O mundo não alcançará justiça climática enquanto desrespeitar povos originários

Txai Suruí

Coordenadora da Associação de Defesa Etnoambiental – Kanindé e do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia

Na semana que vem acontecerá a cúpula UE-Celac, onde chefes de Estado e de governo da União Europeia (UE) e da América Latina e Caribe estarão reunidos em Bruxelas. Serão discutidos grandes temas como emergência climática e transição energética, transição digital inclusiva e justa, segurança cidadã e combate ao crime transnacional, comércio e desenvolvimento sustentável.

Acreditamos que a reunião possa ser uma oportunidade para tratar sobre assuntos urgentes, como os direitos humanos na Europa e América Latina e Caribe, os ataques e retrocessos democráticos, o aumento da violência e os abusos contra migrantes, e a proteção à vida de defensores de direitos humanos e ambientais.

No entanto, para se alcançar uma transição energética justa é necessário verdade, justiça e reparação. Um dos obstáculos para a cooperação é a acusação por outros de alguns Estados membros de desrespeitarem os direitos humanos.

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Poço de extração de petróleo em meio a aerogeradores, próximo a cidade de Odessa, no Texas – Lalo de Almeida – 28.set.21/Folhapress

Por exemplo, a recente reforma constitucional na província de Jujuy, na Argentina, aprovada em tempo recorde, afeta os territórios dos povos originários, modifica o uso da água e limita a manifestação social. Isso provocou uma imediata resposta do povo jujeneo, que há muito tempo já vem protestando contra a extração de lítio em seu território.

Alguns pontos para entender a reforma constitucional: ela estabelece que os terrenos fiscais são “para o trabalho e para a produção”; estabelece que cabe ao Estado reconhecer as terras dos povos originários e lhes dar personalidade jurídica; é o Estado quem dispõe do uso de água e limita as possibilidades de protestos sociais.

Mas o lítio de Jujuy está em terreno fiscal, em territórios onde as comunidades originárias viveram e vivem até hoje. Esse lítio é utilizado para a produção de carros elétricos na Europa. A pergunta que fica é: transição justa para quem? Se o lítio está em debate, continuarão com políticas de exploração que não respeitam os direitos humanos e as comunidades indígenas?

A resposta do governo argentino aos protestos foi uma enorme repressão policial. Os ataques permanecem na província e já somam mais de 40 mandados de prisão. A maioria das pessoas presas são representantes de diferentes organizações sociais, sindicais, indígenas e políticas.

Alguns dos impactos da mineração de lítio são a salinização de solos e zonas úmidas, contaminação de solos com resíduos perigosos, modificação do fluxo natural da água na superfície, alteração do balanço hídrico e o impacto na flora nativa.

O mundo não alcançará justiça climática enquanto adotar soluções ambientais que desrespeitem e não escutem as populações locais e originárias.

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/txai-surui/2023/07/transicao-energetica-precisa-de-verdade-justica-e-reparacao.shtml

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