilian Amazon. Global Environmental Change 72: art. 102398. https://doi.org/10.1016/j.gloenvcha.2021.102398
Sobre os autores
Sara Villén-Pérez, tem doutorado em ecologia pela Universidad Autónoma de Madrid. Trabalha com mudanças globais e biogeografia, incluindo uma série de trabalhos sobre mineração e povos indígenas no Brasil. É bolsista de pós-doutorado “Talento” no Grupo de Investigación en Ecología y Evolución del Cambio Global, Departamento de Ciencias de la Vida, Universidad de Alcalá, Madri, Espanha.
Luisa Fernanda Anaya-Valenzuela é formada em engenharia pela Facultad del Medio Ambiente y Recursos Naturales, Universidad Distrital Francisco Jose de Caldas, Bogotá, Colômbia. Ela tem trabalhado com impactos de mineração a céu aberto na Colômbia. Foi bolsista no Departamento de Ciencias de la Vida, Grupo de Ecología y Restauración Forestal, Universidad de Alcalá, em Madri, Espanha, e hoje trabalha como cientista de dados em uma firma na área ambiental (TAUW Iberia), em Madri.
Denis Conrado da Cruz é engenheiro florestal pela Universidade Federal Rural da Amazônia, e mestre em tecnologia de informação Geográfica e doutor em ecologia. conservação e restauração de ecossistemas pela Universidade de Alacalá de Henares, Madri, Espanha. Foi pesquisador assistente no laboratório de geoprocessamento no Instituto do Homem e Meio Ambiente (Imazon) em Belém. Atualmente é associado à Aliança pela Restauração na Amazônia (ARA), em Belém. Tem experiência na área de recursos florestais e engenharia florestal, com ênfase em SIG.
Philip Martin Fearnside é doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 700 publicações científicas e mais de 500 textos de divulgação de sua autoria que estão disponíveis aqui.
Fonte: https://amazoniareal.com.br/mineracao-ameaca-povos-indigenas-isolados-5-resultados-da-pesquisa/
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