Uma delas foi a do navegador italiano Cristóvão Colombo, banhada em tinta vermelha por um grupo de ativistas sociais

LA PAZ

Duas estátuas de La Paz, na Bolívia, sofreram intervenções artísticas e políticas nos últimos dias. Uma delas foi a do navegador italiano Cristóvão Colombo (1451-1506), que foi banhada em tinta vermelha por um grupo de ativistas sociais, para representar o banho de sangue que significou a conquista espanhola nas Américas. A outra foi a de Isabel, La Católica, a rainha espanhola que financiou a expedição de Colombo e a posterior conquista das Américas.

Estátua da rainha Isabel é vestida de ‘chola’ por grupo feminista – (foto retirada a pedido do detentor de direito autoral)

O grupo de ativistas bolivianas feministas Mujeres Creando colocou na estátua da monarca uma saia típica das indígenas do altiplano boliviano e passou a chamá-la de “Estátua da Chola Globalizada” —“chola” é o termo que se usa para designar as mulheres de origem indígena em vários países da região, como Equador, Peru, Bolívia, Chile e Colômbia.

“Em momentos como este, de eleições, não custa lembrar novamente as origens deste país, e chamar a atenção para o fato de que a situação das mulheres continua precária. ‘Invisibilizadas’, vítimas de violência doméstica e do machismo de nossa sociedade”, diz à Folha a líder do Mujeres Creando, María Galindo.

A Bolívia lidera o ranking da América do Sul de violência contra a mulher, segundo as Nações Unidas. Em 2020, por conta da pandemia e do fato de as mulheres serem confinadas em casa com os parceiros pelas medidas de quarentena, os casos de agressão aumentaram. Segundo o Ministério Público, ocorreram 86 feminicídios, 20 a mais do que o mesmo período no ano passado (março a setembro).

Também houve, em 2020, 19.233 casos de gravidez de menores de 19 anos, 30% a mais do que em 2019.
Segundo os dados das Nações Unidas, 7 de cada 10 mulheres bolivianas sofrem violência física ou verbal e psicológica no país.

Galindo considera que o colonialismo espanhol explica muito da violência e da pressão que sofrem as mulheres. “É por causa da cultura colonial que há na Bolívia uma idealização da mulher branca, num país em que a maioria é indígena e mestiça”, afirma.

“Isso por si só já é uma violência, pois você vê meninas tentando alisar o cabelo e seguir modas estrangeiras de se vestir. Por consequência, muitas mulheres de origem indígena, por se sentirem fora desse padrão de beleza, feias e não desejadas, se resignam a ter trabalhos mais baratos e mais duros. Em geral, servindo a mulheres brancas de nível econômico melhor.”

Houve reação de parte da sociedade, pois a estátua se localiza numa região de classe média, e portanto mais branca, de La Paz. Houve tentativas anônimas de limpar as pinturas na estátua e retirar a saia de “chola” da rainha Isabel. “Ser chola não é pedir um retrocesso a um passado que já foi. Somos cholas e queremos ser cosmopolitas e modernas”, declara Galindo.

Já a estátua de Colombo banhada em tinta vermelha não foi reivindicada por nenhum grupo específico, mas quem realizou a intervenção deixou clara sua mensagem. Estão escritas ali frases como “foi invasão”, “nos mataram” e “tirem Colombo daqui”. O nome do navegante genovês foi manchado de vermelho.

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