Delegação da Rede de Cooperação Amazônica e do Instituto Iepé contou com duas mulheres indígenas que levaram até Genebra denúncias sobre mineração ilegal e a pauta LGBTQIAP+

Texto: Iepé

Elizangela Baré e Lilia Karipuna levaram importantes pautas indígenas para Genebra (Foto: Patricia Zuppi/RCA)

Na segunda quinzena de julho aconteceu a 16ª Sessão do Mecanismo de Peritos em Direitos dos Povos Indígenas das Nações Unidas – EMRIP. Realizado em Genebra, na Suíça, o encontro contou com a participação de uma delegação do RCA (Rede de Cooperação Amazônica), formada por quatro integrantes:

  • Elizangela Baré, da FOIRN (Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro)
  • Lilia Karipuna, da AMIM (Associação das Mulheres Indígenas em Mutirão)
  • Luis Donisete Benzi Grupioni (Iepé/RCA)
  • Patrícia Zuppi (RCA)

A delegação acompanhou os trabalhos ao longo da semana, inscreveu falas e pronunciamentos orais, e manteve uma extensa agenda de reuniões bilaterais com diversos mecanismos e procedimentos especiais (Alto Comissariado da ONU para o Brasil, Relatoria Especial da ONU para Água e Saneamento, Comitê para Eliminação da Discriminação contra a Mulher, Relatoria Especial para o Meio Ambiente, Relatoria Especial para Mudanças Climáticas, Relatoria Especial para Alimentação e Relatoria Especial para Povos Indígenas). A delegação também teve reunião com o Ministro Conselheiro da Missão Permanente do Brasil na ONU. 

Delegação do RCA durante o 16º EMRIP (Foto: Patricia Zuppi/RCA)

Nessas reuniões bilaterais, a delegação apresentou um panorama da situação atual dos povos indígenas na Amazônia brasileira, com destaque para os impactos percebidos na qualidade da água dos rios nos territórios indígenas decorrentes da contaminação pelo garimpo ilegal e pela falta de saneamento em municípios no entorno. As lideranças indígenas alertaram para os efeitos causados na saúde das crianças e na segurança alimentar.

O Secretário Executivo da RCA, entregou o Relatório produzido pelo Iepé sobre o estudo realizado junto à Fiocruz relativo ao mercúrio identificado nos peixes dos rios do Amapá e norte do Pará.

Eventos paralelos: quando as discussões se aprofundam

Além do evento principal, a programação do EMRIP inclui diversos eventos paralelos. Nesta edição do EMRIP, a RCA e o Iepé, em parceria com outras organizações,  realizaram um evento paralelo com o tema “Iniciativas Indígenas de Proteção Territorial na Amazônia Ameaçada”.

Evento paralelo organizado pela delegação da RCA e Iepé (Foto: Leonor Hernández/Associação para os Povos Ameaçados)

No evento, os participantes destacaram as crescentes ameaças aos territórios indígenas, como invasões, desmatamento, extrativismo, garimpo ilegal, monoculturas e grandes empreendimentos no entorno de suas áreas, bem como a crescente tomada da região por cartéis de drogas e grupos paramilitares, que resultam em altíssimos impactos e riscos à segurança e à vida das comunidades indígenas, intensificados pelo desmonte das políticas ambientais e de proteção territorial nos últimos quatro anos no Brasil.

E apresentaram iniciativas autogestionadas para proteger seus territórios e bem-estar de suas comunidades, como as expedições de monitoramento dos limites dos territórios, o fortalecimento de organizações de base e a criação de coletivos voltados à proteção dos grupos mais vulneráveis. A elaboração e implementação dos Planos de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas (PGTAs) e os Protocolos Próprios de Consulta e Consentimento Livre, Prévio e Informado também foram destacados como instrumentos de governança e de regulação das relações com a sociedade envolvente.

Esse evento paralelo foi realizada pela RCA; AMIM; FOIRN; UNIVAJA (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari); Society for Threatened People (STP); com apoio do Iepé, Instituto Internacional Raça, Igualdade e Direitos Humanos; Fundação Ford e Rainforest Foundation Norway.

Luis Donisete e Lilia Karipuna durante evento paralelo do 16º EMRIP (Foto: Patricia Zuppi/RCA)

Os eventos paralelos fazem parte da programação oficial: essa é uma oportunidade de ampliar o espaço de participação direta das lideranças indígenas durante a sessão e apresentar com mais profundidade as pautas consideradas prioritárias.

Desenvolvimento sim, mas não de qualquer maneira!

Durante o Encontro, Elizangela Baré, da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro, realizou um importante discurso sobre mineração ilegal e os perigos que ela apresenta aos povos indígenas. 

Destacamos abaixo alguns trechos de seu pronunciamento, feito diretamente do Palácio das Nações Unidas:

A mineração ilegal tem causado a crise humanitária em nossos territórios.

A mineração não é uma atividade tradicional dos povos indígenas e tem causado impactos gravíssimos, como a contaminação dos peixes, que são a base da nossa alimentação.

Nossas crianças e comunidades ficam doentes com a contaminação do peixe com mercúrio e isso afeta a pesca tradicional.

Com isso, o extrativismo ilegal traz prostituição, violência, alcoolismo, doenças externas aos territórios e põe em risco nossa segurança alimentar e práticas tradicionais.

Nosso potencial econômico não está na extração de minerais. É uma prática colonizadora.

Que o Estado brasileiro garanta a efetivação do direito à consulta prévia, livre e informada e reconheça para isso os próprios protocolos dos povos indígenas.

Desenvolvimento sim, não de qualquer maneira!

Indígenas e a pauta LGBTQIAP+

Outro tópico abordado em Genebra foi a questão dos indígenas LGBTQIAP+. Lilia Ramos Oliveira, do povo Karipuna, é uma indígena lésbica e a primeira mulher indígena vereadora de Oiapoque-AP. Ela foi a Genebra como representante da Associação das Mulheres Indígenas em Mutirão.     

“Hoje, quando saímos do nosso território, nos deparamos com o preconceito nos espaços públicos da cidade. Dentro das universidades, a existência de estudantes LGBTQIA+ indígenas é frequentemente questionada”, afirma Lilia, que levou a Genebra 3 recomendações para o Estado brasileiro:

  • Promover a capacitação de lideranças indígenas LGBT sobre mecanismos de promoção e discussão de seus direitos, inclusive em nível internacional
  • Criar políticas públicas para prevenir a violência e o discurso de ódio contra os indígenas LGBT
  • Garantir o acesso à justiça e a punição dos agressores por atos de violência contra indígenas LGBT

“Os ataques contra os indígenas LGBTQIAP+ não se limitam ao discurso de ódio. Casos de graves ataques físicos e psicológicos, incluindo homicídios, foram relatados. Apesar disso, as denúncias apresentadas não se traduzem em justiça e a impunidade é a norma”, conclui Lilia.

Elizangela Baré e Lilia Karipuna (Foto: Patricia Zuppi/RCA)

Um pouco mais sobre o EMRIP

Criado em 2007 pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU (CDH), o EMRIP tem a missão de auxiliar os Estados Membros das Nações Unidas a cumprirem as metas da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas. O colegiado do EMRIP é composto por 7 especialistas independentes em Direitos Indígenas, nomeados pelo CDH.

O mecanismo se reúne na sede da ONU em Genebra uma vez por ano e conta com a participação de representantes do Estado, associações e federações de Povos Indígenas, sociedade civil, organizações intergovernamentais e academia. 

Fonte: https://institutoiepe.org.br/2023/08/indigenas-rca-e-iepe-marcam-presenca-em-encontro-anual-da-onu-sobre-direitos-dos-povos-indigenas/

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