• A violência desencadeada por disputas de terra entre comunidades indígenas e quilombolas e empresas de óleo de palma se intensificou nos últimos meses na região que responde pela maior parte da produção de óleo de palma do país.
  • Em 24 de setembro, líderes indígenas e quilombolas denunciaram um ataque a tiros que culminou no assassinato de um não-indígena e deixou dois indígenas Turiwara e um não-indígena feridos por tiros no município do Acará, no Pará. Na manhã seguinte, 25 de setembro, a casa cultural de uma aldeia indígena foi queimada.
  • A Polícia Federal e o Ministério Público Federal afirmam que estão investigando estes e os casos anteriores de violência que se intensificaram na região.
  • Um banco de dados compilado pela aliança jornalística Tras las huellas de la palma (No rastro da palma) revela que apenas 44 multas foram emitidas contra os produtores de óleo de palma no país pelos órgãos ambientais federais e estaduais na última década, das quais apenas três foram pagas. A maioria das multas foi por desmatamento e poluição.

Uma “guerra do dendê” eclodiu nos últimos meses no nordeste da Amazônia, região que responde pela maior produção de óleo de palma do país. A escalada da violência foi desencadeada por disputas de terra entre comunidades indígenas e quilombolas, de um lado, e empresas de óleo de palma, de outro, que respondem também pela maior parte das multas por desmatamento, poluição e outros crimes ambientais da indústria da palma no país.

Em 24 de setembro, líderes indígenas e quilombolas denunciaram um ataque a tiros que culminou no assassinato de um não-indígena e deixou dois indígenas Turiwara e um não-indígena feridos no município do Acará, no Pará. Imagens do momento do ataque têm circulado nas mídias sociais; em alguns vídeos, é possível ouvir os tiros. Um dos indígenas foi baleado na cabeça e no ombro direito e está hospitalizado em estado grave, segundo as lideranças.

“Eu fui um dos baleados, estou dentro da ambulância agora… por pouco não fomos mortos, livramento de Deus mesmo”, um dos indígenas baleados, que a Mongabay não está identificando para sua segurança, disse em um vídeo logo após o ataque. “Solicitamos [a] todo mundo que nos ajude, por favor.” Os indígenas feridos são da comunidade Ramal Braço Grande, localizada entre os municípios de Tomé-Açu e Acará, uma área reivindicada pelos povos Turiwara e Tembé como sua terra ancestral.

Indígenas Turiwara na casa de cultura da comunidade Ramal Braço Grande, localizada entre os municípios de Tomé-Açu e Acará, área reivindicada como terra ancestral no Pará. Imagem cortesia do povo Turiwara.

“Moça, nos ajude. Eu sei que [a] qualquer hora, [a] qualquer momento, o próximo pode ser eu, por lutar por uma comunidade, por lutar pelo povo”, um líder indígena cuja identidade a Mongabay está preservando por motivo desegurança disse a esta repórter em uma mensagem de áudio no mesmo dia.

Na manhã seguinte, 25 de setembro, o mesmo líder indígena enviou um vídeo mostrando a casa de cultura da aldeia Braço Grande arrasada pelo fogo. “E está aqui a prova: a casa cultural destruída. Nós pedimos socorro”, disse o líder indígena no vídeo. “Isso só reflete o que a firma está planejando fazer como povo Turiwara. Isso significa que ela está falando que se o povo Turiwara não parar de lutar pelo meio ambiente, pelos igarapés, pelas terras, ela vai destruir de um por um”.

O líder indígena disse à Mongabay que a comunidade planejava se reunir na casa de cultura para coordenar suas ações após o último ataque. “Nós estamos sendo bombardeados e, para completar, entraram dentro da nossa comunidade agora, dentro da nossa aldeia, enquanto o nosso povo descansava depois do dia tenebroso que teve, meteram fogo na nossa casa cultural. Nós não aceitamos isso. Nós queremos justiça”.

Não são apenas as comunidades indígenas que apontam as empresas de óleo de palma como responsáveis pela violência. As comunidades quilombolas também atribuíram os ataques aos seguranças privados contratados pela Brasil BioFuels S.A. (BBF), a maior produtora brasileira de óleo de palma. A empresa nega as acusações.

Em um e-mail enviado à Mongabay, a BBF disse que “lamenta os atos de violência noticiados e esclarece de forma veemente que não tem nenhuma ligação com o ocorrido”. A empresa disse que um dos baleados” é criminoso contumaz e possui diversas rixas com gangues locais e com outras comunidades, sendo recentemente preso com munições de arma de fogo”. A empresa disse também que tomará as devidas medidas legais contra um líder indígena “que vem tentando associar de forma caluniosa o nome da BBF a esses fatos trágicos ocorridos nesta manhã, objetivando ações de terrorismo e vandalismo contra a empresa e seus funcionários”.

Além das acusações de violência, um banco de dados compilado pela aliança jornalística Tras las huellas de la palma (Seguindo os rastros da palma) também revela que a BBF é a empresa de óleo de palma com o maior número de multas ambientais no Brasil – e o valor de suas multas correspondem às mais altas impostas pelos órgãos ambientais.

A casa de cultural da comunidade Ramal Braço Grande, localizada entre os municípios de Tomé-Açu e Acará, no Pará, devastada pelo fogo. Imagem cortesia do povo Turiwara.

A Empresa Mais Multada

A base de dados mostra que autoridades federais e estaduais emitiram um total de 44 multas contra os produtores de óleo de palma no país na última década. Do total de multas registradas entre maio de 2011 e novembro de 2021, apenas 20 revelaram os valores, totalizando R$ 1,37 milhão de reais. Apenas três constam como pagas e várias das multas não trazem nenhuma informação sobre os crimes ambientais cometidos pelas empresas.

Durante esse período, a maioria das multas registradas foi aplicada por poluição e desmatamento, 16 e 11, respectivamente. Quase todas as multas, 41 de 44, foram aplicadas no Pará, onde foram registradas nove multas por desmatamento. O estado de Roraima, uma nova fronteira de óleo de palma, foi responsável pelas outras três multas.

A Biopalma, empresa adquirida pela BBF em 2020, respondeu pela multa de maior valor: R$ 1,09 milhão por destruir 217 hectares de vegetação nativa no município paraense de Domingos do Capim em maio de 2014 sem licença das autoridades ambientais. A multa não foi paga, de acordo com o banco de dados do IBAMA.

A BBF também acumulou a segunda maior multa — R$ 25 mil por desmatamento — imposta pelo IBAMA em fevereiro de 2018 após a empresa ter desmatado 4,1 hectares de floresta nativa sem autorização no município de São João da Baliza, em Roraima.

A empresa também recebeu outra multa na mesma data, também por desmatamento no mesmo município. A multa de R$ 10 mil foi aplicada por “extrair mineral [barro] sem a devida autorização do órgão ambiental competente”.

Em uma resposta por e-mail, a BBF disse que a sanção que levou à multa de R$ 1,09 milhão ocorreu antes da aquisição da Biopalma em novembro de 2020. “Desde então, a BBF vem atuando de forma consistente nos esclarecimentos e solução deste processo”. A empresa observou que, embora a notificação tenha sido registrada em 28 de maio de 2014, o processo só foi distribuído em 8 de novembro de 2018. A BBF disse que, na época, a Biopalma apresentou sua defesa impugnando a multa, que ainda está pendente de uma decisão. O processo está em andamento na unidade do IBAMA no Pará, disse a BBF.

A Polícia Federal e o Ministério Público Federal (MPF) investigam os crimes que ocorreram no final de setembro no Acará e outros casos de violência que se intensificaram na região nos últimos meses, além de supostos crimes ambientais cometidos pela BBF. Imagem cortesia do povo Turiwara.

Em relação à multa de R$ 25 mil, a BBF disse ter adquirido a área em 29 de maio de 2008 e que a área plantada cobre 3,3 hectares, não 4,1 hectares. A Companhia jamais alterou a vegetação nativa, tendo comprado o terreno justamente porque possuía 50% de sua área já desmatada e disponível para o cultivo de palma”, escreveu a BBF. A empresa acrescentou que realiza o cultivo de palma em áreas previamente degradadas e que segue as regras do Zoneamento Agroecológico para a Cultura da Palma de Óleo (ZAE-Dendê), estabelecido pelo governo federal em 2010. A BBF disse que “mesmo atuando em total regularidade e expondo os fatos na época aos órgãos competentes”, pagou a multa em 22 de novembro de 2018.

Quanto à multa de R$ 10 mil, a BBF disse que “ recebeu essa multa por remoção de piçarra (barro/areia) sem a devida licença ambiental na época” mas, que após a autuação, pagou a multa e obteve a licença ambiental pertinente.

O IBAMA também multou a Palmaplan Agroindustrial Ltda. em R$ 20 mil – a terceira maior multa por desmatamento emitida pelo órgão ambiental federal — em maio de 2014 por desmatamento de 3,05 hectares de vegetação nativa em uma área protegida em Boa Vista sem a devida licença.

A Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (SEMAS) também emitiu multas contra as empresas de óleo de palma, sendo a mais alta de R$ 36.441 reais contra a Marborges. A SEMAS não forneceu nenhuma informação sobre a violação.

A Palmaplan e a Marborges não responderam aos pedidos de resposta da Mongabay.

A aliança jornalística Tras las huellas enviou inicialmente 37 pedidos de informação às autoridades ambientais em cinco estados produtores de óleo de palma. Desse total, 26 foram respondidos, mas todas as respostas disseram que não conseguiram encontrar as informações relevantes ou apenas enviaram links onde as informações poderiam ser pesquisadas. Como resultado, todas as informações coletadas e publicadas nesta reportagem foram coletadas através de uma pesquisa nas páginas dos órgãos ambientais na internet, à qual aplicamos o devido tratamento de dados para refinar as informações.

‘Não É Um Simples Conflito Indígena’

A Polícia Federal e o Ministério Público Federal (MPF) informaram que estão investigando tanto os crimes do final de setembro no Acará quanto os casos anteriores de violência que se intensificaram na região nos últimos meses, além de supostos crimes ambientais cometidos pelo BBF.

James Miranda, da Delegacia de Defesa Institucional da Polícia Federal na região de Tomé-Açu, disse que o caso está sendo “apurado de perto”. Segundo o delegado, a Delegacia Crimes Ambientais da Polícia Federal também está realizando investigações, uma vez que as comunidades também apresentaram denúncias de crimes ambientais, mas os detalhes dessas investigações permanecem em sigilo. “Tudo está em apuração. São coisas que a gente não pode entrar em detalhe porque é investigação em andamento”, disse Miranda.

Segundo ele, o conflito é “bastante complexo”. “Não é um simples conflito indígena, envolve vários fatores”, disse Miranda à Mongabay em uma entrevista por telefone no dia anterior ao ataque de 24 de setembro. “E às vezes até se confundem os tipos de crimes. Por exemplo, o crime ambiental pode interferir no conflito indígena, ou vice-versa”.

Maquinário da empresa BBF destruído. A empresa atribui os crimes a um ““Grupo Criminoso que se autointitula indígenas e quilombolas” e afirma que o grupo “age com extrema violência contra trabalhadores da empresa e moradores das comunidades ao entorno da empresa, bem como pratica vandalismo contra o patrimônio da BBF”. Imagem cortesia da BBF.

Segundo ele, o conflito é “bastante complexo”. “Não é um simples conflito indígena, envolve vários fatores”, disse Miranda à Mongabay em uma entrevista por telefone no dia anterior ao ataque de 24 de setembro. “E às vezes até se confundem os tipos de crimes. Por exemplo, o crime ambiental pode interferir no conflito indígena, ou vice-versa”.

Um relatório publicado em 26 de setembro pela ONG Global Witness também denunciou violações de direitos humanos e até ameaças de morte e tortura contra os povos indígenas na mesma região. Gabriella Bianchini, ativista da Global Witness, visitou recentemente a área e disse que a situação é muito preocupante.

“Para ser muito honesta, a situação é muito pior do que qualquer pessoa pode imaginar”, disse ela à Mongabay em uma entrevista em vídeo no dia 21 de setembro. “Óbvio, eu não falo em nome das comunidades indígenas e tradicionais… [mas o que vimos] nos chocou muito. Porque nós estávamos lá e as violações aconteciam diariamente. Diariamente, nós éramos contatados por algum membro de alguma comunidade, por alguma liderança nos contando alguma coisa: alguma forma de tortura, alguma forma de ameaça, alguma forma de humilhação”.

Em comunicado à imprensa, o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) disse que está acompanhando o caso, junto com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Sociedade Paraense de Direitos Humanos e a Coordenação das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombo do Pará (Malungu).

Escalada Da Violência

Os impactos socioambientais das plantações de palma na região amazônica são denunciados há mais de uma década por indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais vizinhas às plantações de palma no estado do Pará, que responde por 90% da produção brasileira da commodity.

Plantações de dendê no município de Tomé-Açu, no Pará. Imagem: Karla Mendes/Mongabay.

No ano passado, Mongabay publicou uma investigação de 18 meses que revelou os principais problemas desencadeados pelas plantações de palma no estado: desmatamento, poluição da água e do solo, escassez de peixes e caça, além de problemas de saúde e conflitos sociais e fundiários.

Em 2019, a Mongabay esteve na região de Tomé-Açu, próximo ao local onde tem ocorrido a recente onda de violência. Na época, ouvimos várias queixas contra empresas de óleo de palma e testemunhamos ações de protesto, como a apreensão de tratores como estratégia das comunidades para serem ouvidas e lutarem por seus direitos.

Porém, a violência aumentou na região após a venda da Biopalma à BBF, afirmam os líderes indígenas e as autoridades, que dizem que os acordos anteriores entre a Biopalma e as comunidades não estão sendo honrados pela BBF. Há também disputas de terra sobre áreas reivindicadas por ambos os lados, agravadas pela falta de atuação da Fundação Nacional do Índio (Funai) para demarcar terras ancestrais.

Em nota, a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) requereu uma “investigação imparcial” dos crimes e garantias de segurança para a comunidade do Ramal do Braço Grande. Também instou a Funai a tomar “medidas urgentes de regularização fundiária” para as áreas reivindicadas pelo povo Turiwara e Tembé, e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) a concluir o processo de regularização fundiária dos territórios quilombolas de Alto Acará Amarqualta e Nova Betel.

“Terras ocupadas pelas comunidades foram incorporadas ilegalmente pela empresa ao seu patrimônio, desconhecendo processos em andamento de demarcação dos territórios ocupados por comunidades indígenas e quilombolas”, escreveu a ABA. “Se instalou a ‘guerra do dendê’, como é chamada pelos comunitários a situação criada”.

A BBF negou as acusações, dizendo que o INCRA, a Funai e o Instituto de Terras do Estado do Pará (ITERPA) já informaram que “não existem sobreposições nas áreas envolvendo a BBF, quilombolas e terras indígenas”. Segundo a empresa, os esclarecimentos foram enviados à Ouvidoria Agrária do Tribunal de Justiça do Pará pelo INCRA e pela Funai em 17 de maio e 15 de agosto, respectivamente.

Cachos de dendê armazenados na estrada no município de Tomé-Açu, no Pará. Imagem: Karla Mendes/Mongabay.

Em nota enviada por e-mail, o INCRA informou que iniciou a elaboração dos relatórios técnicos de identificação e delimitação dos territórios para as comunidades remanescentes de quilombos, representadas pela Associação de Moradores e Agricultores Remanescentes de Quilombolas do Alto Acará (AMARQUALTA), no Acará, e pela Associação de Moradores, Agricultores e Quilombolas da Comunidade de Nova Betel (AMAQCNB), em Tomé-Açu e que, após a conclusão destes, poderá fornecer informações precisas sobre as áreas reivindicadas. A Funai não respondeu aos pedidos de resposta da Mongabay.

No ano passado, como reportado pela Mongabay, a Biopalma havia concordado em pagar a cada comunidade R$ 30 mil trimestrais por três anos para financiar projetos de desenvolvimento local, de acordo com os líderes indígenas. “É pouco para nós, mas foi o que nos deram de valor. A gente brigou por mais, mas não conseguiu”, Urutaw Turiwar Tembé, cacique da aldeia indígena Yriwar na região de Tomé-Açu, disse à Mongabay em 2021.

Mas nenhum desses projetos foi concluído até agora, disse Urutaw Tembé na época, devido aos custos mais altos em meio à pandemia da COVID-19. Segundo ele, em vez de pagar a quantia trimestral, a Biopalma só estava fazendo o pagamento anualmente.

Mas nos últimos meses, a empresa deixou de pagar integralmente e não quis dialogar com as comunidades, dizem os líderes e as autoridades. Em resposta, grupos indígenas tomaram posse de partes das plantações da empresa e seu maquinário e começaram a vender os frutos do dendê, atos pelos quais a BBF os acusa de roubo. Uma ação judicial está pendente na Vara Agrária; o juiz tenta buscar uma conciliação.

Em nota, a BBF disse que suas áreas “tomadas por um Grupo Criminoso que se autointitula indígenas e quilombolas, há mais de 9 meses”. A empresa alega que o grupo “age com extrema violência contra trabalhadores da empresa e moradores das comunidades ao entorno da empresa, bem como pratica vandalismo contra o patrimônio da BBF” e que “o fator motivador” dessas ações é a “subtração de frutos das áreas de cultivo da BBF e venda a empresas receptadoras de fruto de dendê que atuam nas regiões”, o que já foi relatado às autoridades, entre elas a Polícia Civil, Polícia Militar, Polícia Federal, Ministério de Agricultura, Ministério da Justiça, Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará (ADEPARÁ), entre outros.

Quanto ao pagamento, a BBF disse que o acordo assinado pela Biopalma com três associações representantes de comunidades indígenas do Pará – Associação Indígena Tembé de Tomé-Açu (AITTA), Associação Indígena Tembé do Vale do Acará (AITVA) e Associação Tenetehar Tekwa-Haw Pytawa de Tomé-Açu — “não envolvia repasses em dinheiro, somente projetos estruturantes”. A BBF disse que desde o momento em que assumiu o controle da Biopalma, em novembro de 2020, a empresa deu continuidade ao acordo e, em maio de 2021, assinou o primeiro adendo que “contemplou a inclusão de contribuições financeiras, dado que a prioridade dos indígenas havia mudado naquele momento”.

Vista aérea de uma escola completamente cercada por plantações de dendê no município de Tomé-Açu, no Pará. Imagem: Wilson Paz para a Mongabay.

Em agosto de 2021, disse a BBF, outro adendo foi assinado com o reajuste do valor solicitado “para que os indígenas deixassem de obstruir e invadir as áreas de plantio da Companhia, o que causava riscos à integridade física dos colaboradores rurais e impedia a colheita dos frutos”. Entretanto, a BBF disse que esse acordo de cooperação foi “rompido unilateralmente pelos indígenas em novembro de 2021, em desacordo com a BBF, pois o interesse das lideranças indígenas deixou de ser o de benfeitorias em prol de sua comunidade”. A empersa acrescentou que “ a venda ilegal de frutos se tornou altamente rentável – o que parece estar contribuindo para o desinteresse dos grupos mencionados em manter o acordo”.

A BBF disse já ter registrado mais de 650 relatórios policiais “com provas materiais”, incluindo vídeos e fotos, mas não recebeu nenhuma resposta das autoridades do Pará para resolver o caso.

Líderes, autoridades e ativistas disseram à Mongabay que estão preocupados com consequências mais graves à medida que os conflitos se agravam.

“O que nos foi reportado pelas comunidades é que há uma campanha de amedrontamento, de ameaça contra as comunidades, para que eles saiam [da área].. para que a BBF consiga dominar todo esse território”, disse Bianchini da Global Witness à Mongabay.

Um dos políticos acusados de instigar a violência contra comunidades tradicionais no Pará é o Delegado Caveira, deputado estadual e apoiador do presidente Jair Bolsonaro, que acaba de ser eleito deputado federal. Em três vídeos enviados à Mongabay pelas lideranças, Caveira fala veementemete: “Onde a justiça não alcança, a pólvora tem que alcançar”, sob aplausos de uma multidão, supostamente funcionários da BBF.

Nos vídeos, ele enfatiza o objetivo de Bolsonaro de ter o “homem de bem armado” para defender sua propriedade privada. Referindo-se especificamente ao caso BBF, ele diz que aqueles que possuem a terra têm direito a ela, e que “se essa fazenda fosse minha, eu já tinha resolvido isso aí há muito tempo. Era entrar [na fazenda] e [eu] ia queimar [atirar] na bala”.

Os líderes indígenas Uhu Tembé e Lúcio Tembé ao lado dos tratores apreendidos da empresa de óleo de palma Biopalma. O maquinário foi usado para derrubar dendezeiros a poucos metros da aldeia Indígena Yriwar, na Terra Indígena Tembé, em novembro de 2019. Foto: Karla Mendes/Mongabay.

Caveira também instou o governo do Pará a enviar representantes da Delegacia de Conflitos Agrários para “tirar esses falsos indígenas” das propriedades da BBF. “Estão queimando máquinas, tocando o terror, estão acabando com vários empregos… Resolva esse imbróglio, governador… O presidente da República deixou bem claro: nós não aceitamos invasão de terras no Brasil”.

Caveira não respondeu aos pedidos de resposta da Mongabay.

Como em outras áreas, os conflitos são mais intensos em áreas não demarcadas e em áreas de transição, observou Bianchini. “Quase todas as pessoas com quem nós falamos disseram que há uma mensagem sendo passada: ‘resolvam essas questões até o final de 2022, porque depois a gente não sabe quem vai assumir’”, disse ela, referindo-se à eleição presidencial deste mês e à possível derrota de Bolsonaro. Desde a campanha presidencial de 2018, Bolsonaro deixou claro que é contra qualquer demarcação de novas terras indígenas, que é uma das poucas promessas de campanha que ele conseguiu cumprir desde que assumiu o cargo em 2019.

“E isso está preocupando muito as pessoas, pois se o Bolsonaro perder as eleições, pode ser que exista um aumento significativo da violência para tentar abafar de uma vez por todas o que está acontecendo lá antes que as instituições voltem a ser utilizadas, voltem a ganhar financiamento e voltem a atuar como elas deveriam”, disse Bianchini. “É muito assustador”.

Caminhões transportando cachos de óleo de palma. Imagem: Thais Borges para Mongabay.

Pesquisa e análise de dados: Yuli Santana e Karla Mendes.

Por: Karla Mendes 
Fonte: Mongabay

Fonte: https://amazonia.org.br/guerra-do-dende-empresa-campea-de-multas-e-acusada-de-violencia-no-para/

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